Por Ivan Martínez-Vargas / O Globo
Dez ex-ministros do STF, juristas,
empresários, advogados e artistas, como Chico Buarque, também endossam
documento, que já tem mais de 3 mil assinaturas
No final, leia na íntegra o documento.
SÃO PAULO - A Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo (USP) divulga nesta terça-feira manifesto de
juristas, empresários, artistas, advogados e entidades da sociedade civil em
defesa da democracia. Com mais de 3 mil assinaturas, o documento é apresentado
pelos organizadores como reação aos reiterados ataques do presidente Jair
Bolsonaro (PL) ao sistema eleitoral e às instituições, embora não mencione
diretamente o nome do presidente. O manifesto será lido no Largo de São
Francisco, no dia 11 de agosto, em ato em defesa da democracia brasileira.
Banqueiros como Roberto Setubal, Pedro
Moreira Salles, João Moreira Salles e Candido Bracher (os dois primeiros
copresidentes do Itaú Unibanco; o terceiro, fundador; e o último, ex-presidente
do banco), além do presidente do Credit Suisse no Brasil, José Olympio Pereira,
estão entre os que assinaram o texto que critica a retórica de Bolsonaro. A
informação é do diretor da faculdade, Celso Campilongo.
Também subscrevem o texto empresários como
Guilherme Leal, Pedro Passos e Fabio Barbosa (da Natura), Horácio Lafer Piva
(ex-presidente da Fiesp) e Walter Schalka (presidente da Suzano).
“Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado Democrático de Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional”, diz o texto.
Ao abordar o período eleitoral, o texto
afirma: “ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso
perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e
insinuações de desacato ao resultado das eleições”. A carta também defende as
urnas eletrônicas, que classifica como "seguras e confiáveis", em
contraposição aos ataques de Bolsonaro, sem provas, ao sistema eleitoral.
O documento ainda diz que os signatários
vão “deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa
da ordem democrática”.
Intitulada de Carta aos Brasileiros, o
texto é uma reedição do documento homônimo lido, em agosto de 1977, em pleno
regime militar, pelo professor de direito Goffredo da Silva Telles Junior no
mesmo Largo de São Francisco. À época, a carta denunciava o autoritarismo e a
ilegitimidade da ditadura militar e o estado de exceção no qual o país se
encontrava.
Entre os signatários da carta de 2022,
estão ainda dez ex-ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), entre os quais
Celso de Mello, Sepúlveda Pertence, Carlos Velloso, Carlos Ayres Britto e Eros
Grau.
Assinam, também, os ex-ministros Pedro
Malan (Fazenda), Celso Lafer (Fazenda e também Relações Exteriores), o
ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga e o ex-governador do Espírito
Santo, Paulo Hartung. Entre os artistas, está Chico Buarque de Holanda..
O manifesto foi organizado em várias
frentes, de acordo com Campilongo, e teve a colaboração do advogado Floriano
Peixoto Marques Neto, professor da USP, de membros da Comissão Arns e de outros
juristas. Entre os advogados, assinam Miguel Reale Júnior, Alberto Toron, Lenio
Streck, Tércio Sampaio Ferraz Júnior, Belisario dos Santos Junior e Rubens
Naves.
— Faremos no dia 11 de agosto uma homenagem
aos tribunais superiores, com participação de entidades da sociedade civil e da
iniciativa privada. Convidamos a Fiesp, por exemplo, e diversos empresários,
além de ministros do STF e do Tribunal Superior Eleitoral. A carta também será
lida ao público — informa Campilongo.
Manifesto dos empresários
Empresários ouvidos pelo GLOBO em condição
de anonimato afirmam que o comando da Fiesp também tem articulado um outro
texto, a ser divulgado nos próximos dias, em tom similar. O documento,
impulsionado pelo presidente da entidade, Josué Gomes, já teve pelo menos duas
versões.
Um dos impasses atuais acerca do texto,
segundo uma pessoa familiarizada com o tema, se relaciona a uma menção à defesa
da Constituição pela entidade. Além disso, alguns sindicatos empresariais que
compõem a federação, como o Sindimaq (de máquinas), afirmam não ter tido acesso
ao documento.
Gomes assumiu a Fiesp em janeiro após ser o
único candidato a concorrer ao cargo, com o apoio do então presidente da
instituição, o bolsonarista Paulo Skaf. O atual líder da Fiesp é filho de José
Alencar, ex-vice-presidente nos dois mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva.
Leia na íntegra o documento organizado
pelos advogados:
Carta aos brasileiros em defesa do Estado
Democrático de Direito
"Em agosto de 1977, em meio às
comemorações do sesquicentenário de fundação dos cursos jurídicos no país, o
professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território
livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual
denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que
vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a
convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.
A semente plantada rendeu frutos. O Brasil
superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a
legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o Estado Democrático de
Direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.
Temos os poderes da República, o Executivo,
o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o
compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a
Constituição Federal.
Sob o manto da Constituição Federal de
1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e
periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para o país sempre
foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.
A lição de Goffredo está estampada em nossa
Constituição: “ Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus
representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
Nossas eleições com o processo eletrônico
de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de
poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo.
As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça
Eleitoral.
Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas
muito ainda há de ser feito. Vivemos em um país de profundas desigualdades
sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação,
habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das
nossas
potencialidades econômicas de forma
sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros
desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de
raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a
devida plenitude.
Nos próximos dias, em meio a estes
desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos
dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos
ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos
visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos
próximos anos.
Ao invés de uma festa cívica, estamos
passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às
instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.
Ataques infundados e desacompanhados de
provas questionam a lisura do processo eleitoral e o Estado Democrático de
Direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis
as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à
violência e à ruptura da ordem constitucional.
Assistimos recentemente a desvarios
autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as
tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das
eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.
Nossa consciência cívica é muito maior do
que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências
menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.
Imbuídos do espírito cívico que lastreou a
Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de
São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada
um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da
democracia e do respeito ao resultado das eleições.
No Brasil atual não há mais espaço para
retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução
dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo
respeito ao resultado das eleições.
Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona: Estado Democrático de Direito Sempre!!!!"
2 comentários:
Me impressiona muito que um fato de grande gravidade que foi o TSE ter apagado os rastros
eletrônicos, as digitais do que foi feito pelo hacker que invadiu o sistema eleitoral do TSE entre maio e meados de outubro de 2018.
Fala-se nesse documento que o presidente faz acusação sem provas, hora uma prova como essa consistente que poderia dar detalhes do que possivelmente foi feito, em matéria de fraude ,!foram apagadas e o TSE se calou , como assim! sofre uma invasão de oito meses e uma Terceirizada teria apagado todos os rastros e tudo bem?
No meu entender isso teria que ser motivo de um escândalo nacional
E o Supremo Tribunal Eleitoral teria que dar satisfação aos eleitores
A carta é ótima,faz referência até pela ''orientação sexual'',obrigado pela parte que me toca.Eu só trocaria o termo ''raça'' por ''etnia''.
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