Folha de S. Paulo
A economia e o Auxílio Brasil importam para
as eleições?
Os titulares dos cargos executivos contam
com uma vantagem natural: contam com a máquina, a exposição midiática, e o
reconhecimento do nome. No cenário pós pandêmico, no entanto, ocorre uma
reversão deste padrão e o surgimento do chamado viés
anti-incumbente.
A rigor, este viés era observável antes
mesmo da atual onda populista mas foi reforçado pela pandemia. E independe do
desempenho dos governantes. Os melhores gestores da pandemia em suas regiões
(Chile, Reino Unido) foram defenestrados.
O viés independente da orientação
ideológica dos governos: Na américa Latina a esquerda foi derrotada no Uruguai,
na Argentina (o peronismo amargou duro revés nas eleições legislativas), e no
Equador. Assim a suposta "onda rosa" em nossa região
simplesmente não
tem sustentação empírica.
Bolsonaro inaugurou o padrão ao derrotar as forças que ocuparam o governo por 13 anos e simbolizavam o status quo. Mas agora o que deveria surpreender, na realidade, é a competitividade relativa do incumbente considerando não só a economia, mas também outro choque, a guerra da Ucrânia.
Dois fatores poderiam explicar parte da
competitividade de Bolsonaro: transferências de renda (o auxílio emergencial,
Auxílio Brasil) e a melhoria na economia (queda da inflação e do desemprego).
Mas a explicação é incompleta. Alguns analistas sugerem que o auxílio Brasil
não estaria afetando o voto como esperado, seu efeito anulado porque o
eleitorado interpreta-o como eleitoralmente oportunista. Penso que as
transferências de renda tiveram grande impacto mas na campanha se tornaram
paulatinamente um tema consensual (no jargão, um valence issue); o eleitorado
pobre está presumindo que haverá continuidade nas transferências/manutenção do
valor independente
do candidato (Imai, King e Rivera 2020).
Arriscaria que é a primeira vez que isso
acontece.
A economia é a maior preocupação dos
brasileiros, mas ainda é processada pelo eleitorado em chave negativa para o
presidente; a inflação e desemprego embora declinantes ainda não reverteram as
perdas de bem-estar ocorridas.
A resiliência deve-se sobretudo à magnitude
do choque experimentado entre 2013-2016, que produziu profunda rejeição ao PT.
No entanto, a pandemia produziu um choque ainda maior no plano dos afetos
políticos ("falta de empatia") afetando o incumbente.
O pleito converteu-se assim em disputa
de rejeições.
Bolsonaro ainda se comporta como outsider e
não incumbente, o que trouxe algum ganho. Mas quando abraçou a velha política
ele matou a persona criou, ancorada em autenticidade. A conversão é faca de
dois gumes.
Governar democracias é cada vez mais
difícil. Para qualquer governo.
*Professor da Universidade Federal de Pernambuco e ex-professor visitante do MIT e da Universidade Yale (EUA).
Um comentário:
O incumbente incumbiu-se de desmantelar o País.
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