quarta-feira, 5 de julho de 2023

Bruno Boghossian - Como tratar o inelegível?

Folha de S. Paulo

Seria mais que saudável dedicar tolerância zero para comportamento reincidente de Bolsonaro

O julgamento no TSE nem tinha terminado, mas Jair Bolsonaro já era reincidente. Numa entrevista improvisada, o ex-presidente voltou a alimentar suspeitas falsas sobre as urnas e repetiu a enganação de que os ataques de 8 de janeiro foram "uma grande armação". Quando ele começou a fazer campanha contra vacinas, a CNN cortou a transmissão.

Horas depois, naquela mesma sexta-feira (30), Bolsonaro foi mais longe. Em outra entrevista, reciclou teorias da conspiração sobre as investigações da facada que sofreu e sobre as eleições de 2018. Para completar, insinuou que teve mais apoio do que Lula em 2022, mas "os números do TSE apontaram outra direção".

Bolsonaro continuará sendo o mesmo ator político que foi condenado por ataques à democracia. A proibição de disputar eleições não exclui o ex-presidente da vida pública, e ele vai apertar todos os botões que tiver à sua disposição para manter influência sobre sua base.

A punição do TSE deveria fazer com que políticos, eleitores e a imprensa tratassem esse personagem de maneira diferente. Na cadeira de presidente ou no papel de candidato, Bolsonaro atraía holofotes pelo poder que tinha em mãos, pela perspectiva de obtê-lo ou pelo potencial inflamável de suas declarações.

Agora, ele não pode ser ignorado, mas seria mais do que saudável aplicar uma política de tolerância zero para suas continuadas insinuações antidemocráticas e outros disparates, calibrar seu espaço no debate público e medir com cautela o título de "cabo eleitoral de luxo" que o ex-presidente concedeu a si mesmo.

Por enquanto, candidatos que se vendem como moderados continuam correndo atrás do apoio de Bolsonaro, grupos políticos usam sua voz para marcar posição em temas para os quais ele nunca deu bola (como a reforma tributária), e boa parte de seu show de desinformação circula sem a devida contestação.

Bolsonaro foi punido por uma violação grave das regras da democracia. Tratá-lo como um político qualquer não deveria ser uma opção.

 

Um comentário: