sexta-feira, 8 de setembro de 2023

Vinicius Torres Freire – O mundo e o Brasil distraído

Folha de S. Paulo

País não tem projeto pragmático de aproveitar mudanças rápidas na economia mundial

China e Alemanha não têm estado lá muito bem depois da epidemia. O PIB da China é o segundo maior do mundo; o da Alemanha, o quarto. Os problemas chineses e alemães parecem um tanto luxuosos. Afinal, vivemos em um país semipobre e de baixo crescimento faz 40 anos.

Ainda assim, uma crise chinesa maior teria repercussão global, grande aqui. As dificuldades, por assim dizer, alemãs deveriam ser mais um motivo para pensarmos o que fazer da alteração da ordem econômica mundial.

Considerada a taxa média de crescimento da última década e extrapolando tal ritmo para o futuro, o PIB da Índia deve ultrapassar o da Alemanha e o do Japão em cinco anos. 2027. Ali na esquina. O conflito sino-americano, entre outros motivos, influencia mudanças em investimentos internacionais e em definições de tecnologia.

Tudo isso é sabido, mas em geral encarado como ruído de fundo por aqui, sem que a percepção dessas tendências se traduza em medidas práticas.

Sim, temos visto a importância que a diplomacia luliana dá ao "Sul Global", ao "Brics Plus", a uma moeda que abale o dólar e coisas assim. O que temos feito, porém, a fim de aproveitar logo capitais sobrantes no mundo e as reorientações geográficas de investimento? A fim de tirar algum proveito do novo peso relativo das economias? De tentar uma abertura maior para comércio e investimento, dadas essas mudanças?

Não costuma ser uma conversa do Brasil, um país que mora longe e, na prática, alheio às mudanças do mundo. Até que elas arrombem a nossa porta.

A China tenta manter a taxa de crescimento em ao menos 5% ao ano, ritmo que, para nós, seria uma graça dos céus. Tem de lidar com o risco de crise maior, talvez financeira também, pois houve superinvestimento no setor imobiliário. Seu crescimento, baseado em muita poupança, investimento, pouco consumo e escassa proteção social, talvez precise ser revisado.

"Talvez". Os prognósticos para a China têm estado errados faz uns 20 anos. Desde a crise que explodiu em 2008, de matriz americana, o PIB (renda) per capita chinês cresceu 145%. O do Brasil, 7,3%. O da Índia, quase 92%. Coreia do Sul, 41%. EUA, 16,7%. Alemanha, 12,4%.

A economia alemã recuperara-se bem da crise de 2008-2012, mas passou a fraquejar em 2017. Não saiu bem da epidemia. Em relação a 2019, o PIB per capita alemão regrediu 0,6% (até fins de 2022); o da eurozona (Alemanha inclusive) cresceu 1,8%; o da União Europeia, 2,9%; o dos EUA, 3,6%.

A Alemanha padeceu especialmente com a crise mundial de energia que começou em 2021 e piorou com a guerra de Vladimir Putin. Ainda assim, o PIB per capita alemão, mesmo em paridade de poder de compra, é 3,5 vezes o do Brasil, 7,5 vezes o da Índia e o triplo do chinês.

A Alemanha também padece por causa da China, seu segundo maior mercado, que fraqueja um tanto e que também passa a vender mais carros, um grande negócio de exportação alemão. A Alemanha enfrenta ainda problemas como envelhecimento, falta de mão de obra qualificada, burocracia excessiva e tecnologicamente envelhecida.

Não, a Alemanha não vai entrar em parafuso. Nem tem importância direta maior para a economia brasileira. Ainda assim, merece atenção. Ignoramos também a distante Índia, que logo será tão grande quanto a Alemanha. Não prestamos atenção ao México, que nos últimos 30 anos conseguiu ter um desempenho econômico ainda pior que o do Brasil, mas que pode se beneficiar da "reocidentalização" de investimentos americanos, por exemplo.

Falamos de ocupar um lugar fixo no comando da ONU. Mas não temos meios nem de ajudar a vizinha Argentina. Muito pior, não temos um plano de ter um assento permanente de destaque na economia mundial em mudança rápida.

 

2 comentários:

EdsonLuiz disse...

O crescimento industrial com desemvolvimento tecnológico e de mão de obra de economias situadas no mesmo grupo do Brasil --Índia, Mexico, Vietnam..., com o Brasil retrocedendo na qualidade da educação, sem investimento em pesquisa e tecnolocia, entregue a corruptos, desmontando os instrumentos de combate à corrupção e anulando as punições de corruptos já decididas, como acaba de ser denunciado pela organização "Transparência Internacional", NÃO VAI FAZER DESTE LUGAR UM BOM PAIS !

E ainda por cima disso tudo o Brasil está sendo isolado do intercâmbio e cooperação tecnológica com os Estados Unidos e Europa e até, de vários modos, inclusive com ofensas por parte do PT e de Lula, se tornando inimigo destes paises democráticos, desenvolvidos e progressistas, de onde o Brasil copiou algum progressismo que tem e recebeu algum treinamento e adquiriu tecnologia e agora, para agradar à China e ao truculento Xi Jiping e à Rússia e ao carniceiro Vladimir Putin, se alia ao atraso e às ditaduras e agride a parte progressista e desenvolvida do mundo, no lugar de colaborar, neste momento em que os progressistas e democratas estão sofrendo com uma articulação dos regimes autoritários para destruir as democracias e com as democracias da Europa passando pelo drama que passam com a agressão de Rússia e China à Ucrânia.

O Brasil foi jogado em um grande buraco a partir de 2007. Estamos aprofundando o buravo, e desta vez estamos também isolando k Brasil do mundo livre e desenvolvido.

ADEMAR AMANCIO disse...

Pois é.