sexta-feira, 27 de outubro de 2023

César Felício - Tributação das offshores surpreende pela demora

Valor Econômico

Vantagens do mecanismo para quem tem bolso para usá-lo não desaparecem com o tributo

A aprovação do projeto de taxação das empresas offshore na noite de quarta-feira na Câmara deu vazão a narrativas duvidosas sobre esse refúgio patrimonial acessível a poucos afortunados. Essas empresas não irão acabar porque o rendimento de seus cotistas passará a ser taxado anualmente, e não apenas na retirada. Pelo menos não enquanto o modelo da taxação for o proposto, de 15%, equivalente a um investimento dentro do Brasil. As vantagens do mecanismo para quem tem bolso para usá-lo não desaparecem com o tributo.

Especialistas na constituição de offshore destacam que esse mecanismo não é usado apenas para se pagar menos imposto do que se pagaria no Brasil. Muito menos pode ser vista como sinônimo de dinheiro sujo, duto de propinas ou coisas do gênero, embora isso exista também.

Offshores são bastante buscadas como um instrumento sucessório, talvez mais do que pelo ganho tributário que proporcionam. Estruturar offshore procurando esse tipo de vantagem continuará sendo atrativo, aposta por exemplo o contador Silvinei Toffanin, da Direto Group, empresa há 26 anos no ramo. Sobretudo se o imposto de herança no Brasil subir em uma nova fase da reforma tributária. Hoje tributa de 4% a 8%. Offshores também se tornaram mandatórias para grandes empresas de capital aberto que necessitam abrir subsidiárias. Planejamento tributário é uma vantagem comparativa essencial.

É fato que o investimento brasileiro direto no exterior em países que costumam abrigar offshores tem aumentado. Durante o governo Dilma Rousseff, por exemplo, a participação brasileira no capital de empresas das Ilhas Virgens Britânicas passou de US$ 16 bilhões em 2011 para US$ 40 bilhões em 2016, segundo dados do Banco Central. Quando Bolsonaro assumiu em 2019 já eram US$ 57 bilhões. Três anos depois somavam US$ 68,8 bilhões. Nas Ilhas Cayman o montante passou de US$ 32 bilhões para US$ 68,6 bilhões em 11 anos. Nas Bahamas de US$ 12,9 bilhões para US$ 59,8 bilhões.

Todos estes exemplos são conhecidos como paraísos fiscais, mas oferecem também outros tipos de calmaria. O nível de turbulência econômica e política que o Brasil atravessou entre 2011 e 2022 foi importante. Parte dessa evolução está mais relacionada com o aperfeiçoamento das leis contra lavagem de dinheiro do que propriamente com aumento de envio de dinheiro para o exterior. São valores que subiram à superfície.

A blindagem é para muitos poucos e a quantidade de declarantes definitivamente não avança na mesma proporção que o volume de dinheiro envolvido. Não há uma avalanche de pessoas abrindo empresas no exterior, o que houve foi um uso mais intenso desse mecanismo. O total de pessoas físicas declarantes de investimento no exterior passou de 19 mil para 21,8 mil entre 2011 e 2022. E o de pessoas jurídicas saiu de 2,8 mil para 3,8 mil.

É de certo modo espantoso que a taxação do rendimento de empresas offshore tenha demorado tanto tempo para ser proposta. O surgimento dessa situação, contudo, está longe de ser uma anomalia, como lembra o advogado tributarista Fernando Zilveti. O diferimento de tributo para quem abre uma offshore surgiu em um contexto em que havia uma preocupação mundial em criar estímulos para que valores mantidos no exterior passassem a ser declarados. Na Argentina há um nome preciso para isso, de tradução difícil para o português: “blanqueo”.

É difícil se retirar uma vantagem quando ela deixa de fazer sentido e a prova maior que esse diferimento não se justificava mais está na aprovação de um projeto de lei com quórum de maioria constitucional. Pesou no clima consensual do Congresso a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de finalmente entregar a presidência da Caixa ao Centrão, mas o custo político de se defender esse privilégio iria subir muito.

Rio Grande do Sul

Se depender de Paula Mascarenhas, nova presidente do PSDB gaúcho, aliada de primeira hora do governador tucano Eduardo Leite, presidente nacional da sigla, o partido dá um cavalo de pau na sua trajetória à direita dos últimos anos. “Nunca simpatizei com o antipetismo”, afirmou a prefeita de Pelotas. “O PSDB foi se transformando em algo que não era”, afirmou.

A sigla que disputou a presidência do Brasil de forma competitiva de 1994 a 2014 enfrenta hoje uma ameaça existencial. O encolhimento nas urnas no ano passado, quando elegeu apenas 13 deputados federais, deixou o partido com um fundo partidário e eleitoral incompatível com os 522 prefeitos que elegeu há três anos. Em São Paulo, outrora o Estado em que tinha maior estrutura, a base municipal está sendo eviscerada pelo Republicanos do governador Tarcísio de Freitas, o PL bolsonarista e o PSD do polivalente Gilberto Kassab.

Para a prefeita de Pelotas, o Rio Grande do Sul representa uma chance de o partido sobreviver em outras bases. Um sinal disso está na própria composição do diretório estadual, de uma diversidade rara no Brasil: há 53 mulheres e 52 homens como integrantes. O PSDB gaúcho é pequeno mesmo em termos locais, com 33 prefeituras, ou menos de 10% do total do Estado. Mas dos cinco maiores colégios eleitorais, governa três: Caxias do Sul, Pelotas e Santa Maria. Em Porto Alegre, a aposta é a deputada estadual Nadine Anflor, que comandou a Polícia Civil de Leite. O atual prefeito da capital gaúcha, Sebastião Melo (MDB), tende a ter o apoio dos partidos mais identificados com o bolsonarismo.

 

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