Quando pensamos no futuro do nosso País, não vemos futuro, mas tão somente a continuidade de um triste presente.
Como é possível compreender, aceitar e viver
sem indignação numa sociedade como a do Brasil, formada por:
1) uma multidão majoritária de pobres e
negros, excluída, escravizada e inconsciente da realidade em que vive, sem
condições de participar da vida política e econômica do País;
2) uma classe média sem qualquer noção de
nacionalidade, que serve aos interesses dos poderosos, que odeia os pobres e
que age como o capataz moderno, como bem define o sociólogo Jessé de Souza; e
3) uma elite econômica, que influencia na formação da atual classe política desqualificada e corrupta e que, em conjunto com a classe média, forma um bloco antipopular, que além de explorar o povo ainda tem “vendido” o País às nações estrangeiras.
Alia-se a isto, ainda, uma mídia em grande
parte mantida pelo poder econômico, que tem exercido um crescente poder de
manipulação da sociedade brasileira. São raros os veículos de comunicação que
exercem a missão de fiscalizar, investigar, criticar, denunciar, cobrar o que
se espera de uma imprensa livre, séria e compromissada com os destinos da
Nação.
Infelizmente, a publicidade pública quase
sempre é usada com igual objetivo e não para educar, informar e bem orientar a
sociedade, conforme determina a Constituição (art. 37, $ 1º).
Por tudo isso, estamos fadados a continuar
sendo colônia das grandes potências, que aqui vêm buscar as commodities
(matérias primas de baixo valor agregado) de que precisam para desenvolver as
suas indústrias, gerar renda e empregos para os seus nativos, sob o olhar
omisso da sociedade brasileira, uns por conveniência e outros por ignorância.
As ricas reservas de minérios, a exemplo do
complexo minerário da Serra dos Carajás no Estado do Pará, o maior do mundo,
estão sendo sugadas para sustentar a indústria da China e de países europeus,
entre outros, deixando muito pouco ou quase nada para o Brasil além da
degradação ambiental.
A desarticulação da Agência Nacional de
Mineração, principal entidade estatal voltada à organização e à fiscalização da
atividade minerária, fez com que os garimpos ilegais se alastrassem,
principalmente por todo o território amazônico, avançando sobre áreas de
proteção ambientais e sobre terras indígenas. Hoje. a desordem impera neste
setor, situação que se agravou no governo passado, como vêm denunciando as
poucas entidades da sociedade civil que atuam nessa área – Observatório da
Mineração, site Amazônia real, sinaldefumaça.com, Brasil de Fato, entre outras.
A Vale S.A., por exemplo, usa tecnologia de
ponta para extrair e transportar os minérios da Serra dos Carajás para fora do
País, especialmente para a China, principal compradora do minério de ferro, e
também para países europeus e, em menor proporção, para Turquia, Estados
Unidos, Argentina, Romênia, Omã, Ilhas Maurício, África do Sul e Egito. Mas
nunca demonstrou o menor interesse em promover um processo de industrialização
nacional. E nem nunca foi exigida a atuar nessa direção pelo governo brasileiro.
Segundo o site “Brasil de Fato” (2), só em
2021 a Vale deixou de pagar R$ 20,3 bilhões em impostos, sem qualquer
contrapartida, o que faz com que as renúncias fiscais a ela concedidas sejam só
um bônus para aumentar o lucro da empresa. Em menos de dois anos, a Vale recebeu
em benefícios fiscais do governo o equivalente a todo o acordo de reparação de
Brumadinho.
https://www.brasildefato.com.br/2023/05/24/vale-deixou-de-pagar-r-20-3-bi-em-imposto-por-que-o-governo-deve-repensar-essa-politica
Por isso, esta política de renúncias fiscais
deveria ser revista, com urgência, pelo governo brasileiro, a qual só se
sustenta pelo forte lobby que as empresas mantêm no Congresso Nacional, a
exemplo do que ocorre com o agronegócio. Aliás, saliente-se que os maiores
investimentos da Vale e das grandes empresas do agronegócio são na manutenção
dos lobbies e nas campanhas publicitárias.
O bom senso e os interesses do País indicam
que essas benesses só se justificariam para empresas do setor industrial, que
geram empregos qualificados e renda para os brasileiros. Para mineradoras que
só exportam o minério in natura, que geram muito poucos empregos e renda no
País, assim como para os grandes grupos empresariais do agronegócio que só
produzem para exportar, é um verdadeiro crime de lesa pátria conceder a elas
incentivos fiscais.
Aliás, no setor do agronegócio a situação
ainda é bem pior. Além de não pagarem impostos, as grandes empresas desse setor
ainda são beneficiadas com créditos a juros subsidiados e renúncias de
receitas.
Espertamente, os grandes empresários do agro
procuram confundir-se com os pequenos e médios produtores rurais e com as
empresas industriais, com o objetivo de usufruir dos benefícios governamentais
a ambos concedidos.
Reitere-se que os investimentos no País só
são feitos para a manutenção de uma bancada aguerrida no Congresso e na
promoção de campanhas publicitárias manipuladoras da opinião pública.
Em 2019, por exemplo, a exportação dos
produtos do agronegócio renderam aos cofres públicos apenas R$ 16,3
mil em imposto, de acordo com os dados publicados no artigo “Agrotóxicos,
capital financeiro e isenções tributárias”, escrito por Marcelo Carneiro
Novaes e Thomaz Ferreira Jensen, um dos textos que compõem o livro Direitos
Humanos no Brasil 2020, lançado pelo Movimento Humanos Direitos e
pela Rede Social de Justiça e Direitos Humanos. E a situação de lá
para cá só piorou...
As nossas férteis terras estão sendo usadas
por um seleto grupo do agronegócio para produzir alimentos destinados
exclusivamente à exportação, atendendo aos interesses dos países importadores.
Para nós estão sobrando tão somente a devastação dos biomas, a degradação e a
contaminação por agrotóxicos dos solos e das águas.
Dados levantados pelo “Repórter Brasil”,
resultantes do cruzamento de informações do Sistema de Informação de Vigilância
da Qualidade da Água para Consumo Humano (Sisagua) do Ministério da Saúde, com
testes feitos em 2022, encontraram uma mistura de 27 agrotóxicos na água
consumida pela população de 210 municípios brasileiros, como São Paulo (SP),
Fortaleza (CE) e Campinas (SP).
https://reporterbrasil.org.br/2023/10/agrotoxico-na-agua-contaminada-28-cidades/
Em 2022, o alerta máximo para contaminação da água acendeu em 28 cidades de Goiás, Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso e Tocantins, nas quais testes de qualidade encontraram agrotóxicos na rede de abastecimento, ou em poços de uso particular, em quantidade acima do limite considerado seguro pelo Ministério da Saúde. Esta situação representa um risco à saúde, de acordo com especialistas, principalmente se a água contaminada for consumida de forma contínua.
Estes são temas que deveriam preocupar a
sociedade brasileira, sobretudo o Congresso Nacional, e ensejar atuações
visando uma mudança que melhor atenda aos interesses do País. No entanto, é
utopia esperar que isso aconteça, uma vez que a maioria dos atuais
parlamentares é comprometida com o grande capital, para o qual atuam como
verdadeiros lobistas.
Resta esperar que os setores mais conscientes
da sociedade denunciem e pressionem por uma mudança nesses setores, fazendo com
que eles passem a contribuir bem mais com o Brasil.
*Geólogo, advogado e escritor
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