Correio Braziliense
A entrada em cena do novo procurador-geral
Paulo Gonet escala o conflito do Supremo com o Ministério Público Federal; o
ministro Toffoli acusa procuradores de abuso de poder
O procurador-geral da República, Paulo Gonet,
recorreu, nesta terça-feira (6/2), da decisão do ministro Dias Toffoli, do
Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu a multa de R$ 10,3 bilhões do
acordo de leniência da J&F. Segundo o Ministério Público Federal, as
decisões do magistrado não podem ser embasadas nas provas colhidas na Operação
Spoofing, da Polícia Federal, que teve acesso a mensagens trocadas entre o
ex-juiz Sergio Moro, atual senador, e procuradores que atuaram na Operação
Lava-Jato.
O caso está sob sigilo na Corte, mas a repercussão na opinião pública é péssima para Toffoli e o Supremo. Ao tomar a decisão que suspendeu multas bilionárias, o ministro afirmou que existe "dúvida razoável" sobre a espontaneidade de Wesley e Joesley Batista, da J&F, em firmar acordo com o Ministério Público Federal (MPF). Em bom português, que ambos foram obrigados pelo MPF a fazer a delação. Gonet também pediu que o caso saia da relatoria de Toffoli e seja enviado a outro magistrado ou magistrada do Supremo, e levado ao plenário.
Como se sabe, o caso da J&F teve grande
repercussão política, principalmente porque o empresário Joesley Batista,
principal acionista do grupo J&F (dono do frigorífico JBS-Friboi), gravou
uma conversa com o então presidente Michel Temer, em 17 de abril de 2017, como
parte de seu compromisso de delação premiada com o então procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, que comandou a operação. A denúncia contra o
presidente da República praticamente inviabilizou a aprovação da reforma da
Previdência. Temer, porém, conseguiu evitar o impeachment.
A decisão de Toffoli é mais um revés para os
procuradores federais. A Operação Lava-Jato, criada para investigar desvios na
Petrobras, também está sendo desconstruída pelo Supremo. O ministro anulou
ainda a multa prevista na delação da Novonor, antiga Odebrecht, e mandou
investigar a ONG Transparência Internacional (TI), suspeita de receber R$ 2,3
bilhões em recursos oriundos de acordos feitos entre MPF e investigados.
Sediada em Berlim, a entidade nega e afirma que sofre perseguição.
A Transparência Internacional rebaixou o
Brasil em 10 posições no Índice de Percepção da Corrupção de 2023, o pior
desempenho desde 1995. O relatório responsabiliza o governo Jair Bolsonaro e o
primeiro ano do atual governo Lula. Toffoli é citado várias vezes no texto, por
sua atuação no Supremo.
"Talvez os exemplos mais graves tenham
sido as ações do ministro Dias Toffoli, que decidiu, monocraticamente e com
fortes evidências de conflitos de interesses e outras heterodoxias processuais,
sobre demandas que tiveram imenso impacto sobre a impunidade de casos de
corrupção que figuram entre os maiores da história mundial", afirma o
relatório da Transparência Internacional sobre o Brasil.
A entrada em cena do novo procurador-geral da
República, Paulo Gonet, escala o conflito do Supremo com o MPF, porque Toffoli
acusa os procuradores federais de abuso de poder. E a reação do Ministério
Público confronta esse entendimento. A divulgação das conversas entre
procuradores envolvidos nessas operações com diversos interlocutores opõe a
segurança jurídica, com o respeito ao devido processo legal, à crise ética na
política, desnudada no escândalo da Petrobras.
A liderança moral
Segundo Platão, a razão é a parte mais nobre
e elevada da alma humana, pois é por meio dela que se alcança a sabedoria e a
verdade. O filósofo grego acreditava que a razão deve controlar nossos impulsos
e desejos, para que possamos viver de acordo com a moralidade e alcançar a
felicidade. A moralidade deve ser fundamentada em princípios racionais. Por
definição, a ética é o conjunto de valores que compõem o modo de ser do
indivíduo, o respeito à moral vigente e às regras das interações humanas de
modo geral.
A palavra originou-se do grego e tem duas
grafias: éthos, que significa modo de ser; e êthos, traduzida como habitação do
ser. Ao racionalizar as normas sociais, os valores éticos são estruturantes da
moral, um código de conduta pessoal. Algo pode ser moralmente errado em uma
comunidade, porém eticamente bom para algumas pessoas nesse mesmo lugar. A
ética pode mudar a moral vigente. É o caso do que acontece com os costumes,
porque a moral prevê certo e errado, e a ética, o bem e o mal.
Na política, Max Weber diferenciava a ética
das convicções, como a dos procuradores da Lava-Jato, da ética da
responsabilidade, que orienta as decisões dos ministros do Supremo sobre a
Lava-Jato. A primeira pauta-se por objetivos determinados; a segunda, zela pela
legitimidade dos meios empregados.
Trocando em miúdos, a moral é uma conduta
específica e normativa, enquanto valores éticos são princípios a serem seguidos
nas ações e normas de conduta. A força do STF não pode se sustentar apenas nas
normas, tem que ter o respaldo dos valores para exercer liderança moral perante
a sociedade. Um dos sintomas profundos de crise nas instituições políticas
brasileiras é a perda dessa liderança pelo Executivo e pelo Legislativo. Agora,
quem corre esse risco é a Corte Suprema.
Um comentário:
Ética e moral,tema complicoso.
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