O Estado de S. Paulo
Principal cotado para a presidência do Banco
Central faz cinco declarações em público nos últimos dias, apesar de o BC ter
dito na última ata que não haveria indicação sobre seus próximos passos
O diretor de Política Monetária, Gabriel
Galípolo, principal cotado para a indicação da presidência do Banco Central,
caiu em uma armadilha criada por ele próprio nos últimos dias. Ao mesmo tempo
em que o BC afirmou na ata do último dia 6 que não haveria compromisso com
“estratégias futuras”, Galípolo marcou nada menos que cinco falas em público
desde então. Somente nesta quinta-feira, foram dois eventos abertos ao público.
Se a estratégia do BC era não se comprometer
com o que vai fazer na reunião de setembro, ou abandonar o que os economistas
chamam de “guidance” (indicação futura), o excesso de declarações por si só já
seria um problema.
Mas, para completar o quadro, as declarações desta quinta-feira foram contraditórias. Houve citação a canções, comentários sobre memes e explicações sobre falas passadas. Tudo o que um banqueiro central não deve fazer, que é abrir espaço para interpretações, para corrigir a si próprio, o que no final do dia significa aumento das incertezas. Isso imediatamente se transforma em risco mais alto, com impacto sobre o dólar e a curva de juros.
Principal cotado para a presidência do Banco
Central faz cinco declarações em público nos últimos dias, apesar de o BC ter
dito na última ata que não haveria indicação sobre seus próximos passos. Foto: WILTON
JUNIOR/Estadão
Até segunda-feira, quando falou em evento em
Belo Horizonte, as falas do diretor foram consideradas duras pelo mercado, que
passou a precificar um aumento da Selic na reunião de setembro. Na terça, o
presidente do Banco, Roberto Campos Neto, em entrevista ao jornal O Globo,
relembrou que não havia “guidance”, que o Fed poderia baixar os juros e muita
coisa poderia acontecer até lá.
Foi o suficiente para que uma enxurrada de
memes tomasse conta das redes, colocando Galípolo como falcão, e Campos Neto,
pomba. No mesmo dia, durante evento do BTG, em São Paulo, um dos gestores mais
respeitados do País, Luis Stuhlberger, do Fundo Verde, afirmou que Galípolo
estava falando em subir juros “até em festa de debutante”, sem ninguém
perguntar.
Tudo isso parece ter motivado as declarações desta quinta-feira, que foram vistas por vários
investidores como uma “modulação” das últimas falas. E isso foi interpretado
como um sinal de indecisão por parte do diretor, como se ele fosse sensível ao
aumento do dólar, a declarações de investidores e até a postagens em redes
sociais.
Por outro lado, se cancelasse os dois eventos
desta quinta, ele poderia passar a mensagem de que corroborou o tom mais leve
de Campos Neto, como chegou a ser cogitado por integrantes do mercado. Ou seja,
de um jeito ou de outro, o risco de um ruído na comunicação havia se elevado.
O ideal, em momentos de maior incerteza como
o atual (interno e externo) é reafirmar o que já foi dito na ata, o documento
oficial do Banco Central, e que melhor comunica os passos da política
monetária. Ou seja, repetir o que já foi dito, de que haverá uma análise dos
dados de inflação e das expectativas para só então ser definida a trajetória da
Selic. E isso pelos nove diretores do banco, que têm autonomia e podem votar
como bem entenderem.
Em apenas três dias, o dólar saltou de R$
5,41 para R$ 5,59. O aumento em si não é o principal problema, porque pode ser
facilmente revertido. Mas, para isso, o BC não pode ser indutor de
volatilidade, e sim uma âncora de previsibilidade na economia.
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