segunda-feira, 23 de junho de 2025

Lula e a CPI do INSS - Carlos Pereira

O Estado de S. Paulo

A coalizão supermajoritária de Lula não tem garantido blindagem política

Fiscalizar o Executivo por meio de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) é uma das funções clássicas do Legislativo em sistemas presidencialistas baseados na separação de poderes. CPIs são instrumentos que, idealmente, alinham o comportamento do governo às expectativas do eleitorado.

Mas essa ameaça virtuosa do Legislativo ao Executivo só é crível quando há real disposição política para exercê-la. Em contextos em que o partido do presidente – ou a coalizão que o sustenta – detém a maioria no Legislativo, o incentivo para investigar o próprio governo tende a desaparecer. Afinal, por que provocar instabilidade que pode comprometer os ganhos de estar no poder?

É o caso do atual governo Lula. Com uma coalizão formada por 16 partidos, o governo detém uma supermaioria: 350 cadeiras (68%) na Câmara dos Deputados e 59 (73%) no Senado. Em tese, CPIs não deveriam representar risco algum – mesmo diante de denúncias relevantes ou da gravidade dos malfeitos, como os que envolvem o atual escândalo do INSS.

Mas essa maioria numérica não tem se convertido em maioria substantiva. Apesar do aumento da disciplina interna dos partidos – inclusive dos governistas – o governo tem enfrentado dificuldades para aprovar sua agenda ou mesmo neutralizar ameaças no Congresso. Isso revela um paradoxo: ao contrário do que muitos imaginavam, mais disciplina partidária não significa, necessariamente, mais coesão da coalizão.

Essa fragilidade da supercoalizão de Lula tem origem nas escolhas do próprio Executivo. Ao optar por uma coalizão extensa, ideologicamente heterogênea, e resistir a compartilhar poder e recursos de forma proporcional ao peso político dos aliados no Congresso, o governo comprometeu a capacidade de mobilização coordenada de sua base. O resultado é uma maioria instável – numerosa e extremamente cara, mas pouco confiável.

Além disso, os índices crescentes de desaprovação do governo junto à sociedade têm dificultado a agregação consistente de interesses em torno do Executivo. A estratégia dominante, inclusive entre a maioria dos aliados, tem sido permanecer no governo apenas para extrair o máximo de benefícios possíveis – sem necessariamente apoiá-lo. E, o que é pior, já com o olhar voltado para um desembarque e o apoio a uma candidatura de oposição em 2026.

A instalação da CPI do INSS, portanto, não deve ser subestimada. A sua existência escancara o grau de desagregação da coalizão. A CPI pode se transformar em mais um canal de desgaste, ampliando a erosão da imagem do governo e comprometendo suas chances eleitorais.

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