sábado, 6 de junho de 2009

ATENTADO À DEMOCRACIA

EDITORIAL
DEU NO ESTADO DE MINAS


Lula diz uma coisa, aliados fazem outra. Quem diz a verdade?

O eleitor brasileiro, quase sempre o último a ser lembrado pelos representantes que envia a Brasília, acaba de ganhar um novo motivo para acreditar um pouco menos em quem elegeu. Contrariando o que tem dito o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já está em tramitação na Câmara dos Deputados uma proposta de emenda constitucional (PEC) que permite mais uma reeleição aos atuais prefeitos, governadores e, é claro, ao presidente. A emenda foi apresentada pelo deputado Jackson Barreto (PMDB-SE), com 176 assinaturas, cinco a mais do que as 171 necessárias. E ocorreu só 48 horas depois de o presidente garantir mais uma vez: “Eu não brinco com a democracia. Foi muito difícil a gente conquistá-la; o que vale para mim, vale para os outros. Alguém que quer o terceiro mandato, pode querer o quarto, pode querer o quinto, o sexto”, disse ele. A PEC foi encaminhada à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, que, se aceitar sua constitucionalidade, abre o caminho para a matéria ser discutida e votada em comissão especial. Para produzir efeitos já na eleição de 2010, a PEC precisa ser votada duas vezes pelos deputados e igual número vezes pelos senadores até setembro deste ano.

Não será fácil. Mas, a facilidade com que o autor da emenda colheu as assinaturas sugere que é maior do que se pensa o número de políticos dispostos a quase tudo para continuar vivendo na sombra do poder e no conforto das benesses oficiais. Então, em que vai acreditar o eleitor, se o presidente diz que desautoriza a iniciativa, se chega mesmo a condená-la como prática antidemocrática e, logo em seguida, nada menos do que 176 deputados da base aliada – 53 do PMDB e 32 do PT, além representantes de todos os demais partidos que apoiam o governo – fazem exatamente o contrário? No mínimo, parecerá mais prudente quem pôr em dúvida a seriedade de todos, que, inebriados pelos índices de popularidade de Lula, tramam golpe político rasteiro para correr menos risco nas urnas. Afinal, seria mais seguro concorrer com o nome de quem já tem a consagração popular do que com qualquer outro candidato que, na melhor das hipóteses, iniciaria a campanha em igualdade de condições com a opositores mais conhecidos.

Mas, será democrático? Conforme o próprio Lula, não. “A alternância de poder é fundamental para a democracia”, disse ele, ao negar mais uma vez seu interesse no terceiro mandato consecutivo. Pelo menos no discurso, Lula está certo. O Brasil já alterou a regra uma vez para permitir a reeleição, instituto do qual o próprio presidente já se beneficiou. Se o Brasil de Lula ganhou o respeito do mundo econômico por honrar contratos e por manter, sem surpresas nem mágicas, as bases da política monetária e cambial, não terá nada a ganhar se quebrar uma regra tão cara no campo institucional. A apresentação da PEC do terceiro mandato só comprova que, depois do anúncio de que a pré-candidata oficial, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, enfrenta um câncer linfático, a movimentação dos golpistas tinha aumentado. Que Lula mande abortar mais esse atentado. A ministra Dilma e a democracia não merecem esse desrespeito.

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