quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Amorim perde outra, na Unesco

Deborah Berlinck
Correspondente
DEU EM O GLOBO

A série de derrotas do Itamaraty em eleições para órgãos internacionais, na gestão Celso Amorim, aumentou ontem com a derrota do egípcio Farouk Hosni, candidato apoiado pelo Brasil à direção-geral da Unesco. Ele perdeu para a ex-chanceler e atual embaixadora da Bulgária na França, Irina Bokova.
Hosni era acusado de antissemitismo.

Egípcio perde para búlgara eleição na Unesco

Ex-chanceler, que corria por fora na disputa, surpreende e vence na 5° rodada derrotando candidato apoiado pelo Brasil

PARIS. Farouk Hosni, o candidato egípcio à direção-geral da Unesco (a agência da ONU para Educação e Cultura) que causou polêmica ao admitir ter defendido a queima de livros de Israel das bibliotecas do Egito, foi derrotado ontem por uma candidata improvável: a embaixadora da Bulgária na França, Irina Bokova.

Essa ex-comunista convertida em pró-União Europeia convicta, de 57 anos, que foi ministra das Relações Exteriores da Bulgária e parlamentar, correu discretamente por fora e surpreendeu a todos, obtendo 31 votos contra 27 do comitê executivo da Unesco, formado por 58 países. Bokova ainda vai entrar para a História: será a primeira mulher e a primeira representante de um país do ex-bloco comunista a chegar ao comando da Unesco. Seu nome deverá ser endossado pelos 193 membros da Unesco, na assembleia geral da organização, em outubro.

Brasil se saiu mal, diz excandidato à vaga A eleição foi uma batalha: pela primeira vez, a disputa teve que ir a cinco turnos, com árabes e africanos se aliando ao egípcio, e europeus eliminando seus candidatos e mudando de campo à medida que as controvérsias em torno do egípcio aumentavam.

Emocionada, ela prometeu ontem união.

— Todos os candidatos propuseram boas ideias. Vou usar todas as boas ideias. Vamos trabalhar juntos, porque nunca acreditei em guerra de civilizações — disse.

O Brasil, que derrubou dois candidatos do país para apoiar abertamente o egípcio — oficialmente, para dar uma chance aos árabes, que há muito tempo querem o comando da Unesco — sai mal desta eleição. Esta foi a avaliação de um dos candidatos brasileiros preteridos, Márcio Barbosa, vice-diretor-geral da Unesco. Ele disse que alertou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, dos riscos da candidatura egípcia.

— O Brasil se sai muito mal, porque se alia a países que praticam uma política que não imaginamos como uma democracia — disse, acrescentando que EUA e Japão já consideravam até cortar ajuda a alguns programas da Unesco, caso Hosni tivesse sido eleito.

Funcionários da Unesco se mostram aliviados Para Barbosa, a eleição da búlgara salvou a imagem da Unesco. Com um egípcio que pregou queima de livros israelenses, diz Barbosa, a organização perderia credibilidade nas suas principais vocações: diálogo entre culturas, diversidade cultural e liberdade de imprensa.

— Ela (Bokova) é competente, qualificada, não tem arestas, tem uma vida que todos reconhecem como importante na democracia no país dela, conhece a organização, é simpática e tem tudo para ser uma grande diretora — disse Barbosa.

O candidato derrotado, horas antes da eleição, já pressentia a dificuldade da disputa.

Numa entrevista à televisão egípcia El Hazat, Hosni acusou organizações judaicas de não quererem um árabe no comando da Unesco. E ainda fez críticas à organização: — A forma como a Unesco lidou comigo mostra que está se tornando uma organização política e não uma organização cultural.

Na campanha, o candidato egípcio, ministro da Cultura há mais de 15 anos, e um dos homens mais próximos do presidente egípcio Hosni Mubarak, chegou a pedir desculpas por suas declarações contra israelenses, alegando que foram feitas no calor do conflito entre palestinos e Israel. Mas, nos corredores da Unesco, funcionários não escondiam alívio com a eleição da búlgara.

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