A Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei do deputado Vicentinho (PT-SP) oficializando o "Hino à negritude", do professor Eduardo de Oliveira. O projeto original previa sua execução obrigatória em todas as solenidades dirigidas à raça negra, mas a exigência caiu na Comissão de Educação: o que os alunos não negros fariam em tais solenidades?
Grandes compositores como Geraldo Pereira, Martinho da Vila, Paulinho da Viola, Cartola, Assis Valente, Silas de Oliveira, Baden Powell, Nei Lopes, Gilberto Gil, Jorge Benjor, e até não negros como Vinicius de Morais, Chico Buarque e Caetano Veloso, já homenagearam magistralmente os afro-brasileiros e sua contribuição à nossa cultura, na língua viva do samba e de suas vertentes. Era grande a expectativa por um hino oficial à negritude. Mas quase não acreditei no que ouvi.
É uma marcha escolar-militar, banal e tradicional. Sem fazer juízo de valor, nada nela lembra nem remotamente as novas linguagens que a música negra deu ao mundo, com o samba, o jazz, o rock, o soul, o rap?
Apesar da vasta produção de nossos compositores, o deputado Vicentinho argumenta que "não temos ainda símbolos que enalteçam e registrem este sentimento de fraternidade entre as diversas etnias que compõem a base da população brasileira". Fraternidade? O hino ignora as nossas outras etnias. Como o próprio nome diz, só exalta as qualidades do homem "belo e forte na tez cor de ébano/só lutando se sente feliz/brasileiro de escol/luta de sol a sol/para o bem de nosso país". Pardos, índios e imigrantes foram excluídos.
Ao lado de tudo que nossos grandes compositores já cantaram, com tanto talento e originalidade, exaltando os negros brasileiros, o "Hino à negritude" se parece mais com os velhos hinos "brancos" e ufanistas. E o que seria homenagem soa como uma paródia do estilo do opressor:
"Ergue a tocha no alto da glória/ quem, herói, nos combates, se fez/pois que as páginas da História/são galardões aos negros de altivez."
Os negros não precisam de cotas na música brasileira. Nem o Brasil, de racismo. Que tal tentar um "Hino ao pobre"?
Nelson Motta é jornalista.
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