sábado, 12 de maio de 2012

Desvio de verbas públicas deve levar à condenação de empresas

Comissão de reforma do Código Penal aprova mudança; hoje só pessoa física é punida

A condenação por crimes contra a administração pública, como corrupção e desvio de verbas, poderá ser estendida a empresas. A proposta já foi aprovada pela Comissão de Juristas criada pelo Senado para discutir mudanças no Código Penal e será levada a debate na Casa. Hoje, só pessoas físicas são condenadas por corrupção, e empresas têm apenas penalidades como multas e proibição de firmar novos contratos. "A responsabilidade penal possui um peso, um estigma. É diferente da infração administrativa ou civil", disse o presidente da comissão, o ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça. Ele evitou comentar se a Delta, envolvida no escândalo do bicheiro Cachoeira, se enquadraria na situação caso a regra estivesse em vigor.

Empresa corrupta poderá ter condenação

LIGAÇÕES PERIGOSAS

Evandro Éboli

BRASÍLIA - A Comissão Especial de Juristas que elabora proposta de um novo Código Penal aprovou ontem a punição criminal das empresas privadas por atos contra a administração pública, como corrupção, peculato e desvio de verba. Hoje, apenas a pessoa física corre risco de ser condenada. As empresas, pelas leis atuais, são responsabilizadas apenas em casos de crimes ambientais.

As penalidades para as empresas condenadas variam, desde a prestação de serviço comunitário por parte do responsável e multas até a proibição, por até um ano, de estabelecer contrato com empresas estatais, de participar de licitações, de obter financiamentos de bancos oficiais e até perda de bens e valores. Essas privações podem ser prorrogadas, dependendo do caso e se houver reincidência. A proposta da comissão será avaliada pelos senadores. Só então será transformada em projeto de lei e começará a tramitar no Senado. Depois o projeto ainda tem que passar pela Câmara e ir à sanção presidencial.

O presidente da comissão, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Gilson Dipp, evitou comentar se a construtora Delta, envolvida no escândalo do bicheiro Carlinhos Cachoeira, se enquadraria nessa situação caso as regras aprovadas ontem estivessem em vigência.

- A responsabilidade penal possui um peso, um estigma que só a dignidade de uma norma penal tem. É muito diferente da infração administrativa ou civil - afirmou Gilson Dipp, que foi escolhido anteontem pela presidente Dilma Rousseff para integrar, também, a Comissão Nacional da Verdade.

Serão considerados atos cometidos pelo representante legal da empresa; ou contratual da empresa jurídica; ou ainda pelo colegiado dirigente. O critério a ser levado em conta é se o ato de infração gerou benefícios para a empresa. De acordo com Gilson Dipp, as medidas aprovadas ontem, se adotadas, vão repercutir sobre as empresas e seus dirigentes por seus efeitos econômicos.

- São penas compatíveis com a natureza da pessoa jurídica. Evidentemente que não se pode por uma empresa na prisão - explicou Dipp, que, ao comparar com legislações de outros países, considerou que o Brasil está muito atrasado nessa área.

A proposta de punir empresas privadas que praticam corrupção foi apresentada pelo relator do novo Código Penal, o procurador da República Luiz Carlos Gonçalves. O tema gerou muito debate na comissão, formada por especialistas, juristas e advogados renomados que atuam no mercado.

- As empresas sempre se safavam. Usavam seus funcionários como laranjas e eles eram os únicos responsabilizados - disse Luiz Carlos Gonçalves.

O desembargador José Muiños Piñeiro Filho, do Tribunal de Justiça do Rio e integrante da comissão, defendeu as novas medidas.

- É uma discussão polêmica e a comissão tem aprovado propostas rigorosas aos crimes que lesam o erário - disse José Muiños Piñeiro.

O grupo aprovou também ontem que, no julgamento de indígenas que cometem crimes, seja levado em conta os "costumes e crenças dos povos". O índio poderá, por exemplo, ser isento da pena ou, em caso de condenação, ter sua pena reduzia. E ainda será elaborado um laudo antropológico para saber se o indígena acusado de crime sabia que estava infringindo.

A Comissão de Juristas já aprovou a criminalização do enriquecimento ilícito do servidor público; considera como atenuantes se um condenado for doador de sangue ou de órgão; e ampliou hipóteses dos abortos legais.

FONTE: O GLOBO

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