Começa a regalia dos presos
Dirceu, Genoino e Delúbio receberam várias visitas ontem, embora as normas da Papuda proíbam a prática na terça-feira. Tratamento diferenciado revoltou parentes de detentos
Renata Mariz e Étore Medeiros
Mães e mulheres de presos comuns acamparam ao lado de barraca de militantes do PT, na porta da Papuda
BRASÍLIA – As portas do Complexo Penitenciário da Papuda são abertas para visita aos presos apenas às quartas e às quintas-feiras, das 9h às 15h. Menos para os condenados ilustres no processo do mensalão. O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, o deputado federal José Genoino (PT-SP) e o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares tiveram um dia de muitos encontros. Eles receberam familiares, políticos, um carro com placa diplomática e até uma van que levou deputados — os outros nove detidos no local por causa da Ação Penal 470, como o operador do esquema, Marcos Valério, não tiveram o mesmo benefício. A romaria revoltou parentes de presos que, desde ontem de manhã, chegavam à porta da Papuda para garantir lugar na fila da senha distribuída hoje para liberação das visitas.
"Coitado do meu filho. Se fosse bem tratado igual a eles...", lamentou Aline*, de 59 anos, que há dois anos e três meses visita o filho semanalmente. Enquanto o grupo de cerca de 20 mulheres — alguns poucos homens só chegaram à noite — tentavam matar o tempo, a movimentação em frente à penitenciária não parou. Ainda de manhã, o deputado federal Paulão (PT-AL) deixou o presídio relatando as visitas recebidas por Genoino, como a da mulher, Rioco Kayano, e dos três filhos que entraram junto com o líder do PT na Câmara, José Guimarães (CE) — irmão de Genoino. A família já o havia visitado anteontem, com o senador Eduardo Suplicy (PT-SP). Questionado sobre a regalia, Paulão alegou: "É uma responsabilidade da direção do presídio, isso não é influência do PT nem de nenhum parlamentar". De acordo com ele, Mônica Valente, mulher de Delúbio, e um irmão do ex-tesoureiro estiveram no local, além de "amigos" de Dirceu. Os deputados Zeca Dirceu (PT-PR), filho do ex-ministro; Erika Kokay (PT-DF), Renato Simões (PT-SP) e o presidente do PT, Rui Falcão, também estiveram lá.
No fim da tarde, uma van com deputados cruzou a portaria. Na parte da frente, estavam Amaury Teixeira (PT-BA) e Benedita da Silva (PT-RJ). Ao longo do dia, pelo menos 14 pessoas estiveram com os três condenados, excluindo os advogados. As regras do presídio, porém, limitam as visitas a quatro por preso a cada dia. Para entrar, eles passam por scanner corporal e, muitas vezes, por revista íntima, sem roupa.
A Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF) informou, por meio da assessoria, que as visitas aos condenados do mensalão foram autorizadas excepcionalmente pelo diretor da unidade, porque o dia de visita aos presos, que estavam em ala federal, seria ontem. Como eles foram transferidos para o setor de semiaberto, a entrada foi permitida. A pasta alegou que parlamentares não precisam de permissão, mas não soube informar a norma que regula o assunto. O órgão garantiu que os visitantes passaram pelo raio-x e que a revista íntima é exceção. Segundo o deputado Paulão, entretanto, o único procedimento foi deixar o celular do lado de fora.
A argumentação da secretaria, no entanto, não diminuiu a revolta de Rebeca*. "Quem tem dinheiro e poder pode tudo. A gente é humilhado, xingado, tratado que nem cachorro", acredita a mulher de 28 anos, cujo marido está preso por formação de quadrilha. "Como não há revista íntima, se até nós, da Pastoral, temos de ficar nus lá?", indaga o assessor jurídico da Pastoral Carcerária, José de Jesus Filho.
Genoino O laudo do Instituto Médico Legal (IML) sobre a saúde de Genoino, feito a pedido da Justiça do Distrito Federal, concluiu que ele é "paciente com doença grave, crônica e agudizada, que necessita de cuidados específicos, medicamentosos e gerais". O documento afirma ainda que é necessário controle periódico por exame de sangue, dieta com reduzido consumo de sal e adequada aos medicamentos. Até o fim desta edição, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, aguardava laudo para decidir se aceita o pedido de prisão domiciliar feito pela defesa de Genoino. Em parecer enviado ao STF, a Procuradoria Geral da República pediu que o deputado seja analisado por uma junta de cardiologistas.
Genoino, Dirceu e Delúbio aproveitaram a visita do advogado Luiz Egami para divulgar uma carta, escrita a mão, endereçada à militância do partido, em que agradecem o apoio recebido e dizem que "não se curvarão à humilhação". Juristas, intelectuais e dirigentes do PT, divulgaram ontem um manifesto público que classifica a decisão de Barbosa de "ilegal".
*Nomes fictícios a pedido das entrevistadas
Fonte: Estado de Minas
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