quinta-feira, 2 de junho de 2016

Economia agora se retrai em ritmo menos intenso – Editorial / Valor Econômico

A economia brasileira perdeu velocidade de queda e sua decolagem, ainda incerta, poderá ocorrer no segundo semestre do ano. Na comparação trimestre contra trimestre anterior, os resultados do Produto Interno Bruto divulgados ontem apontam para quedas progressivamente menores, partindo de -2% no segundo trimestre de 2015 até -0,3% no primeiro de 2016. O PIB driblou a expectativa dos analistas e recuou -0,3%, ante previsões de -0,8%. A recuperação dependerá da reação do consumo das famílias, que, se ocorrer, tende a ser lenta. O setor externo foi o único que deu impulso positivo à economia, enquanto que a formação bruta de capital fixo, com -2,7% no trimestre e -17,5% em relação ao mesmo período de 2015 agiu no sentido contrário.

Do lado da demanda, o PIB foi puxado para baixo pela diminuição de 1,7% do consumo das famílias que, em um ano, está 6,3% mais fraco. Como seu peso é determinante para o desempenho da economia - 63% ou quase dois terços do PIB -, não há boas notícias a esperar em breve. O desemprego aumentou para 11,2% no trimestre fevereiro-abril e a renda encolheu 3,3%, em um movimento que a maior parte dos analistas estima que não se esgotou. As previsões mais comuns veem o pico do corte de vagas na casa dos 13%, em um processo que se estenderia ao longo do ano.


Há mais: crédito contido e juros altos elevam a inadimplência, enquanto uma parcela dos devedores procura poupar mais para reduzir o endividamento, com efeito contracionista sobre o consumo. Algo semelhante ocorre com as empresas, que, endividadas e com receitas cadentes, reduziram encomendas e investimentos, o que se revelou nas abismais quedas da formação bruta de capital fixo.

O consumo do governo cresceu 1,1% no primeiro trimestre do ano em relação ao trimestre anterior, quando tivera um recuo surpreendentemente forte, de 2,9%. Em relação ao mesmo período do ano anterior, porém, as despesas do governo são cadentes a cada trimestre e encolheram 1,4% agora. Nos primeiros três meses de 2016, o consumo do governo representou 19,1% do PIB e seu papel futuro, expansionista ou contracionista, dependerá do ajuste fiscal em curso, que está incompleto.

As primeiras indicações, dadas pela meta de déficit de R$ 170 bilhões em 2016, quase o dobro do estimado pelo governo de Dilma Rousseff, apontam para um orçamento ligeiramente expansionista. A regra do ajuste de que a evolução das despesas não supere a inflação tende a ser expansionista também no próximo ano, já que a inflação é cadente. Mas é quase certo que medidas para aumento das receitas virão, porque elas mostram queda real perto de 4% no ano e porque o mergulho dos gastos privados tem grande peso negativo na arrecadação.

Elevação ou criação de impostos poderão jogar o pêndulo fiscal para o lado contracionista, embora isso dependa também de cálculo político. O orçamento com folga permite algum estímulo para que a economia comece sua rota ascendente, melhorando a confiança de empresários e consumidores. Com os dados do PIB do primeiro trimestre, previsões estão sendo refeitas na direção de um tombo ligeiramente menor em 2016 e expansão modesta, embora maior, em 2017.

O único motor da reativação tem sido o setor externo, que já permitiu alguma melhoria na performance de segmentos industriais. A balança comercial fechou os primeiros cinco meses do ano com um superávit de US$ 19,6 bilhões, dando consistência às projeções que apontam que o saldo poderá ultrapassar US$ 40 bilhões em 2016. A desvalorização cambial e a recessão barraram as importações, que seguem em queda, possibilitando alguma substituição pela produção local.

Embora pareça faltar pouco para que a economia chegue ao fundo do poço, ela ainda não chegou lá. O índice Markit (gerente de compras) para a indústria recuou em maio para o seu mais baixo nível em 87 meses, com diminuição de encomendas e fortes demissões.

Com nove trimestres de derrocada, queda acumulada de 9% do PIB e de retração do PIB per capita que já supera o da "década perdida", o Goldman Sachs aponta que o Brasil esteve à beira da depressão. Se a crise política der uma trégua e as medidas econômicas do governo Temer restaurarem algum grau de confiança, até o fim do ano os sinais de recuperação poderão surgir com clareza.

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