- Valor Econômico
Principais candidatos têm vulnerabilidades eleitorais
O Partido Democrata americano está numa sinuca. Seus três principais candidatos a desafiar o presidente Donald Trump nas eleições de 2020 têm vulnerabilidades eleitorais. E nenhum candidato alternativo se destacou até agora. Ainda há tempo para isso acontecer, mas essa janela está se fechando.
Após três desistências, 20 pré-candidatos, um recorde, ainda estão na disputa para liderar a chapa democrata na eleição presidencial do ano que vem. Isso sugere que os políticos do partido estão otimistas com a possibilidade de derrotar Trump.
Segundo todas as pesquisas, o ex-vice-presidente Joe Biden lidera a corrida para ser o candidato democrata. Ele é o preferido dos quem dizem que votarão nas primárias, as prévias do partido. Essa liderança varia muito de acordo com a pesquisa, indo de 4 a 18 pontos, levando em conta apenas as sondagens divulgadas nos últimos 30 dias.
O site Realclearpolitics, que faz uma média de pesquisas, aponta Biden com 30,4% da preferência. Em segundo lugar há um empate técnico entre os senadores Elizabeth Warren, com 17,1%, e Bernie Sanders, com 16,3%. Num distante quarto lugar aparecem, em empate técnico, a senadora Kamala Harris, com 6,6%, e Pete Buttigieg, prefeito de uma cidade em Indiana, com 4,6%.
À parte as oscilações habituais das pesquisas, as principais mudanças recentes nesse cenário foram a ascensão de Warren a partir de junho, e a coincidente queda de Harris, a partir de julho.
Assim, a disputa parece estar entre Biden, Warren e Sanders. Os três, porém, são vistos como candidatos arriscados por analistas políticos dos EUA.
Biden é considerado velho demais para entrar numa campanha presidencial. Com 76 anos hoje, ele seria de longe o presidente mais velho da história dos EUA. Assumiria com 77 anos, bem acima dos 70 de Trump e dos 69 de Reagan. Não se trata de preconceito contra a idade. A campanha eleitoral americana é longa e duríssima, exige muito, física e mentalmente, dos candidatos. Tanto que Trump já colocou em Biden o apelido de "Sleepy Joe", algo como Joe Sonolento. Além disso, é incerto se Biden conseguirá mobilizar o eleitorado jovem, que foi muito importante para a vitória dos democratas nas eleições para o Congresso no ano passado.
Biden também é famoso por sua propensão a gafes - há um festival delas na internet. Ele seria ainda atormentado durante a campanha por sua proximidade com políticos racistas no passado e pelas acusações de conduta inadequada feita por mulheres. Os eleitorados afro-americano e feminino são vitais para a chance de uma vitória contra Trump.
Muitos democratas temem que o centrista e cordial Biden seria trucidado nos debates por Trump, que é um comunicador mais experiente. Muito atacado, seu desempenho no primeiro debate entre os pré-candidatos democratas foi ruim e ele perdeu dez pontos nas pesquisas nas semanas seguintes.
Sanders, de 77 anos, é ainda mais velho que Biden. Ele, porém, é popular entre os jovens, mas por uma razão que preocupa o partido. Possivelmente um dos democratas mais esquerdistas, Sanders se define socialista, o que é quase um palavrão para boa parte dos americanos. Ele apoia uma agenda popular entre jovens: a criação de um sistema nacional de saúde pública nos EUA (acabando com o setor de seguro-saúde privado), perdão da dívida com financiamento estudantil (que supera US$ 1,5 trilhão), universidades gratuitas, aumento do salário mínimo e uma política ampla de combate ao aquecimento global. Economistas dizem que não há orçamento para fazer tudo isso.
Essa agenda mobilizou o eleitorado democrata em várias partes dos EUA nas eleições legislativas de 2018, o que levou ao Congresso caras novas, como a jovem deputada Alexandria Ocasio-Cortez. Não se sabe, porém, se isso funcionará numa eleição presidencial. A estratégia de Trump está calcada em descrever o Partido Democrata como esquerdista, o que pode alienar o grosso do eleitorado, mais centrista ou independente.
Na campanha eleitoral de 2016, a cúpula do partido atuou secretamente para favorecer Hillary Clinton contra Sanders. Não há sinais de que prefira Sanders agora.
Warren, de 70 anos, vem endossando boa parte da agenda social apoiada por Sanders, o que possivelmente a ajudou a subir nas pesquisas. Mas isso também colou nela a imagem de esquerdista, o que Warren vem recentemente tentando moderar, com declarações como ser "capitalista até os ossos". Pesquisas indicam que, como Sanders, ela tem pouco apoio entre os eleitores moderados.
Warren tem ainda poucos amigos no setor financeiro. Sua forte atuação no Senado em favor de regulação financeira mais dura fez dela persona non grata em Wall Street. Também não está claro se a onda conservadora que levou Trump ao poder favorece uma candidata mulher, ainda que os democratas muito provavelmente terão uma mulher na chapa em 2020, seja como presidente ou vice.
Mais jovens e mais centristas, Harris (54 anos) perdeu o impulso inicial e Buttigieg (37 anos) não deslancha. Harris é senadora júnior pela Califórnia e tenta dar o salto raro conseguido por Obama, que foi do primeiro mandato no Senado direto para a Presidência. Contra Buttigieg também pesa a inexperiência, pelo fato de ser apenas prefeito de South Bend, cidade média no Estado de Indiana. Poucos presidentes americanos foram prefeitos, e nenhum saltou diretamente de uma prefeitura para a Casa Branca.
Na semana que vem haverá novo debate democrata, entre os dez pré-candidatos mais bem colocados nas pesquisas. Outros três ocorrerão até o fim do ano. Eles devem ser a derradeira chance para alguém despontar na corrida presidencial. O cenário está aberto, mas tende a se afunilar nos próximos meses.
Ainda assim, não será fácil. Na última disputa aberta entre os democratas, na qual não havia nem um presidente nem um vice concorrendo, em 2008, os três que chegaram com chances nas primárias, que começam em fevereiro, eram os mesmos que lideravam as pesquisas em setembro do ano anterior (Hillary, Obama e John Edwards).
Não é impossível que um candidato esquerdista vença Trump em 2020, mas isso surpreenderia. Warren deverá continuar tentando atrair o eleitorado centrista, o que é incerto. E é muito provável que Warren e Sanders dividam o eleitorado de esquerda nas primárias democratas, favorecendo uma Biden. O partido tem um dilema.
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