Folha de S. Paulo
Negociação da Covaxin desmonta linha de
defesa de Bolsonaro
Para não comprar vacinas, Jair Bolsonaro
reclamou do preço da Coronavac, levantou suspeitas sobre interesses
estrangeiros na imunização, desdenhou do número de doses prometidas pela Pfizer
e usou a Anvisa como pretexto para a própria omissão naquelas negociações.
O presidente adotou essas desculpas
esfarrapadas para se proteger das acusações de que rejeitou a vacina e apostou
na contaminação em massa dos brasileiros. A negociação
a jato do contrato de R$ 1,6 bilhão para a compra da Covaxin, no
entanto, desmonta sua linha de defesa.
O governo pagou mais pela vacina do laboratório indiano Bharat Biotech do que por qualquer outro imunizante. Em novembro, Bolsonaro criava obstáculos para a compra da Coronavac ao dizer que não pagaria qualquer preço por ela. A dose da vacina chinesa custou ao país R$ 58, enquanto a Covaxin saiu por R$ 80.
Além de abrir o cofre, o presidente ajudou
no lobby da empresa que intermediou o negócio. Em janeiro, antes do acerto, ele
mandou uma carta ao primeiro-ministro indiano para informar que a Covaxin já
havia sido escolhida para o programa de imunização brasileiro. O mesmo
Bolsonaro insinuava que as negociações do governo paulista com a China escondiam
interesses paralelos.
O Ministério da Saúde também fez vista
grossa para o atraso na remessa do imunizante. A entrega da Covaxin deveria ter
começado em maio, mas nenhum lote chegou, e o contrato segue de pé. A pasta não
foi tão benevolente com a Pfizer: em 2020, o governo recusou 2 milhões de doses
porque a
quantidade causaria “frustração” aos brasileiros.
Bolsonaro também perdeu o direito de
repetir o mantra de que jamais rejeitou vacinas e que só compraria imunizantes
aprovados pela Anvisa. O acordo com a Covaxin foi assinado quatro meses antes
do aval parcial dado pela agência.
O Ministério Público Federal vai investigar esse contrato. O governo terá que confessar que favoreceu a Covaxin ou admitir que foi negligente com as demais vacinas.
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