Correio Braziliense
Com todos os seus defeitos, Doria tinha uma
proposta programática social-liberal. Já o grupo liderado por Garcia não tem
proposta alguma. O PSDB declara neutralidade, o Cidadania apoia Lula
A coligação PSDB-Cidadania elegeu 18
deputados, de uma bancada de 29 parlamentares. Os tucanos eram 22, agora são
13. Os “cidadânios”, digamos assim, eram sete, e agora são cinco. A coligação
foi feita para consolidar a hegemonia interna dos deputados paulistas de ambas
as legendas, em torno da candidatura à reeleição do governador Rodrigo Garcia,
que não chegou ao segundo turno. À época, o candidato do PSDB era o governador
João Doria, candidato à Presidência, mas havia uma conspiração armada para
defenestrá-lo tão logo se desincompatibilizasse do cargo para disputar a eleição.
No começo, Doria não acreditou que isso poderia ocorrer, mas levou um xeque-mate tão logo Garcia assumiu controle pleno do Palácio dos Bandeirantes. O vice que assumira o governo fazia a política municipalista, enquanto Doria se digladiava com o presidente Jair Bolsonaro (PL) durante a pandemia, diga-se de passagem, em defesa da causa mais justa naquele momento: a política de distanciamento social e a corrida para produção de vacinas.
O governador foi vitorioso do ponto de
vista da política sanitária, mas a superexposição aumentou sua taxa de rejeição
no plano eleitoral. Garcia era um articulador suave, que conquistou o apoio da
maioria dos prefeitos e da bancada tucana. Conduziu com competência a operação
de cerco e aniquilamento de seu padrinho político no partido.
O PSDB não queria Doria como candidato, ou
melhor, não queria ter candidato algum à Presidência. Isso seria um estorvo
para a maioria da sua bancada federal, que estava grudada como bigode no
Centrão, ou seja, na boca do Orçamento Secreto, mas do lado de fora do governo
Bolsonaro.
A federação com o Cidadania facilitava a
montagem das chapas proporcionais e trazia um aliado para disputa contra Doria.
A preferência do Cidadania era o governador gaúcho Eduardo Leite, que jogou a
toalha na disputa com Doria, ao perceber que os paulistas também não queriam
que fosse candidato. Para o Cidadania, a federação resolveria suas dificuldades
para ultrapassar a cláusula de barreira e poderia garantir a sobrevivência do
partido, que sucedeu o antigo PPS (ex-PCB).
A salvação da lavoura foi a candidatura de
Simone Tebet (MDB), um dos raros produtos da alta política dessas eleições, que
sobreviveu a todos os assédios para que retirasse seu nome da disputa. O
presidente do Cidadania, Roberto Freire, obsessivo articulador de uma
alternativa de centro democrático à polarização Lula x Bolsonaro, e o deputado
Baleia Rossi, presidente do MDB, que bancou a candidatura, foram os artífices
dessa empreitada. Simone fez uma bela campanha, apesar de “cristianizada” pelo MDB
e pelo PSDB. O Cidadania investiu em sua candidatura, mesmo sem possibilidade
de ir ao segundo turno, vislumbrando que seria uma aposta para o futuro, ou
seja, para 2026.
O que deu errado? O maquiavelismo
provinciano de Garcia e seus aliados, que não contavam com a força do
presidente Jair Bolsonaro (PL) na alavancagem da candidatura de Tarcísio de
Freitas (Republicanos), que virou o primeiro turno como franco favorito. Garcia
ainda tentou desbancá-lo, fazendo pilhérias com o fato de o adversário não ser
paulista e sequer saber onde ficava a seção eleitoral na qual votou. Mas não
contava com o desgaste da longa permanência do PSDB no poder e das defecções
que legenda sofreu desde quando Doria passou a controlar seu diretório
regional. A mais importante foi a do ex-governador Geraldo Alckmin, que virou
vice de Lula, mas houve outras, como a do ex-senador Aloysio Nunes Ferreira.
Troca-troca
O fato de o PT tratar Garcia como inimigo
principal foi um equívoco grave, porque deixou Tarcísio solto e acabou empurrando
toda a base do governador paulista para o colo do candidato que encarnava a
polarização nacional. Isso criou as condições para que Garcia anunciasse apoio
a Bolsonaro no segundo turno, para horror dos tucanos históricos, que estão
vendo a legenda se transformar num partido meramente fisiológico. Com todos os
seus defeitos, Doria tinha uma proposta programática social-liberal. Já o grupo
liderado por Garcia não tem proposta alguma.
Liderado por Roberto Freire, o Cidadania
tenta resistir ao arrastão bolsonarista em São Paulo, mas o líder da bancada na
Câmara, Alex Manente, que se elegeu com grande votação, fez questão de marcar
posição e anunciou que a bancada ficaria neutra na disputa nacional. A maioria
apoiará a reeleição do presidente da República nos estados.
Entretanto, a legislação permite a troca de
legendas dentro da federação, sem perda de mandato. Os dois partidos teriam
mais nitidez se fizessem um troca-troca: quem apoia Lula no segundo turno fica
ou vai para o Cidadania, quem apoia Bolsonaro permanece ou muda para o PSDB. Ou
vice-versa. Seria mais coerente.
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