Valor Econômico
Sucessão de 2026 alimenta fogo amigo contra
o ministro
A antipatia do mercado financeiro e de
empresários ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), está longe de ser o
principal desafio à gestão dele. É na política que residem as maiores cascas de
banana. O risco não é nem tanto o provocado por inimigos externos, a oposição
que pode se beneficiar dos problemas na economia, mas o fogo amigo que tende a
arder intensamente nos próximos quatro anos. O governo Lula 3 começou com muita
gente já pensando na eleição de 2026. Se Haddad cair, é numerosa a lista de
petistas que podem sonhar em virar presidente do Brasil.
Os atuais 77 anos do presidente, 81 ao final do mandato, desaconselham a reeleição por ora ventilada por setores do partido. O nome hoje posto para substitui-lo como candidato à Presidência é o de Haddad, a quem Lula prepara há mais de uma década para ser seu sucessor. A confiança entre ambos é tanta que o ex-prefeito de São Paulo foi escolhido para o ministério de maior protagonismo da Esplanada - mas também aquele de quem mais são cobrados resultados.
O ministro, por óbvio, foge dessa discussão
eleitoral. Se Lula não quiser concorrer à reeleição, será ainda o principal
cabo eleitoral da esquerda e quem de fato é seu favorito não precisa antecipar
nada. Haddad sabe disso. Em entrevista ao Valor, chamou de “precipitação total” tratar da de
2026 em janeiro de 2023. “Temos muitos problemas para resolver. Vamos criar
mais um? Este não é um problema. Vamos tratar dos problemas que a gente tem,
depois a gente inventa outros.”
Quanto menos a sucessão estiver em debate
no Brasil, melhor para o ministro neste momento. Seu trabalho já é colossal:
entregar uma reforma tributária e um novo marco fiscal para o país, gerar renda
e emprego e reduzir o bilionário déficit nas contas públicas enquanto acomoda a
pressão do PT e aliados por mais investimentos em obras e gastos sociais. Se a
economia crescer forte, não haverá rival no PT que o tire do posto de sucessor.
Se der errado, não faltam nomes para substitui-lo.
A presidente do PT, deputada Gleisi
Hoffmann (PR), mostrou força na montagem inicial do governo, distribuiu cargos
e teve sua voz ouvida em todas as formulações. Tem ainda respaldo visto poucas
vezes antes no partido. O ministro da Casa Civil, Rui Costa, precipitou-se a
lançar Lula à reeleição, num movimento que causou estranheza a quem olhou de
fora e ruídos na aliança recém-formada. Foi uma vacina. Em 2019, com Lula preso
e inelegível, o governador da Bahia disse à “Veja” que então trabalharia para
ser o candidato do PT à Presidência em 2022 e que as alianças do partido não
deviam estar condicionadas ao “Lula Livre”. Pegou muito mal no PT. Ao já
sugerir agora a reeleição, Costa foge da armadilha de se colocar de novo
antecipadamente como presidenciável.
Gleisi e Costa são hoje os dois nomes mais
fortes caso Haddad deixe as preferências de Lula, mas o petista montou seu
ministério com políticos tarimbados e testados, que podem se destacar e galgar
espaço. Os ex-governadores Camilo Santana e Wellington Dias são espécie de
coringas no partido e foram cotados para várias áreas e funções antes de
assumirem a Educação e o Desenvolvimento Social. Idem com Alexandre Padilha,
que comanda as Relações Institucionais, mas não será mero “garçom” dos pedidos
de congressistas ao governo e também terá papel de destaque na formulação das
políticas públicas junto a governadores, sociedade civil e empresários.
Há também quatro ministros com projeção
nacional e que podem construir candidaturas alternativas ao PT se Lula decidir
não concorrer: Flávio Dino (PSB), na Justiça e Segurança Pública; Simone Tebet
(MDB), no Planejamento; Marina Silva (Rede), no Meio Ambiente; e o
vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), que acumula a função com a de ministro
do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.
Todas as considerações feitas aqui não
esquecem que quatro anos é tempo demasiadamente longo na política. Nos Estados
Unidos, os democratas esperavam que Joe Biden, mais velho presidente a tomar
posse por lá, com 78 anos, fizesse um mandato de transição e que sua vice seria
a candidata em 2024, mas Kamala Harris está pessimamente avaliada, Biden agora
insiste na reeleição e nenhuma liderança no partido mostrou força para liderar
no lugar dele, apesar da gestão criticada, o que amplia as chances de um
retorno do ex-presidente Donald Trump.
No Brasil, o cenário hoje observado pelos
políticos para planejarem seus movimentos é o de Haddad como sucessor de Lula,
mas com muitos petistas no entorno para desbancá-lo. Foi com fogo amigo que
outras figuras de destaque do partido, como o ex-ministro da Fazenda Antonio
Palocci, caíram. O script é conhecido: denúncias à imprensa, contestação
interna das ideias e resultados obtidos, vazamento de informações para
queimá-lo e mostrar que perdeu esta ou aquela queda de braço. E sempre sob
sigilo, para que não saibam quem foi o “amigo” autor do ataque.
Haddad já sentiu um pouco da fritura que
está por vir ao defender o fim dos subsídios para os combustíveis e, logo
depois, Lula ser convencido por outros petistas de que o governo não podia
começar com alta na gasolina. A notícia de que a reoneração poderia continuar
não foi anunciada pelo ministro, mas pela presidente do PT.
A força do ministro da Fazenda é ponto
central na relação com o mercado, mas também na negociação com o Congresso.
Paulo Guedes acumulou poder enorme como ministro da Economia (Pasta que, sob
Lula, foi dividida em quatro), mas políticos muitas vezes preferiram convidar o
presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, para debater os projetos ou
foram atrás do ex-ministro da Casa Civil Ciro Nogueira para excluir Guedes das
negociações.
O primeiro teste de força de Haddad como principal nome da área econômica não será a aprovação do arcabouço fiscal ou a reforma tributária, mas manter sob sua alçada o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) quando o Congresso for votar a medida provisória (MP) que retirou o organismo do controle do Banco Central.
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