Folha de S. Paulo
Tese de ‘virada à esquerda’ está errada
Lula nomeou Marcio
Pochmann presidente do IBGE, órgão ligado ao Ministério do
Planejamento de Simone Tebet.
Alguns observadores viram na nomeação um esvaziamento dos poderes da ministra
e/ou uma tentativa de virar o governo à esquerda.
A tese da "virada à esquerda"
está errada. Se Pochmann tivesse sido indicado para mudar a política econômica,
o enfraquecido teria sido Haddad,
não Tebet. O PT até
pode sabotar a presidenciável dos outros, mas não teria por que sabotar o
próprio.
Na verdade, o episódio ganhou destaque
porque Tebet e
Alckmin são os grandes fiadores da adesão de setores do centro
liberal ao governo.
Com a imposição de
Pochmann a Tebet, surgiu a suspeita de que o PT já estivesse
antecipando a briga eleitoral de 2026 e rompendo com a "Frente
Ampla".
Parece mais provável que Lula tenha apenas recompensado um aliado de longa data com um cargo importante. Não era fácil encaixá-lo no governo: dar a Pochmann um cargo no Ministério da Fazenda teria, aí sim, criado um boato plausível de mudança na orientação geral do terceiro governo Lula.
O IBGE não
tem qualquer influência sobre a política econômica e se adequa mais ao perfil
acadêmico de Pochmann. O economista é um especialista em
economia do trabalho, não em macroeconomia. Sua participação no debate sobre a
"Nova Classe Média", nos anos 2000, foi relevante.
Mas não resta dúvida de que Pochmann é
um economista controverso. Quando foi presidente do Ipea, teve conflitos com os
técnicos do instituto que os outros indicados por Lula e Dilma para presidirem
o órgão não tiveram. Além disso, em diversas oportunidades, defendeu políticas
econômicas inviáveis, sempre no espírito de "puxar a discussão para a
esquerda".
Em mais de um momento, Pochmann pareceu
corresponder à caricatura do economista de esquerda para quem a inflação nunca
é de demanda, o momento do ciclo econômico sempre exige mais gastos públicos e
todo crescimento econômico é explicável por alguma obra que o governo fez.
Pode apostar: não interessa o que Haddad
faça pelo ambiente econômico, vai ter gente na esquerda dizendo que qualquer
crescimento que venha terá sido causado por, sei lá, uma estátua em homenagem
ao pirarucu feita pelo ministro da pesca que, vejam só, teve multiplicador
fiscal de um trilhão.
Veremos como Pochmann se sairá agora que
não tem mais que "puxar a discussão" para lugar nenhum, mas sim
encerrá-la com decisões orientadas para resultados práticos.
O que me surpreendeu foi saber que teve
gente criticando Tebet por continuar no governo depois da nomeação de Pochmann.
Sair teria sido um erro terrível: o governo começou a dar certo, as
resistências no empresariado diminuíram, os bons resultados econômicos estão
chegando.
Depois de aguentar o estresse inicial do
governo, Tebet deveria entregar seu ministério para algum sujeito do centrão
que votou em Bolsonaro em 2022? Depois de o próprio Tarcísio
apoiar a reforma tributária, vocês querem me convencer que Tebet
deveria passar para a oposição?
Suspeito, inclusive, que muita gente
criticando Tebet já deve estar em processo de racionalização da opção Tarcísio,
cujas dificuldades de acomodar o centro a turma parece mais disposta a fingir
que não está vendo.
*É doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e autor de "PT, uma História".
2 comentários:
Celso Rocha de Barros matou a charada com garbo e humor.
Vai que em vez da estátua do pirarucu com efeito multiplicador fiscal de um trilhão, o que assustou de verdade a tchurma da esquerda total foi o pix do bozo de 17,2 mi, espécie de 'acarajé cor-de-rosa' criticado pelo Pochmann
A coluna está interessante, como sempre, mas não entendi e realmente não concordo com a afirmação do autor de que a função do presidente do IBGE é "encerrar a discussão com decisões orientadas para resultados práticos".
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