Ampla reforma administrativa não pode ser adiada
O Globo
É um equívoco autorizar novos concursos
antes de promover reformulação do setor público
O anúncio feito pela ministra da Gestão e
da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck,
de que já há concursos autorizados para contratar até 8.200 novos servidores
neste ano e que pretende antecipar mais 10 mil contratações previstas para o
ano que vem significa que o governo Lula dará prioridade a apenas ampliar a
máquina burocrática da União, não a torná-la mais eficiente. Melhor faria se
antes aprovasse no Congresso uma reforma
administrativa para tornar o funcionalismo muito mais
produtivo. Assim, proporcionaria ao país a chance de dar um salto qualitativo e
fazer uma enorme economia.
Somente uma ampla reforma administrativa conseguirá desvencilhar o Brasil de um de seus maiores problemas: a ineficiência crônica do setor público, que impede o cidadão de ter acesso a serviços de qualidade. Para piorar, a nossa burocracia é cara. As despesas com servidores públicos equivalem a 13% do PIB, percentual maior que os registrados em Portugal e França, segundo levantamento do Banco Mundial. Dados compilados pelo instituto República.org mostram que a mediana dos salários da União é de nada menos que R$ 10 mil mensais. Nos estados, é metade disso.
Há, é certo, ministérios e órgãos com evidente
deficiência de funcionários. Muitos anteciparam as aposentadorias antes da
necessária reforma da Previdência aprovada em 2019. Outros foram alvos do
governo anterior.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva,
expôs o desmantelamento de sua área, principalmente na fiscalização ambiental,
que passou a contar com um número insignificante de fiscais. Hoje há 80 mil
servidores federais na ativa a menos que há sete anos. No Brasil, a relação
entre o número de funcionários públicos e a população é mais alta que a média
da América Latina, mas não que a internacional. A parcela de servidores
federais no total do funcionalismo é de 10%, abaixo do percentual de outros
países federalistas, como Canadá e Austrália.
O problema é incluir novos concursados num
sistema cheio de direitos gravados em pedra, sem critérios de avaliação que
permitam manter uma mão de obra competente. Optar por esse caminho seria
incorrer no mesmo erro de sempre.
Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC)
foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e em Comissão Especial
na Câmara dos Deputados em 2021. Mesmo imperfeita, pode ajudar no debate.
Quando o governo resolver tratar do tema, certamente novas propostas serão
apresentadas. É fundamental modernizar o Estado brasileiro e acabar com
privilégios como os da elite do funcionalismo, em particular na Justiça, com
suas férias de 60 dias, auxílios e promoções automáticas.
A própria ministra Esther Dweck reconhece
que não existem recursos para contratar 80 mil pessoas. Um governo que se diz
disposto a colocar as contas públicas em dia não poderia mesmo cometer esse
equívoco. Adiar a necessária reforma administrativa é continuar condenando os
brasileiros a uma burocracia estatal incapaz de prestar serviços de qualidade.
Governos precisam de estratégias para
elevar índices de vacinação
O Globo
Dados da ONU mostram que Brasil avançou no
ano passado, mas números ainda estão longe da meta
Diante dos baixos índices de vacinação no
Brasil, não deixa de ser boa notícia a elevação de quase 10 pontos percentuais
na cobertura da vacina DTP
(que previne contra difteria, tétano e coqueluche), um indicador global de
imunização infantil. O crescimento, constatado pela ONU e pelo Unicef,
acompanha tendência de outros países, onde a cobertura dá sinais de recuperação
após os solavancos provocados pela pandemia.
O dado preocupante é que no Brasil, como no
mundo, a recuperação não foi suficiente para atingir as metas. Apesar de
significar um alento, o salto de 68% para 77% na cobertura ainda deixa o país
longe dos 95%. Em termos globais, os índices subiram de 81% para 84%.
Chama a atenção que o percentual do Brasil,
além de estar abaixo dos índices mundiais, fica aquém da média dos 57 países de
baixa renda apoiados pela Aliança Mundial para Vacinas e Imunização (Gavi), um
vexame. Nessas nações, a cobertura da DTP subiu de 78% para 81% entre 2021 e
2022.
Situação semelhante ocorre com outras
vacinas. A cobertura contra a poliomielite cresceu 6 pontos percentuais no
país, indo de 68% em 2021 para 74% em 2022. Mesmo assim, continua perigosamente
baixa, representando risco de a moléstia ressurgir depois de controlada. No
mundo, os índices também subiram (passaram de 81% para 84%), ficando mais perto
das metas.
A baixa cobertura atual é um lamentável
retrocesso. O Programa Nacional de Imunizações (PNI), criado nos anos 1970, se
tornou referência mundial por atingir altos índices de vacinação mesmo nas
regiões mais remotas do país.
É verdade que, em quatro anos, o governo
Bolsonaro não incentivou a vacinação — ao contrário, se empenhou para minar a
confiança nas vacinas, disseminando desinformação capaz de influenciar
negativamente os brasileiros. Mas é certo também que os índices já vinham
caindo antes de Bolsonaro. No caso da poliomielite, a última vez que o Brasil
atingiu 95% de cobertura foi em 2015, há quase uma década.
São muitas as causas para a queda nos
índices. A pandemia e o movimento antivacina são apenas algumas. O controle das
doenças, graças à vacinação em massa, costuma levar a um relaxamento que põe em
risco a própria estabilidade. Uma pesquisa feita pelo Ministério da Saúde no
ano passado mostrou que problemas logísticos também contribuem para a baixa
cobertura: falhas na distribuição, dificuldade de acesso aos postos, horários
incompatíveis com as rotinas dos moradores etc.
Ministério da Saúde, estados e municípios,
cada um com suas responsabilidades no SUS, têm obrigação de criar estratégias
para aumentar os índices de vacinação. Em geral, não há falta de doses — tanto
que muitas chegaram a ir para o lixo por falta de utilização, um descalabro num
país onde cidadãos ainda morrem de doenças evitáveis. O que falta é convencer
os brasileiros a se vacinar. Espera-se que as autoridades realizem campanhas e
mutirões para aumentar a cobertura — levar as vacinas às escolas costuma dar
bons resultados. Recuperar os índices é plenamente possível. O Brasil já
comprovou isso.
Lula lá e cá
Folha de S. Paulo
Governo gasta mais com pobres, mas ajuste
fiscal é crucial para gerar empregos
A principal marca social dos primeiros dois
mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), entre 2003 e 2010, foi a
ascensão de milhões de brasileiros das classes D e E para a C. O petista foi
reconhecido por isso e terminou o período aprovado por 83% da população,
segundo o Datafolha.
Dois fatores foram chaves para o sucesso à época.
O primeiro é que a economia mundial passava pela fase de maior crescimento
sincronizado desde a Segunda Guerra, e a China avançava entre 10% e 12% ao ano
—o que levou a um boom nos preços de commodities agrícolas e minerais que o
Brasil exporta.
Em segundo lugar, Lula herdou superávits
primários (para abater a dívida pública) do governo Fernando Henrique Cardoso e
conservou as contas em ordem. Sem risco de insolvência, inflação e juros
mantiveram-se relativamente baixos, encorajando o setor privado a investir e a
criar empregos.
Dados da FGV Social sobre aquele período
mostram que foi o trabalho o que mais contribuiu para o incremento da renda da
população. Mesmo entre os 10% mais pobres, só 30% do aumento nos rendimentos se
deu por influência do Bolsa Família —criado e reforçado nos dois governos de
Lula.
Agora, em seu terceiro mandato, o petista
não poderá contar, ao menos no curto prazo, com a economia mundial em forte
expansão.
Ao contrário, Estados
Unidos e União Europeia têm elevado juros para conter a inflação, e
o crescimento chinês neste ano será pouco superior a 5%, tendendo à
desaceleração em 2024, segundo o Fundo Monetário Internacional.
Sem tanto impulso externo desta vez, Lula
terá de se contentar, portanto, mais com a força da economia brasileira para
cumprir promessas voltadas aos mais pobres.
De saída, a partir da chamada PEC da
Transição, aprovada no
ano passado e que liberou R$ 145 bilhões fora do teto de gastos, o
petista reforçou vários programas.
Hoje, só o Bolsa Família, o Benefício de
Prestação Continuada (para idosos e pessoas com deficiência pobres) e o abono
salarial representam 11,8% da despesa total do governo federal (ou 2,16% do
PIB). Trata-se de um aumento de 76% em relação ao pico desses gastos nos
governos Lula 1 e 2, que ocorreu em agosto de 2010.
Essas ações, porém, são quase paliativas e
dependem de o governo ter ou não orçamento para bancá-las —o que parece incerto
nos próximos anos. O fundamental seria que, como nos anos 2000, o aumento da
renda dos mais pobres ocorresse pela via do trabalho.
Para isso, é o próprio governo que precisa
prover as condições, ajustando o quanto antes as contas públicas para que o
setor privado volte a confiar no país e a investir.
Educação e diversidade
Folha de S. Paulo
Devem-se retomar ações contra preconceito
nas escolas, desprezadas sob Bolsonaro
O racismo no sistema de ensino brasileiro
está em números. Segundo dados da Pnad Contínua de 2022, realizada pelo IBGE,
3,3% das pessoas brancas com mais de 15 anos de idade são analfabetas; entre
negras e pardas, o índice sobe para 8,2%. Se 61% dos brancos com menos de 25
anos se formaram no ensino médio, menos da metade (47%) dos negros e pardos
concluíram essa etapa do aprendizado.
A desigualdade econômica ajuda a explicar
os dados. Muitos jovens negros e pardos precisam largar a escola para trabalhar
e complementar a renda da família. Mas o racismo também é um fator que
contribui para o baixo desempenho e a evasão escolar.
Especialistas apontam que o estresse
psicológico causado por agressões e ofensas no ambiente escolar perturba a
aprendizagem, gera notas baixas, desinteresse e, por fim, o abandono dos
estudos.
Por isso, ações de combate ao racismo —e
outras formas de preconceito, como homofobia e machismo— nas escolas ajudam a
melhorar a qualidade do ensino e a formar uma sociedade refratária à
discriminação. Há anos escolas implementam programas com esse objetivo.
Contudo, houve retrocessos sob Jair Bolsonaro (PL).
Segundo levantamento da ONG Todos Pela
Educação, a partir de dados oficiais, havia uma tendência de alta: em 2011,
66,7% das escolas tinham projetos de combate ao racismo; em 2015, já eram 75,6%
—com leve queda em 2017 (72,5%). No entanto, já no primeiro ano do governo anterior, em 2019, o
índice caiu para 52,2% e, com a pandemia, chegou a 50,1% em 2021.
Em relação a ações de combate à homofobia e
ao machismo, verifica-se a mesma dinâmica, com 34,7% das escolas em 2011 e
43,7% em 2017. Porém, em 2019, o índice caiu para 30,5%, e mais ainda em 2021,
ao atingir apenas 25,5%.
Bolsonaro se elegeu e construiu seu governo
a partir da ideologização
de temas comportamentais. Entretanto, racismo, homofobia e
machismo são práticas culturais nefastas que produzem impacto em áreas diversas
como educação, economia e saúde.
Política pública não se faz com ideologia,
mas com técnica e razão.
É papel do governo basear-se em evidências para alocar recursos escassos nos setores que mais precisam. Espera-se que a nova gestão federal incentive programas de combate ao preconceito nas escolas, problema que afeta sobretudo estratos sociais mais vulneráveis.
Uma indústria ultrapassada
O Estado de S. Paulo
Acelerar dedução tributária de gastos com
equipamentos é um começo de modernização.
Ultrapassada é o termo que melhor define a
indústria brasileira, a partir do resultado de pesquisa da Confederação
Nacional da Indústria (CNI) que revelou, pela primeira vez, a idade média dos
equipamentos usados na produção. Quase um terço (28%) das companhias opera com
maquinário entre 10 e 15 anos. Em alguns segmentos específicos, como
biocombustíveis, a idade média das máquinas ultrapassa duas décadas. Numa
parcela ínfima (2%), dentre cerca de 2.000 pesquisadas, a atividade é
desenvolvida com equipamentos modernos, com até dois anos e meio de uso.
Numa época em que o mundo discute
inteligência artificial, internet das coisas e os avanços da robótica que
marcam o que se convencionou chamar de “indústria 4.0”, é preocupante comprovar
que parte considerável da produção nacional pode estar ainda presa ao século
20, como mostrou reportagem do Estadão. A quarta Revolução Industrial é uma
realidade e está mudando, por meio de tecnologia e inovação, os modelos de
negócios em todo o mundo. Pelos dados reunidos em junho pela CNI, o Brasil está
ficando perigosamente para trás.
A iniciativa de permitir a depreciação
acelerada na compra de equipamentos, medida anunciada recentemente pelo
governo, chega com certo atraso, mas é um bom sinal de avanço. Ao contrário de
ações midiáticas e setoriais recentes, embrulhadas como medidas de fomento,
essa é uma decisão que pode de fato servir de estímulo à produtividade
industrial brasileira. E que, diferentemente de “genialidades” encampadas pela
gestão Lula da Silva, como “carro popular” e barateamento de passagens aéreas,
não embute subsídios.
Anunciado pelo ministro da Fazenda,
Fernando Haddad, e pelo vice-presidente e ministro do Desenvolvimento,
Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, o mecanismo permitirá às
indústrias abater de impostos, com maior rapidez, gastos com a compra de máquinas
e equipamentos. A depreciação acelerada deve representar uma parcela
significativa de recursos no Orçamento público de 2024. Pelos cálculos de
Haddad, o pacote completo pode envolver até R$ 15 bilhões.
Para uma economia com taxas de crescimento
que mal passam do desprezível, o incentivo ao investimento em bens de capital
modernos – como é feito em diversos países – é um avanço. A depreciação é um
dispositivo já utilizado para dedução na base do Imposto de Renda e da
Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido, mas de forma parcelada, entre 5 e 20
anos, à medida que os bens de capital se depreciam. Acelerar o processo era uma
reivindicação antiga da indústria.
A velocidade com que novas tecnologias vêm
sendo desenvolvidas no mundo torna também frenético o ganho de produtividade
das empresas que conseguem acompanhar o ritmo da modernização. Ao mesmo tempo,
o prazo de obsolescência das máquinas é cada vez mais curto; e a competição num
mercado impactado pela tecnologia, mais acirrada. No relatório O Estado das
Organizações 2023, a consultoria McKinsey calcula, com base em pesquisa em sete
países, que o uso de inteligência artificial pelas empresas dobrou de 2019 a
2022.
A depreciação acelerada deve ser avaliada
pelo Congresso em agosto e terá prazo de duração e abrangência ainda definidos
pelo governo. Em razão do impacto fiscal, certamente serão discutidos meios
para compensar a arrecadação. Mas não é correto classificar como renúncia
fiscal a adoção de um instrumento cujo efeito é registrado no fluxo das receitas
ao longo do tempo. Tampouco se trata de subsídio. É o diferimento, no pagamento
de impostos, do investimento feito em atualização tecnológica.
O atraso tecnológico, obviamente, não é o
único fator a definir a ineficiência de uma indústria, mas é um obstáculo
evidente ao crescimento. Também não é apenas o tempo de desgaste dos
equipamentos que dita o ritmo dos investimentos industriais. O cálculo engloba
juros, que determinam o custo dos financiamentos, nível de demanda,
comportamento da economia e previsão de ganhos de produtividade, entre outros
fatores. Mas, sem dúvida, uma indústria bem equipada tem melhores condições de
competir.
A transformação da agropecuária
O Estado de S. Paulo
Avanço do setor em direção à produção com
certificação ambiental é prática vista como a nova revolução do agronegócio
nacional, mas lentidão burocrática surge como ameaça
A aproximação da agropecuária nacional com
a sustentabilidade ambiental se anuncia como a nova revolução do setor que mais
tem se destacado na economia brasileira. Uma transformação de práticas que
ocorre gradualmente e que ganhou no Plano Safra 2023/2024 um fator de incentivo
ao atrelar à inscrição no Cadastro Ambiental Rural (CAR) a obtenção de juros
mais baixos nos financiamentos. Cabe, porém, aos governos estaduais e à União
acelerar a validação do CAR para que essa possibilidade seja revertida em
benefício concreto.
Em entrevista ao Estadão, a gerente de
Clima e Emissões do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola
(Imaflora), Isabel Drigo, afirmou que as inovações do Plano Safra “tendem a
levar a sustentabilidade da produção agrícola brasileira de forma factível e
concreta”. Mas repetiu a preocupação que já havia sido manifestada pela
Confederação Nacional da Agricultura (CNA) quando o plano de financiamento
agrícola foi divulgado: a demora na validação do cadastro para os produtores
que já comprovaram que não têm passivos ambientais.
Alguns Estados já estão se movimentando. O
governo do Paraná anunciou recentemente o uso de inteligência artificial para
criar uma nova ferramenta de análise e adotar o que batizou de “CAR
Dinamizado”. Promete zerar a fila de análises até 2026. Em muitas regiões do
País, a espera pela validação se arrasta há anos.
O CAR é um registro público criado em 2012
e é obrigatório para todos os imóveis rurais. Faz a integração das informações
ambientais dessas áreas e compõe a base de dados para monitoramento ambiental e
combate ao desmatamento. Práticas como produção orgânica ou agroecológica
também foram premiadas como juros mais baixos, assim como o rastreamento do
rebanho bovino e o uso de energia renovável em granjas.
A lentidão na atualização dos registros do
CAR é mais um entrave para um setor que cresce a um ritmo bem acima das demais
atividades produtivas – uma aceleração que a burocracia brasileira não tem
conseguido acompanhar.
O agronegócio tem pautado os bons
desempenhos da balança comercial e contribuído para o controle da inflação. No
ano passado, participou com 25% do resultado do Produto Interno Bruto (PIB) e
neste ano caminha para resultado semelhante. O País não pode se dar ao luxo de
emperrar seu principal motor por falta de planejamento burocrático.
O foco do Plano Safra em boas práticas
agrícolas tende a elevar a competitividade da produção brasileira no mercado
internacional, desde que o governo consiga entregar aquilo que está propondo.
No programa foram mantidas as taxas de financiamento do ano passado e
instituídos descontos nos juros para os produtores que cumprirem as exigências
ambientais. O trabalho conjunto dos Ministérios da Fazenda, Desenvolvimento
Agrário, Agricultura e Meio Ambiente ficou devendo, contudo, uma solução para a
questão da morosidade burocrática.
Para que o esforço em direção à produção
ambientalmente sustentável tenha mais sucesso do que iniciativas anteriores, é
preciso azeitar os procedimentos. O plano de Agricultura de Baixo Carbono
(ABC), lançado em 2011, também criava benefícios diferenciados para produtores
que reduzissem emissões de gases causadores do efeito estufa. Mas isso resultou
em uma média em torno de 2% dos recursos do Plano Safra. A mentalidade, de uma
forma geral, tem mudado nos últimos anos. Até porque os negócios passam por
mudanças mais profundas no mundo inteiro.
De acordo com dados da Companhia Nacional
de Abastecimento (Conab), o Brasil vai colher 317,6 milhões de toneladas de
grãos na safra deste ano, ultrapassando o recorde de 2022. Não há silos e
armazéns para estocar toda a produção. A colheita da segunda safra de milho
ainda nem terminou e já disputa espaço com a sobra da produção de soja. Em
muitos pontos, grãos começam a ser estocados a céu aberto. Um problema crônico,
acentuado por questões burocráticas na liberação de financiamento e no
referendo ambiental.
O inferno mais frequente
O Estado de S. Paulo
Ondas de calor, como as da Grécia e dos
EUA, vão se repetir em intervalos cada vez menores
Os incêndios provocados por ondas de calor
na Grécia, nos Estados Unidos, na China e no México nas últimas semanas nada
têm de raros nem de esporádicos. A excepcionalidade de tais fenômenos é
ignorada apenas por negacionistas fanáticos da mudança climática. Recente
estudo elaborado por oito cientistas do London Imperial College, porém, agrega
uma constatação mais grave: essas ondas infernais, com mortalidade cada vez
mais alta, tendem a se repetir em intervalos cada vez menores (entre dois anos
e meio e cinco anos) nos verões do Hemisfério Norte.
O estudo, intitulado O calor extremo na
América do Norte, Europa e China em julho de 2023 tornou-se muito
mais provável pela mudança climática,
baseia-se no princípio de que o aumento de 2° Celsius na temperatura média do
planeta, em relação ao nível pré-industrial, é inevitável e se dará bem antes
do fim deste século. O calor deste ano no sul da Europa já supera em 2,5°
Celsius os anteriores. Na América do Norte, os termômetros marcam temperaturas
2°C mais altas e na China, 1°C acima.
O cenário deve se tornar gradualmente mais
devastador para a vida. Os pesquisadores alertam especialmente para o fato de
os efeitos das altas temperaturas e dos incêndios selvagens à saúde humana não
terem sido mapeados totalmente ainda hoje. Sublinham que os governos terão de
elaborar planos de ação para lidar com um contexto mais adverso à
sobrevivência. Os atuais investimentos em casas mais bem refrigeradas e em
postos urbanos para se refrescar são tímidos diante do que será necessário.
O estudo deixa claro que nada disso
ocorreria se não fosse a escalada exorbitante de emissões de gases do efeito
estufa nos últimos dois séculos, alavancadas pela incontestável ação humana.
Igualmente acentua que bloquear o quanto antes essas emissões é a única forma
de evitar que tais fenômenos se tornem cada vez mais frequentes e dramáticos.
A ciência enfatiza estar cada vez mais
próximo o ponto de inflexão, ou seja, o momento em que a diminuição e até a
eliminação das emissões dos gases já não trarão os efeitos positivos esperados.
A luz amarela está se avermelhando. No caso das correntes marítimas do
Atlântico, tão afetadas quanto a atmosfera pelas emissões de gases do efeito
estufa e tão importantes para o equilíbrio climático do planeta, o ponto de
inflexão deve ocorrer antes da virada do próximo século, segundo o estudo
Alerta sobre um colapso próximo da circulação do Atlântico Sul, publicado no
último
dia 25 pela Nature Communications. Seus
autores, os cientistas e irmãos dinamarqueses Susanne e Peter Ditlevsen, da
Universidade de Copenhague, preveem que esse colapso acontecerá entre 2025 –
algo como “depois de amanhã” – e 2095.
A última vez que as correntes atlânticas estagnaram foi há 12.800 anos, com consequências ambientais devastadoras. Não há razão para imaginar efeitos diferentes desta vez. Tampouco para não investir no corte brusco das emissões. O Acordo de Paris, que fixou as obrigações voluntárias de cada país, já não se mostra suficiente. É preciso maior ambição.
O apelo da igreja católica aos jovens
Correio Braziliense
"Em relação à juventude, não resta
dúvida de que o catolicismo tem um desafio, pois vem perdendo fiéis por todo o
planeta"
A igreja católica tem grandes desafios pela
frente, o mais importante deles, convencer os jovens de que as estruturas
fincadas em Roma, sob o comando do Papa Francisco, estão dispostas a encarar o
mundo novo, com toda a sua diversidade e demandas. Em relação à juventude, não
resta dúvida de que o catolicismo tem um desafio, pois vem perdendo fiéis por
todo o planeta. Um dos papas mais reformistas da Igreja nos últimos 60 anos,
Francisco quer um posicionamento que se encaixe ao que meninos e meninas veem
como filosofia de vida.
Apesar do esforço do Papa Francisco para
falar com os mais jovens e em defesa dos mais pobres, o discurso carece de
aderência à realidade da população. Isso é visível, sobretudo, nas periferias
das grandes cidades, onde observa-se um aumento no número de pessoas que se
dizem sem religião e dos que têm optado por seguir outras denominações cristãs.
Não é de agora que a igreja católica vem
perdendo fiéis. Em 1994, 75% dos brasileiros se diziam seguidores dos preceitos
de Cristo definidos por Roma. Em 2010, eram 63% e, ao que tudo indica, pelo
Censo de 2022, esse índice caiu para menos de 50% da população. É que a Igreja
enfrenta dificuldades para ocupar espaço nas novas fronteiras abertas no país.
Na Região Norte, na qual está encravada a Amazônia, o catolicismo encolhe mais
rapidamente. Por isso, em 2019, surgiu a proposta de se ordenar homens casados
como padres, mas o tema não avançou.
Se ainda quiser recuperar o espaço perdido,
a Igreja católica terá de avançar na quebra de paradigmas, dando mais espaço
para mulheres e negros, indo aonde a população mais carente está, retomando os
reais preceitos de Cristo, como a caridade e a fraternidade. A despeito dos
posicionamentos firmes do Papa Francisco nesse sentido, o empenho do corpo
clerical tem sido insuficiente. É preciso que os cidadãos se sintam realmente
abraçados pelos representantes da Santa Sé.
A Jornada Mundial da Juventude que ocorrerá
em Portugal entre os dias 1º e 6 de agosto demonstra a forte divisão da
sociedade em relação ao que representa a Igreja católica. O entusiasmo de
jovens de todo o planeta que encontrarão o papa Francisco contrasta com as
críticas aos vultosos gastos feitos pelos governos locais para o evento.
Alega-se que esse dinheiro poderia custear melhores condições de vida aos mais
pobres.
Espera-se que a Jornada, da qual devem
participar cerca de 1,5 milhão de peregrinos, seja um passo importante para a
Igreja católica externar seus ensinamentos nos tempos atuais . Em vídeo
divulgado há poucos dias, o Papa Francisco conclamou os jovens a agirem em nome
do Evangelho, em um mundo atormentado por uma guerra e sob grave ameaça
climática.
Ao comentar o tema da Jornada Mundial,
"Maria levantou-se e partiu apressadamente", o pontífice lembrou que
a fé católica exige, além de devoção espiritual, uma atitude concreta.
"Maria, quando sabe que vai ser a mãe de Deus, não fica parada a tirar uma
selfie ou a pensar no que vai fazer". Pelo contrário, "a primeira
coisa que faz é pôr-se a caminho, apressadamente, para servir, para ajudar.
Também vocês têm de aprender a colocar-se a caminho para ajudar os
demais", exortou.
Aos 86 anos, Francisco mantém-se na busca
de modernizar a Santa Sé e reparar os danos à imagem da instituição, abalada
por escândalos sexuais e um conservadorismo resistente em suas estruturas. Em
Lisboa, ele buscará estreitar os laços com uma geração que tem o poder da
mudança. "São João Paulo II dizia que se convives com os jovens, você se
torna jovem também. E a Igreja necessita dos jovens para não envelhecer",
defende a autoridade máxima do Vaticano.
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