Correio Braziliense
O ministro passa por um processo de
isolamento político e qualquer desgaste que sofra, como nesse caso da
"dama do tráfico", favorece os que desejam outro nome no Supremo
Quem tem um secretário de Assuntos
Legislativos como Elias Vaz não precisa de inimigos. Ex-vereador na Câmara de
Goiânia por quatro mandatos e ex-deputado federal, membro do alto escalão do
Ministério da Justiça, não poderia se comportar como aquele parlamentar que
posa para selfies nos salões e corredores do Congresso quando um suposto
eleitor ou correligionário pede. Mas foi o que fez no exercício do cargo, ao
receber Luciane Barbosa Farias, mulher de Tio Patinhas, chefe do Comando
Vermelho no Amazonas, que foi preso em 2022 e cumpre pena de 30 anos.
O encontro foi revelado pelos repórteres do Estadão André Shalders e Tácio Lorran e teve muita repercussão no Congresso. O deputado Amom Mandel (Cidadania-AM) chegou a apresentar uma notícia crime à Procuradoria-Geral da República (PGR), na qual solicita uma investigação sobre as reuniões no Ministério da Justiça com a participação da esposa do traficante e da ONG Instituto Liberdade do Amazonas, uma em março, com a Secretaria de Assuntos Legislativos, e outra em maio, com a Secretaria Nacional de Políticas Penais.
Fotos de Elias Vaz com a comitiva de Luciene,
da qual participara a ex-deputada Jacira Rocha, do PSol do Rio de Janeiro,
autora do requerimento de audiência, em nome da Associação Nacional da
Advocacia Criminal (Anacrim), criaram grande constrangimento para o ministro
Flávio Dino, inclusive por meio da divulgação de uma fake news na qual o
ministro teria estado com Luciene. Na verdade, a foto é da atriz e humorista
potiguar Vi Alvarez, que postou mensagem nas redes desmentindo a informação.
"A mentira de hoje, continuando a
canalhice de ontem (segunda-feira), é que essa senhora do vídeo abaixo é uma
criminosa com quem eu teria me reunido, o que é absolutamente falso, como
afirmo desde ontem. Esses bandidos inventam essas calúnias para aglutinar gente
da mesma espécie, a fim de praticar o mal. Vejam o desmentido da atriz e
humorista, que recebe a minha solidariedade pessoal", disse o ministro da
Justiça no X (ex-Twitter), muito irritado com essa história.
Na primeira reação, o Ministério da Justiça
subestimou a repercussão do caso. Alegou que as duas reuniões foram solicitadas
por escritórios de advocacia, não havendo como o sistema de inteligência da
pasta prever qual seria a comitiva. A resposta foi um atestado de
incompetência, pois sabe-se que o acesso aos palácios do Executivo, do
Congresso e do Supremo sempre exige prévia identificação, com a apresentação de
documentos. A maioria dos ministérios segue a norma.
Mui amigos
O secretário de Assuntos Legislativos do
ministério, Elias Vaz, assumiu a responsabilidade e reconheceu o erro, para
isentar Dino de qualquer responsabilidade, mas o estrago nas redes sociais já
estava feito. Seria até o caso de o secretário pedir demissão, mas não foi o
que aconteceu. O próprio Vaz minimizou o incidente, e o ministério estabeleceu
regras mais rígidas de acesso aos gabinetes, tais como fornecer nome e CPF dos
participantes das reuniões com 48 horas de antecedência, enviar solicitação de
audiência por e-mail e identificar, na recepção, qualquer visitante que não
tenha audiência previamente marcada, o que é muito comum acontecer com
acompanhantes de parlamentares.
Nada disso resolve o problema de fundo da
visita. É notório o envolvimento de ONGs e outras instituições com organizações
criminosas, a pretexto de defender os direitos humanos e a melhoria das
condições carcerárias, principalmente com o Primeiro Comando da Capital (PCC),
de São Paulo, e o Comando Vermelho (CV). Ocorre em muitas cidades do país e
envolve políticos e gestores públicos. Sabe-se que postos de gasolina,
associações sem fins lucrativos e ONGs são usados para lavagem de dinheiro. A
melhor resposta do Ministério da Justiça ao caso será puxar o fio dessa meada.
Nos bastidores do Ministério da Justiça,
assessores de Dino consideraram o episódio um erro de Vaz, que deveria ter mais
controle sobre a lista de participantes. Mas o estrago maior não tem a ver com
esse fato e, sim, com a disputa pela vaga da ministra aposentada do Supremo
Tribunal Federal Rosa Weber. Dino é um candidato fortíssimo, já foi o favorito,
porém enfrenta resistências em duas frentes: uma são seus colegas de Senado,
com os quais sequer teve convivência, pois foi eleito no ano passado e logo assumiu
a pasta da Justiça; a outra, o PT, que tem seus próprios interesses.
No primeiro caso, o candidato preferido dos
senadores é o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas,
com muito mais trânsito entre eles por ter sido consultor jurídico da Casa. A
rejeição ao nome de Igor Roberto Albuquerque Roque para o cargo de defensor
público da União, por 38 votos contra e 35 a favor, com uma abstenção, foi um
recado de que não querem Dino no STF.
O segundo, é o PT, que defende junto a Lula
indicação para o Supremo de um quadro historicamente ligado ao partido, no
caso, o atual advogado-geral da União, Jorge Messias. Funcionário de carreira
do órgão, foi procurador da Fazenda Nacional e assessor direto da então
presidente Dilma Rousseff.
Ou seja, Dino passa por um processo de
isolamento político, e qualquer desgaste que sofra, como nesse caso da
"dama do tráfico" do Amazonas, favorece os aliados de Lula que
desejam outro nome no Supremo. Era o favorito para a vaga de Rosa Weber, agora
está sendo queimado.
Um comentário:
Que pena,eu gosto dele.
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