Correio Braziliense
Vinte e cinco de março de 1824 um documento
basilar era entregue aos brasileiros, foi então, nesse dia, criado o Senado
Federal
Vinte e cinco de março de 1824 um documento basilar era entregue aos brasileiros. Sob a voz e a batuta de Dom Pedro I, que meses antes havia dissolvido a Assembleia Constituinte e Parlamentar e nomeado um Conselho de Estado composto por 10 membros para tal fim, a primeira Constituição de nosso país foi outorgada. Segundo o imperador, aquele texto, sim, estava à altura do Brasil e dele mesmo. Trazia a base do que até hoje compõe nosso Estado, acrescida, no entanto, do Poder Moderador. Foi então, nesse dia, criado o Senado Federal.
O primeiro Senado era composto por 50
membros, 23 barões viscondes ou marqueses, nove juízes, sete membros da Igreja
Católica, quatro do Exército. Além de dois médicos, um advogado e quatro
proprietários de terra. Os príncipes da Casa Imperial tinham direito a assento
no colegiado tão logo fizessem 25 anos, o que fez da princesa Isabel, a
primeira mulher a ocupar um posto na Casa. Os mandatos eram vitalícios, e a
escolha era feita pelo imperador a partir de uma lista tríplice. Já nesse
período histórico, o Senado teve atuação bastante destacada, uma vez que a
estabilidade dos mandatos dava a esses parlamentares liberdade ímpar para
discursar, debater e, inclusive, se opor ao imperador, como bem retratou
Machado de Assis, jornalista à época, em crônica publicada em seu livro O
Velho Senado.
Em outros momentos, bastante mais recentes, a
Câmara Alta do parlamento também foi palco de movimentos históricos. Na eleição
de 1974, o MDB impôs uma fragorosa derrota à ditadura e ao seu partido de
sustentação, a Arena, elegendo 16 das 22 cadeiras em disputa. Nomes como
Saturnino Braga (RJ), Paulo Brossard (RS), Itamar Franco (MG), Mauro Benevides
(CE) e Orestes Quércia (SP) despontaram no cenário político a partir daquele
momento. A reação veio “a galope”, também tendo por alvo o Senado Federal, com a
criação dos senadores biônicos, eleitos de forma indireta e que garantiriam uma
sobrevida ao regime por mais alguns anos.
A Lei do Divórcio, sancionada no fim de
dezembro de 1977, também foi obra dos parlamentares do “tapete azul”. Até
então, a única forma de dissolução do casamento era o desquite, que não
permitia novas uniões, tornando o vínculo já falido entre o ex-casal
indissolúvel, e os filhos dos futuros relacionamentos ilegítimos. Foram a
coragem e a insistência do senador Nelson Carneiro, que desde 1951 lutava pela
causa, definidoras dessa mudança essencial, especialmente para as mulheres
brasileiras.
Já nessa quadra de nossa história, o Senado
Federal se mantém fiel às características que tão bem o identificam. É uma casa
de respeito e serenidade, onde as discussões costumam ter tempo de amadurecer
para produzir o melhor resultado para a população. Talvez já não composta
apenas por “cabeças brancas”, os senadores costumam buscar o equilíbrio e atuam
de forma respeitosa. Isso não significa, de jeito nenhum, abster-se das
discussões importantes e, por vezes, até incômodas, como o tema da
criminalização da posse e do porte de drogas, a inteligência artificial e a
reforma tributária, buscando, em todos os casos, resguardar as prerrogativas do
Poder Legislativo. A voz firme de seu presidente, senador mineiro Rodrigo
Pacheco, foi fundamental para garantir a estabilidade necessária para a
realização das últimas eleições e o respeito a seu resultado.
Nomes marcantes de todos os tempos já fizeram
parte do Senado. De Rui Barbosa a José Sarney, passando por Darcy Ribeiro,
Jarbas Passarinho, Pedro Simon, Pinheiro Machado, Abdias Nascimento, Fernando
Henrique Cardoso e Benedita da Silva, entre tantos e tantas que dedicaram seus
mandatos a entender a linguagem da democracia e exercitar com suas palavras e
seus atos os desejos dos brasileiros e das brasileiras. São 200 anos de
história, dois séculos de uma busca contínua de andar de mãos dadas com a
cidadania.
*Ilana Trombka, diretora-geral do Senado
Federal e doutora em administração de empresas Eaesp-FGV.
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