Folha de S. Paulo
Ameaças de ruptura e questionamentos sem
lastro às instituições se acumularam em sua gestão
Assim como em praticamente toda a sua
carreira iniciada na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, no final dos anos
80, Jair
Bolsonaro (PL) acumulou em seus
quatro anos na Presidência da República uma série de atos e manifestações
públicas que colocaram no horizonte a possibilidade ou o desejo de uma ruptura
institucional.
Descortina-se agora com a delação premiada de
seu ajudante de ordens, Mauro Cid,
e com os depoimentos de
dois de seus comandantes militares, Marco Antônio
Freire Gomes (Exército) e Carlos
Baptista Júnior (Aeronáutica), a possível tentativa de um golpe
de Estado no final de 2022 que lhe permitisse ficar no poder e impedir a posse
de Lula (PT).
Tais depoimentos e colaborações, porém,
apenas cristalizam algo que ao menos desde 2020 vinha sendo manifestado às
claras.
É verdade que desde a campanha de 2018
Bolsonaro já dava declarações de teor antidemocrático, como o questionamento
das urnas eletrônicas sem nenhum lastro de suspeita.
O fato, porém, é que a área em frente ao QG (Quartel General do Exército) em Brasília abrigou uma das primeiras manifestações explícitas do ex-presidente, no poder, no sentido de uma ameaça de ruptura.
Era 19 abril de 2020, domingo de sol, começo
do período de pandemia da Covid-19 e do isolamento social que foi combatido e
sabotado pelo presidente e seus aliados de forma metódica.
Bolsonaro trepou na carroceria de uma picape
para discursar e cumprimentar apoiadores que, entre outras coisas, pregavam
contra o isolamento, contra o Supremo Tribunal Federal e o Congresso, e pediam
na porta da sede nacional do Exército a chamada "intervenção militar".
"Acabou a época da patifaria",
"agora é o povo no poder" e "não queremos negociar nada"
foram algumas das frases ditas pelo presidente, em claro tom de desafio.
Dois domingos depois, em nova
manifestação golpista estimulada por ele, deu novos recados
intimidatórios.
"Peço a Deus que não tenhamos problemas
essa semana. Chegamos no limite, não tem mais conversa. Daqui pra frente, não
só exigiremos, faremos cumprir a Constituição, ela será cumprida a qualquer
preço, e ela tem dupla mão", afirmou Bolsonaro, que na véspera havia se
encontrado com os chefes de
Exército, Marinha e Aeronáutica.
Essa postura de enfrentamento, amparada
sempre no possível apoio militar que afirmava ter, manteve-se em todo o
período, culminando nas grandiosas manifestações golpistas de bolsonaristas e
de Bolsonaro no 7 de Setembro de 2021.
Naquele dia, aconselhou do alto de carros de
som em Brasília que o então presidente do STF, Luiz Fux,
enquadrasse seus pares ou a corte poderia "sofrer aquilo que não
queremos". Em São Paulo, chamou Alexandre de
Moraes de Canalha e o exortou a deixar o STF, entre outras
imprecações.
O título da reportagem da Folha naquele
dia resumiu os dois atos: "Bolsonaro
ameaça o STF de golpe, exorta a desobediência à Justiça e diz que só sai morto".
Com a aproximação das eleições de
2022, uma série de
novos atos e manifestações públicas se acumularam, em alinhamento ao
que, nos atuais depoimentos, Cid, Freire Gomes e Baptista Jr. apontam: a
tentativa de angariar apoio popular e nas Forças Armadas para aplicar um golpe
de Estado.
Em julho de 2021, disse a apoiadores no
Alvorada que "ou fazemos
eleições limpas no Brasil ou não temos eleições". Na mesma
época, fez o maior
ataque às urnas eletrônicas em uma live nas redes sociais em
que apresentou o que chamou de provas de fraude no sistema de votação. Em suma,
apenas teorias que circulavam havia anos na internet, todas já desmentidas
anteriormente.
Em meados de 2022, já nos meses que
antecederam às eleições, voltou a repetir as mesmas mentiras, dessa vez
em fala
presencial a embaixadores estrangeiros convocados ao Palácio da Alvorada.
Esse ato levou Bolsonaro a ser tornado
inelegível pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em junho de 2023.
O ano eleitoral de 2022 também foi marcado
pela inusual participação das Forças Armadas em uma "fiscalização"
das eleições, por pressão do então presidente.
Apesar de não ter
encontrado nenhum indício de irregularidades no pleito, o Ministério
da Defesa, comandado pelo general Paulo Sérgio Nogueira, enviou ao TSE após a
vitória de Lula relatório em que afirmava não descartar a possibilidade de
fraudes no pleito.
Nogueira comandou
reunião em que, após as eleições, apresentou aos chefes das Forças Armadas uma
versão da chamada "minuta do golpe", de acordo com os
depoimentos de Freire Gomes e Baptista Jr.
Apesar da derrota para Lula no segundo turno,
Bolsonaro jamais reconheceu publicamente o resultado.
Na primeira conversa com apoiadores após a
derrota, em dezembro de 2022, chegou a afirmar que quem decidiria o futuro dele
e para onde iriam as Forças Armadas eram eles.
Naquele momento, milhares de bolsonaristas
promoviam acampamentos abertamente golpistas em frente a QGs do Exército, o que
culminou com depredações na capital federal, tentativa de explosão de um
caminhão tanque nos arredores do aeroporto e o ataques à sede dos Três Poderes,
em 8 de janeiro de 2023.
Bolsonaro jamais condenou ou desestimulou
abertamente esses acampamentos, pelo contrário, em algumas ocasiões elogiou e
incentivou a mobilização.
Apontado nas investigações como um dos
instigadores da possibilidade de golpe, o ex-ministro da Defesa e vice na chapa
de Bolsonaro, o general da reserva Walter Braga Netto, chegou a
dizer a apoiadores que defendiam a permanência de Bolsonaro para não perderem a
fé.
"Vocês, não percam a fé. É só o que eu
posso falar agora", disse em novembro de 2022.
O ex-presidente e seus aliados negam que
tenham participado de articulações na tentativa de aplicar um golpe de Estado.
Um comentário:
É bem isto! O miliciano mentiroso Jair Bolsonaro deve ser JULGADO por seus vários crimes!
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