Para presidente da federação, varejo e
indústria fazem propaganda gratuita da Shein
O presidente da Fiesp (Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo), Josué Gomes da Silva, disse nesta terça
(30) que faltou um José Alencar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na
discussão sobre o patamar dos juros básicos,
definido a cada dois meses pelo Banco Central.
Na véspera da reunião do Copom (Comitê
de Política Monetária) do BC, Josué afirmou considerar que seu pai, vice de
Lula nos dois primeiros mandatos, era alguém que "falava com legitimidade
sobre o assunto e ele [Lula] não precisava falar" e que, na falta de uma
figura para ocupar esse papel, coube ao presidente colocar o tema em discussão.
Para o presidente da Fiesp, Lula politizou de
maneira equivocada as decisões do Copom.
O atual vice-presidente Geraldo Alckmin
(PSD), ministro do Desenvolvimento, Indústria,
Comércio e Serviços, também criticou publicamente o patamar dos juros básicos.
Desde o ano passado, porém, coube principalmente a Lula esse papel, que voltava a mira ao presidente do BC, Roberto Campos Neto. Após um período de trégua, diante das reações negativas do mercado, Lula retomou, nos últimos dias, as críticas a Campos Neto.
Na avaliação de Josué Gomes, o presidente do
BC teria dado margem à politização dos debates sobre o Copom quando optou por
um posicionamento claramente político –no período eleitoral, ao votar com a
camiseta do Brasil, associada à época ao eleitorado bolsonarista, ou ser homenageado
na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo).
"Se acabarem com a independência do
Banco Central, o mérito terá sido todo do Roberto Campos Neto. E não acho que
vão acabar, não, espero que não acabe."
Josué Gomes recebeu, nesta terça, jornalistas
para um café da manhã na sede da Fiesp, na avenida Paulista, em São Paulo.
Por mais de uma vez, disse que não pretendia
"fulanizar" as discussões sobre os juros ou sobre o Copom ou mesmo
direcionar críticas a Campos Neto, por entender que o problema é tanto
estrutural quanto circunstancial.
Para ele, o Brasil absorveu uma ideia segundo
a qual o Copom "é um conjunto de pessoas iluminadas, com modelos
matemáticos altamente sofisticados e que, portanto, não erram".
"O Brasil precisa entender que,
praticando taxas de juros reais, por tanto tempo, cria-se uma situação de
desvantagem competitiva em relação a outros países do mundo. É simples, é
matemático. A economia não cresce, a taxa de juros reais é de 6% nos últimos 25
anos. O mundo, durante 15 desses 25 anos, praticou taxas de juros reais
negativas."
'Haddad está tentando entregar, talvez não da
melhor forma'
Para o presidente da Fiesp, as tentativas do
ministro Fernando Haddad, da Fazenda, de entregar o equilíbrio fiscal talvez
não tenham sido as melhores, pois, "ao invés de melhorarem o ambiente
econômico, deterioram o ambiente, deterioram a confiança dos setores
empresariais e diminuem ainda mais a atividade".
Esse efeito, avaliou Josué, é
"diametralmente oposto ao desejo" de aumentar a arrecadação para
cumprir as metas fiscais. O dirigente da entidade da indústria destacou, porém,
que vê Haddad como "uma pessoa muito responsável, que quer entregar".
O industrial considera que o governo ainda está gastando muito e ampliando
despesas.
‘Varejo e indústria fazem propaganda gratuita
da Shein’
O presidente da Fiesp também disse nesta
terça considerar que há exagero nas reações de varejistas e industriais aos
marketplaces asiáticos, especialmente à Shein. "Acho admirável o esforço
do varejo e da indústria brasileira de promoverem a marca dessa empresa
chinesa."
Na avaliação dele, a tributação aos produtos
importados comprados por meio dessas plataformas foi tratada como uma solução
paras os setores nacionais, mas não é.
"O cross border representa hoje R$ 15
bilhões. No setor com maior penetração, ele é 5% do total. Quem dera com 5% do
setor, se proibíssemos algo, resolvêssemos o problema da indústria
nacional", afirmou.
Para ele, a importação feita por viajantes
–que podem trazer até US$ 1.500 em compras isentas, US$ 500 dos quais no
dutyfree– e o drawback (regime especial de tributação com o Paraguai) têm
efeito mais danosos à economia do que as compras feitas por meio das
plataformas.
Ele defendeu, porém, que haja isonomia
tributária, ou seja, que essas compras passem a ter impostos como têm os
produtos locais. "Sempre encarei essas plataformas como potenciais
clientes. Eles são extremamente competitivos e eficientes e é mais uma forma de
comércio."
Josué também disse que as indústrias precisam
aderir à digitalização. "É uma realidade inescapável. Quem não entender
isso vai dicar para trás."
'Vantagens tributárias que perderam o sentido
têm de ser revistas'
O presidente da Fiesp disse, durante o café
nesta terça, que era necessário fazer "mea culpa" e admitir que
muitos setores demandam vantagens tributárias que, se perderam sentidos,
precisam ser revistas.
Josué Gomes criticou as alíquotas reduzidas
previstas na reforma tributária e disse considerar que a melhor política para
melhorar o acesso a alimentos seria o cashback -e não a isenção à cesta básica,
que estende a todos as vantagens do tributo zerado.
O dirigente da entidade paulista também disse
ter "muito medo do imposto seletivo", que cria alíquotas maiores a
produtos potencialmente prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. Na avaliação
do industrial, seria melhor que o dispositivo não existisse, pois ele já nasce
com distorções.
‘Indústria tem prédio bonito, mas nunca teve
força’
À frente da maior federação industrial do
país, Josué Gomes disse que o setor nunca teve força política, nem mesmo no
passado. "Tem prédio bonito, acho até um desperdício, mas força política
não tem."
Uma das dificuldades, na avaliação dele, é a
diversidade de necessidade dentro do segmento, com cadeias longas e complexas e
diferentes dinâmicas de relações entre clientes e fornecedores.
Josué citou como exemplo o pleito dos setores
de aço e de resinas, diante de um aumento das importações de matéria-prima
vinda da Ásia, especialmente da China, por uma taxação maior a esses produtos,
seguindo o que também fizeram Estados Unidos e Europa.
Esse aumento, na avaliação dele, impacta
outros segmentos da indústria que têm o aço e resinas como maérias primas
importantes. O consenso, segundo o dirigente, está na necessidade de taxas de
juros e carga tributária menores.
‘Coteminas vai pagar todos os credores’
Josué também falou brevemente sobre a
recuperação judicial do grupo Coteminas, que ele preside. Na semana passada, a
Justiça de Minas Gerais confirmou a RJ e agora a companhia terá prazo para
apresentar um plano de pagamento aos credores. As dívidas são de R$ 2 bilhões.
"Temos certeza que vamos sair disso com
quitação com todos os credores", disse. Ele afirmou que a decisão de pedir
a RJ foi tomada pela necessidade de proteção contra um credor. Segundo o pedido
encaminhado à Justiça, um fundo tentou antecipar o vencimento de debêntures.
O presidente do grupo Coteminas afirmou também que a situação da companhia se reflete nas altas taxas de juros no país. "Com juros na ordem de 13,75%, spread na ordem de 6%, 7%, não tem nenhuma atividade econômica que paga."
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