Aparentemente, ninguém detectou ainda, com
precisão, a dimensão dos efeitos desse envenamento vagaroso da população pelos
incêndios florestais. As atuais "queimadas controladas" -
concepção acadêmica - continuam a destruir tudo desde 14 de agosto de 1963,
quando se tomou conhecimento amplo do fenômeno que, nos trópicos, se repete nos
meses de julho, agosto e setembro.
Naquele agosto de 1963, um incêndio
incontrolável emergiu subitamente destruindo cerca 20 mil hectares
de florestas plantadas, e 500 mil de florestas nativas e matas secundárias.,
devastando os municípios de Guaravera, Paiquerê e Tamarana, no Paraná,
desabrigando centenas de famílias e provocando a morte de 110
pessoas.
Depois estendeu-se para Ortigueira, Tibagi, Arapoti, Jaguariaíva até Sengés. Cerca de 15 milhões de araucárias de reservas florestais plantadas pelas indústrias Klabin, produtoras de papel e celulose para exportação, foram totalmente destruídas, embora a empresa tivesse um sofisticado projeto de proteção de suas áreas de florestas.
Mesmo com os diversos programas de governos,
sobretudo federais, conduzidos por cientistas e especialistas bio-climaticos, a
perda da cobertura arbórea no Brasil, devido a incêndios nos trópicos, subiu,
em média, 41, 5 mil ha (9%) ao ano. Seria acusada de responsável por cerca de
15% do aumento das áreas desmatadas no planeta.
Queimadas devastadoras surgem periodicamente
também no, no Chile, EUA (Califórnia), Portugal, Espanha, França, Grécia, Austrália
e alguns países do sul da Ásia. Esses incêndios são vistos, entretanto, com
complacência, lamentando-se, frequentemente, as perdas humanas e
materiais. Da África sabe-se pouco.
Nos trópicos, nos meses de inverno (julho a
setembro), registram-se anualmente fortes estiagens, com taxas de umidade baixas,
e vegetação ressequida. Surpreende mesmo são as queimadas chegando ao Pantanal,
onde são extensas as terras úmidas. Constata-se que o uso do fogo para limpar
os terrenos agrícolas, mesmo controlado, não resiste aos ventos constantes e se
reproduz pela vegetação. O máximo que se consegue, com aplicação de tecnologias
modernas, é contê-lo pontualmente. Aceso, vai se multiplicando, até alcançar
proporções incontroláveis.
Apagar mesmo o fogo sobre a vegetação
natural, no inverno tropical, só com as chuvas que, em geral, vem no final de
setembro, com a chegada da primavera, conforme demonstra a sabedoria indígena ancestral.
Os estudiosos das queimadas tratam a experiência dos povos originários,
entretanto, como uma maneira ingênua de praticar o manejo dos recursos da floresta.
Na ausência do saber ancestral, torna cômodo encontrar
“bodes espiatorios” pessoas para serem acusadas levianamente de responsáveis
pela queimada seja para renovação da terra produtiva ou para a expansão da
pecuária. Nas denúncias veiculam-se até estatísticas, como faz o secretário,
Wolnei Wolf, Coordenador de Prevenção e Programas Estratégicos da Defesa Civil
do Governo Federal. Supostas autoridades em desmatamento e
queimadas chegam a afirmar que "tem certeza de que 99,9% das queimadas são
causados pela ação humana".
Embora a maioria dos percentuais citados não
sejam tão confiáveis, é provável, sim, que boa parte das queimadas surja mesmo para
limpeza dos terrenos agrícolas ou para renovação das pastagens. Há gente que
seria paga para fazer o fogo abortar. Os políticos gostam desse argumento para
culpar opositores, embora a expansão das queimadas tenha um pé nos
financiamentos públicos do BNDES, do Banco do Brasil, e dos bancos privados,
como incentivo a expansão da produção agropecuária na balança comercial,
políticas mantidas pelos próprios governos de plantão.
Pesquisadores menos comprometidos com a
produção agrícola admitem, com reserva, a hipótese mais centrada em observações
empíricas, supostamente científicas, de que a secura do ar e da vegetação
favorece a combustão vegetal na medida em que o sol incide diretamente
sobre os cristais expostos na superfície do solo, especialmente no do
cerrado.
Neste cenário de leviandades e de efetivo
desconhecimento científico sobre a origem das queimadas, surgiu, de repente, um
personagem novo, o PCC- Primeiro Comando da Capital, organização criminosa do
Brasil, criada no submundo de São Paulo, e que se espalhou por todo
o território brasileiro, alcançando até países próximos, como o Paraguai, a
Bolívia, a Colômbia e a Venezuela. Possuiria 30 mil membros, sendo 8 mil
apenas em São Paulo. Com ele, emergiu uma narrativa dando conta de que filiados
da organização, financiados por produtores rurais, foram presos como incendiários.
Seria um deboche ou um desafio ao jornalismo investigativo?
Os políticos, desconhecedores efetivos das
razões das queimadas, não perdem a oportunidade para fazer delas uso retórico,
sobretudo em tempos eleitorais. Para desviar a atenção da população instituíram
até o "Dia do Fogo", como se com ele estaria resolvida a questão das
queimadas. Em 2023 foi criado um tal de Cemaden - Centro Nacional
de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, para monitorar e emitir
alertas sobre esses tipos de fatalidades, como se o IBAMA, o INPE e INPA já não
fizesse isso há anos, sem encontrar, de fato, uma solução definitiva, nem
usando helicópteros, aviões tanques, bombeiros e agentes florestais e um
voluntariado.
Um dos dirigentes da Administração Nacional
da Aeronáutica e Espaço (Nasa), dos EUA, James Hansen, confirmava que havia
“99% de chance de que o aquecimento do clima na Terra vinha da poluição
produzida por atividades humanas, não apenas das queimadas da vegetação
natural, mas também da utilização massiva de combustíveis fósseis: petróleo,
carvão mineral, gás natural, urânio, xisto betuminoso base o modelo industrial que,
no fundo, trafega longe desses discursos ambientais.
Não faltam estatísticas, nem institutos de
pesquisas para carimbar às informações sobre as queimadas no Brasil. O
tal de Cemade informou que, no mês de agosto, o número de incêndios florestais
no País elevou-se de 110 para 3.300. Desde o início deste ano, o INPE sozinho
teria detectado 50 mil focos desses incêndios por aqui. Pelo que vê, na chegada
da primavera, o brasileiro vai estar desfrutando de uma visão laranja do sol,
chuvas ácidas e ares poluídos. Ninguém tem a solução.
* Jornalista e professor.
** Queimada é provocada, incêndio florestal é espontâneo
3 comentários:
Será?
"Queimada é provocada, incêndio florestal é espontâneo". É fogo ver tanta IGNORÂNCIA num texto que se pretende científico! Critica os achismos alheios e enche um texto com os próprios... Lamentável.
Incêndio florestal é floresta (ou mata) pegando fogo! Pode ser iniciado naturalmente (raios) ou antropicamente, e aí intencionalmente (e criminoso) ou por descuido. Não é incêndio de campos (pouquíssimos naturais, quase todos antrópicos), de vegetação savânica do cerrado (alguns naturais, maioria antrópicos atualmente), de canaviais (quase todos antrópicos, tanto intencionais quanto por descuido), etc.
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