O Globo
Na prática, as eleições brasileiras estão se
transformando em não obrigatórias, diante da ausência de uma sanção
significativa contra a abstenção
A abstenção ganhou dimensão nova nas eleições
municipais deste ano, especialmente no segundo turno, quando a possibilidade,
ainda que remota, de que ela seja responsável por uma reviravolta na eleição
paulistana passou a fazer parte da estratégia final dos competidores. O
prefeito Ricardo Nunes, à frente nas pesquisas desde o início, demonstrou na
última semana preocupação evidente com a possibilidade de que os eleitores do
coach Pablo Marçal não se disponham a ir votar nele domingo, abrindo brecha à
redução de seu favoritismo. Noutros municípios, como Porto Alegre, a abstenção
também tem sido alta.
Guilherme Boulos, do PSOL, descrente pela
tentativa frustrada de atrair votos dos marçalistas, começou a jogar a favor da
abstenção, afirmando que eleitores de Marçal não votarão em Nunes, a despeito
do que mostram as pesquisas.
Na prática, as eleições brasileiras estão se transformando em não obrigatórias, diante da ausência de uma sanção significativa contra a abstenção. O voto torna-se facultativo na medida em que a justificativa para a ausência nas urnas é absolutamente aberta, na avaliação do constitucionalista Gustavo Binenbojm, e a eventual falta se resolve com facilidade.
Quem decide se vota é o eleitor, que a cada
ano mostra-se mais arredio, indisposto a participar da disputa eleitoral. O
sentimento antipolítica fica explícito não apenas na abstenção, mas também na
votação que candidatos autodeclarados antissistema recebem nas urnas, como foi
o caso de Marçal, que por pouco não foi para o segundo turno, com quase 30% dos
votos válidos.
Juntem-se esses votos aos números de
abstenção, os mais altos até agora depois da pandemia, e tem-se parcela
importante de eleitores que se posicionaram no primeiro turno contra “tudo o
que está aí”. Os eleitores de Bolsonaro que votam em Nunes aceitam a decisão de
seu líder de se envolver da maneira tradicional na disputa eleitoral, seguindo
os ditames da “velha política”. Bolsonaro admitiu recentemente, na presença do
prefeito candidato, que jogou “no meio-campo” durante o primeiro turno, não
entrando deliberadamente na antigamente chamada “zona do agrião”, onde as
partidas se resolvem.
Na verdade, Bolsonaro quase aderiu à
candidatura de Marçal. Não aderiu por receio de alimentar um político que o
desafia no seu próprio terreno, a extrema direita. Mesmo sem que Bolsonaro
tenha se empenhado e que Marçal não tenha apoiado formalmente Nunes, o prefeito
paulistano vem, segundo as pesquisas, recebendo a maioria esmagadora dos votos
dos que preferiram Marçal no primeiro turno. Isso demonstra mais uma vez que o
voto de cabresto, pelo menos nas grandes capitais, não vigora. Seja porque a
fiscalização eleitoral está mais afiada, impedindo o assédio ao eleitor, seja
devido a uma maior conscientização do eleitorado.
A lógica eleitoral brasileira é, portanto, de
um país de voto facultativo, não obrigatório. A campanha para que o eleitor vá
votar assemelha-se à dos Estados Unidos, onde o voto é facultativo. O Partido
Democrata tem investido muito no convencimento dos eleitores de que é preciso
ir às urnas para derrotar Donald Trump. Aqui, pesquisas, candidatos e partidos
só podem trabalhar com essa realidade de agora em diante. Na eleição
paulistana, parece prevalecer o antiesquerdismo, mesmo para aqueles que consideram
Nunes um representante da política tradicional. Ainda que desprezível do ponto
de vista dos marçalistas, ele receberá o voto útil daqueles que não querem ver
a esquerda no governo.
3 comentários:
O Lula depois do trauma crânio encefálico que causou hemorragia cerebral Vai ficar fora um bom tempo talvez tenha que passar por cirurgia de drenagem dos coágulos occipital e parietal
E a e a mídia fazendo um malabarismo pra Passar pano nessa situação grave do presidente
Eu não voto,não tenho título.
Concordo plenamente. O voto passou a ser facultativo. E com a facilidade de justificativa por aplicativo de celular, observo muitos eleitores preferindo viajar no domingo de eleição.
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