O Globo
Entre a COP no Azerbaijão e a do Brasil, o
mundo vai enfrentar muitos desafios, como a nova presidência dos Estados Unidos
Era para Baku ser uma preparação para Belém. Na capital do Pará, o Brasil quer consolidar um patamar mais alto de combate à mudança climática. A primeira pedra nesse caminho é Donald Trump que ontem mesmo, ao anunciar a nova administração da Agência de Proteção Ambiental, disse que a função será “desregulamentar”. A outra pedra é o próprio petróleo. Se em Dubai foi comemorado o discreto compromisso de redução do uso do petróleo, agora no Azerbaijão há pouca esperança de que esse assunto avance, até pelo fato de o país ser produtor petrolífero e depender dele. Além disso, Trump avisou que vai acelerar a produção de combustível fóssil.
A 29ª Conferência das Partes do Acordo-
Quadro da Convenção das Nações Unidos sobre mudança do clima— esse é o nome
inteiro das COPs — começou ontem em Baku sob o ambiente de muito pessimismo,
tanto que o presidente da Conferência, Mukhtar Babayev, abriu dizendo que
“estamos na rota da ruína”. Depois anunciou um acordo para uma lei global de
mercado de carbono, que ainda depende de muita coisa antes de ser viável e
global.
Todo ano, o mundo se reúne em um dos países
membros da Convenção do Clima, nascida no Rio em 1992, e discute que passos
devem ser dados para deter a mudança climática. Cada COP termina com algo a
comemorar e muitas frustrações. Sobre Copenhague em 2009 havia muitas
esperanças. Nos Estados Unidos começava um governo novo, o de Barack Obama, e o
Brasil tinha reduzido muito o seu desmatamento. Copenhague ficou muito abaixo
das expectativas e era duro ver os representantes dos países ilhas, ameaçados
de naufrágio, chorando na madrugada do último dia nos corredores do Bella
Center.
É desse ciclo que o mundo saiu quando fechou
um acordo em Paris, em 2015. Porém logo depois veio Donald Trump que retirou os
Estados Unidos do Acordo. Ao fim daquele mandato, o presidente Joe Biden levou
de volta os Estados Unidos para o esforço global de conter as emissões. Há
risco de que novamente Trump retire o maior emissor de gases de efeito estufa
per capita, e um dos dois maiores emissores do mundo, do acordo global para
tentar proteger a vida humana no planeta.
O momento é dramático. Aumentaram as
evidências do aquecimento global por ação humana, os desastres climáticos
ficaram mais extremos e mais frequentes e os alertas dos cientistas se tornaram
ainda mais aflitos. Tudo tem acontecido como a ciência previu, mas antes do
tempo.
A diferença entre o primeiro e o segundo
governo Donald Trump é que hoje há uma infinidade de negócios e investimentos
em torno da transição ecológica e energética e isso pode ser um constrangimento
à política Trump. Basta ver que o seu novo “best friend”, Elon Musk, tem fortes
investimentos tanto em carros elétricos da Tesla quanto em baterias de
armazenamento de energia de fontes renováveis. Trump é um negacionista que no
primeiro discurso, ainda contando os votos, chamou o petróleo de “ouro líquido”
e disse que ia acelerar a produção. Até que ponto? Isso pode derrubar a cotação
do petróleo, o que será um tiro no pé.
O Brasil chegou a Baku com o
vice-presidente Geraldo
Alckmin, a ministra Marina Silva e
duas notícias. Uma boa e outra que está sendo criticada. A boa é que o Brasil
reduziu o desmatamento da Amazônia em 30%, depois de ter cortado em 22% no ano
anterior. Esse é o balanço positivo de ter acabado o governo negacionista
de Jair
Bolsonaro. A outra notícia, que está em debate, é o anúncio das
novas metas nacionais, as NDCs, Contribuição Nacionalmente Determinada do
Brasil. O país vai reduzir de 59% a 67% as emissões até 2035 em relação ao que
emitia em 2005. Isso significa deixar de emitir de 850 milhões de toneladas a
1,05 bi de toneladas. Comparada à meta anterior, que ia até 2030, o país estará
reduzindo de 13% a 29%. As ONGs perguntam: por que tem que ser uma banda? Aonde
estão os detalhes sobre quanto cada setor vai reduzir sua emissão? O que vai
acontecer com o desmatamento cujo objetivo era zerar até 2030, e só isso já
significava uma redução de 650 milhões de tonelada de gases de efeito estufa.
Só por essa discussão do caso brasileiro se
vê que, enquanto o mundo está indo numa trilha de aumentar o seu esforço contra
a mudança climática, uma das duas maiores chaminés do mundo —a outra é a China
— será governada por quem quer colocar mais lenha na fogueira. A luta para
tirar as pedras do caminho entre Baku e Belém não será trivial.
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