O Globo
A anistia a Bolsonaro pelo Congresso provocaria uma longa discussão sobre sua legitimidade, que acabaria no Supremo Tribunal Federal (STF)
Dificilmente o ex-presidente Jair Bolsonaro
escapará de ficar alguns meses preso, provavelmente em sua casa, devido à saúde
e à idade, mas com tornozeleira eletrônica. Nunca existiu a possibilidade de
retomar seus direitos políticos ainda a tempo de disputar a eleição
presidencial de 2026, mesmo que eventualmente um projeto de anistia seja
aprovado pelo Congresso, hipótese cada vez mais remota. Nem uma anistia, nem um
indulto presidencial acabarão com sua inelegibilidade. Mas este último poderá
tirá-lo da cadeia.
O indulto extingue apenas os “efeitos primários” da condenação, mas não os secundários, como a inelegibilidade decorrente da condenação criminal. O problema de uma decisão pessoal, como a que Bolsonaro precisa tomar diante da eleição presidencial, é ter de se submeter às regras institucionais, e não a seus interesses particulares. A anistia pelo Congresso provocaria uma longa discussão sobre sua legitimidade, que acabaria no Supremo Tribunal Federal (STF).
O caráter personalista da anistia seria
considerado inconstitucional, além do que Bolsonaro teria de admitir a
participação nos tumultos do 8 de Janeiro para poder ser atingido pela anistia.
Resta-lhe a possibilidade do indulto, mas para isso ele teria de apoiar um
candidato vencedor na disputa presidencial. Como as pesquisas sugerem, seus
filhos Flávio e Eduardo não são competitivos. Sua mulher, Michelle, é mais
popular que eles, chega a empatar com Lula. Mas o sobrenome, nesse raciocínio
para além da vitória eleitoral, atrapalharia, pois uma presidente Bolsonaro
anistiando o marido Bolsonaro não teria a aceitação do Supremo. O mesmo
aconteceria com seus filhos.
O ex-presidente fica tentado a apoiar um
candidato aliado, mas não parente, mas não basta que ele diga que o indultará.
Ronaldo Caiado, governador de Goiás, e Romeu Zema, de Minas, já afirmaram alto
e bom som, mas não satisfazem a Bolsonaro. Pensando na dificuldade que teria no
Supremo, ele quer um candidato que tenha o respeito dos ministros e a
capacidade de negociar com eles a aceitação do indulto. O Supremo já barrou
indultos de presidentes, alegando que fugiram do espírito da lei.
A aceitação do governador de São Paulo,
Tarcísio de Freitas (Republicanos), pelas áreas jurídica e política nacionais
poderia ser uma saída para Bolsonaro, mas um obstáculo para Tarcísio, que,
eleito presidente, certamente seria tentado a disputar a reeleição. Basta
lembrar que o hoje presidente Lula não conseguiu tentar a volta ao poder em
2014, porque a presidente Dilma Rousseff fez valer sua condição de presidente
para disputar a reeleição.
O PSD tem ministérios no governo Lula, mas
Tarcísio aparece na propaganda na TV do partido. É uma estratégia de Gilberto
Kassab, secretário de Tarcísio. Kassab sempre disse que ele deveria continuar
como governador e que apoiaria Lula em 2026. Agora, tenta ver se faz com que
Tarcísio se imponha como candidato a presidente do grupo de Bolsonaro. Ele tem
um pé em cada canoa e tenta se equilibrar enquanto pode, mas o candidato dele é
Tarcísio. Só não tem certeza da candidatura porque Bolsonaro ainda não o apoia
formalmente e ficará mais irritado ainda com a propaganda do PSD de São Paulo.
Piorará também a relação de Tarcísio com os
bolsonaristas mais radicais, que têm muita gana de Kassab. Sabem que ele é
habilidoso, tenta ficar nas duas canoas. Gostariam que ele não tivesse
influência sobre Tarcísio — mas tem. É considerado uma das últimas raposas
políticas. Tanto que seu partido tem ministros no governo Lula e ele é
secretário de Tarcísio em São Paulo. Está nas duas e ficará assim até poder se
definir claramente. Lula não tem como reagir, porque precisa do PSD no
Congresso; tem de engolir o sapo e fingir que está tudo bem.
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