Folha de S. Paulo
Livro retrata conversa entre o filósofo
Michael Sandel e o economista Thomas Piketty
Autores defendem pacote básico da esquerda,
mas propõem algumas ideias novas, como sorteio de senadores
E se, no espírito da velha democracia ateniense, começássemos a preencher cargos na administração pública por sorteio? A ideia é do filósofo Michael Sandel (Harvard). Para combater alguns dos efeitos perversos da desigualdade, ele sugere que países que tenham Parlamento bicameral, caso dos EUA e do Brasil, passem a definir os membros do Senado não por eleição, mas por sorteio.
A proposta está em "Equality",
livro que resultou de um encontro entre Sandel e o economista francês Thomas Piketty na Escola de Economia de Paris em 2024. O
debate entre os dois tem algo de conversa de comadre, já que eles concordam em
quase tudo.
Defendem o pacote básico de esquerda, que
inclui impostos progressivos, investimentos em saúde e educação
públicas, poder para sindicatos e quem sabe até algum controle de
capitais. Mas também há espaço para ideias que fogem ao convencional, como a
proposta dos sorteios.
A questão do Parlamento é, na verdade, uma
derivada. Sandel defende já há tempos que o sorteio seja usado como um dos
critérios de admissão de alunos em universidades de elite, como Harvard. A
extensão dessa ideia para o Legislativo é
que pelo menos para mim soa como novidade.
Em ambos os casos, a ideia é combater a falsa
noção de que vivemos numa sociedade meritocrática, em que as pessoas recebem
compensações justas por suas virtudes ou defeitos. Ainda que a ideia nos
repugne, dos genes às oportunidades, é o acaso que está no comando.
Penso, porém, que o mecanismo sugerido por
Sandel funcionaria melhor nas universidades do que no Parlamento. É que, no
caso das escolas, não é difícil fazer, antes do sorteio, uma pré-seleção que
assegure a qualidade acadêmica de todos os candidatos. No Legislativo, é mais
complicado.
Eu pelo menos jamais votaria em mim, pois
estou certo de que não tenho o que é necessário para ser um bom congressista,
mesmo que não saiba nem enumerar essas virtudes. Quando escolho meu deputado ou
senador é justamente por ele ser diferente de mim.
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