quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Rituais vestibulares

Rosângela Bittar
DEU NO VALOR ECONÔMICO

Adiantadas algumas etapas, como a definição do nome e preparação minuciosa do seu perfil físico e conteúdo de marketing, e vencida também a arrumação política para ter em postos estratégicos, à época certa, aliados confiáveis, cuida agora o presidente Lula, seu governo e o PT de preparar o conteúdo político-ideológico da candidatura Dilma Rousseff à Presidência da República. Os dois dias de reunião do Diretório Nacional do PT, encerrados ontem, em Brasília, foram integralmente dedicados a esta tarefa.

Oficialmente, discutiu-se a crise econômica mas, na realidade, delineou-se a ideologia sobre a qual se vai discursar a partir de agora e que será o cerne da campanha eleitoral da candidata a suceder o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Veio do Palácio do Planalto, especialmente do discurso do ministro Luiz Dulci, chefe da Secretaria Geral da Presidência, aos seus colegas da direção, o recado, sob forma de sugestão. A campanha de Dilma resgatará o PT como partido de esquerda, os aliados históricos vão ser procurados para darem densidade ao projeto, o mesmo ocorrendo com os movimentos sociais, os sindicatos, os estudantes, as organizações civis.

Unidos, darão voz a um discurso que voltará a comparar o governo Lula com o governo Fernando Henrique Cardoso, como feito em 2002 e 2006. Mais ou menos o que se fez com a demonização da privatização. A crise global do momento estará no centro das comparações. Na reunião do Diretório do PT, segunda-feira, por exemplo, a partir de critérios levados por Dulci do Palácio do Planalto para o partido, discutiu-se como mostrar que Fernando Henrique (o "governo anterior", na concepção petista) reagiu às crises econômicas do México, da Ásia e da Rússia, e como Lula reagiu à atual crise financeira internacional.

Para o PT, há uma diferença abissal entre os dois, e ela é sobretudo ideológica. As análises contornam evidências como, por exemplo, as diferenças também espantosas entre as próprias crises dos dois períodos. As que atingiram México, Ásia e Rússia (1994/1997/1998), eram crises dos países emergentes, que envolveram diretamente Brasil, Argentina, Turquia e quem mais se incluia naquela condição. No governo Lula, a crise está no centro do mundo desenvolvido, Estados Unidos e Europa, sobretudo, com reflexos no Brasil e outros emergentes que, além de se encontrarem em melhor situação hoje do que há 10, 15 anos, receberam o impacto de uma forma mais branda, definida pelo próprio presidente como uma marolinha que vai perdendo força à medida em que se propaga.

Entretanto, isto sequer importa. Para quem prepara a campanha eleitoral, é um pormenor com que não é preciso gastar argumento. O que se vai usar na campanha é que "Fernando Henrique enfrentou as crises econômicas do seu tempo com demissões, desemprego, aumento de juros, tudo ao contrário de Lula, que enfrentou a maior crise do sistema capitalista desde 29 com aumento de crédito, combate ao desemprego, aumento de salários, redução de juros, expansão dos programas sociais e de habitação popular".

Discutiu também o PT a aceleração do processo desta candidatura. Que Dilma é a preferida de Lula e do governo, que seu nome está definido sem risco de contestações, ninguém duvida. Mas o partido defende que ela seja logo a candidata do PT e comece a fazer o circuito dos movimentos sociais. Munida do apoio de Lula e do PT, cercada de sindicatos, camponeses, estudantes, donas de casa, profissionais liberais, tendo ao seu lado aliados históricos à esquerda, a candidata Dilma Rousseff estará, na avaliação do partido, fortalecida o suficiente para, só então, procurar o PMDB.

Segundo a discussão dos últimos dois dias na cúpula do partido, o PMDB deve agir de acordo com o que mostrarem as pesquisas de opinião do eleitorado. "Se estivermos bem, o PMDB vem conosco; se o PSDB estiver melhor, o PMDB vai para lá; se estivermos em equilíbrio, parte do PMDB vai com um, parte vai com outro", comenta um realista dirigente do PT, explicando que, para evitar que as pesquisas definam a força da candidatura, é preciso chegar ao PMDB com mais consistência. O que interessa é o latifúndio de tempo que o partido tem no horário eleitoral gratuito, e este seguirá, mesmo com divisão, com quem ficar oficialmente o PMDB.

Lula, enquanto prepara Dilma, vai jogando em todas as posições. No momento, articula para influir nas definições do PMDB, para não ficar totalmente vulnerável ao imponderável das opções do partido. O presidente trabalha agora para levar o partido a optar por um novo presidente da legenda, com a próxima renúncia do deputado Michel Temer, eleito presidente da Câmara, que facilite a vida do PT.

Nesta reunião partidária de dois dias definiu-se, também, que o presidente do PT, Ricardo Berzoini, vai começar a correr os Estados para uma abordagem mais objetiva da formação dos palanques para Dilma. A tese de acelerar as providências deve ser vencedora das atuais discussões, sobretudo para dar "tranquilidade" à candidata.

Gula

O presidente Lula operou, pessoalmente, o comparecimento do maior número possível de prefeitos de cidades importantes à reunião que promove, desde ontem, em Brasília. Enviou emissários a Eduardo Paes, do Rio, não só informando sobre seu interesse que ele estivesse no encontro, como pediu que Paes se candidatasse a vice-presidente da Frente Nacional de Prefeitos, entidade que representa as cidades grandes e que deverá ter na presidência o prefeito de Florianópolis, Dário Berger. A própria reunião de prefeitos, desta semana, já representou uma tentativa de antecipar-se e, com isto, derrubar a marcha de prefeitos organizada anualmente por Paulo Ziulkoski, da Confederação Nacional de Municípios, entidade que congrega as cidades menores. Lula quer tudo e está ganhando.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

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