terça-feira, 27 de outubro de 2009

Duelo de personalidades

Janaína Figueiredo
Enviada especial • Montevidéu
DEU EM O GLOBO

Mujica não consegue evitar 2º turno no Uruguai e analistas preveem luta dura com Lacalle

Depois de ter fracassado em sua tentativa de eleger-se no primeiro turno, realizado domingo passado, o ex-guerrilheiro tupamaro José “Pepe” Mujica iniciou ontem a segunda etapa da campanha eleitoral uruguaia que, segundo afirmaram analistas locais, se transformará num plebiscito entre dois modelos de país, defendidos por dois candidatos de perfis e personalidades totalmente diferentes. Pouco depois de confirmado o cenário mais temido pela Frente Ampla, a coalizão esquerdista no governo desde 2005, o ex-presidente e candidato à Presidência do tradicional Partido Nacional Luis Alberto Lacalle (1990-95) iniciou a batalha final, que promete ser intensa.

— Somos paz, certeza, segurança e equilíbrio. Uma única bandeira nos identifica, ela nos cobre e nos iguala — declarou o candidato, que segundo dados oficiais obteve 28,94% dos votos, bem abaixo dos 48,16% alcançados por Mujica.

A estratégia de Lacalle será construir uma imagem de candidato de todos os uruguaios e não apenas dos setores vinculados a seu partido. Para isso, o ex-presidente deverá superar o preconceito de muitos eleitores, que o consideram o candidato da direita neoliberal e conservadora. O candidato esquerdista partiu de uma base de apoio mais ampla, mas nesta segunda e última etapa da eleição Lacalle contará com grande parte dos votos do Partido Colorado, que ficou em terceiro lugar, com 16,9%. Mujica tem uma clara vantagem, mas os analistas políticos uruguaios não se atrevem a antecipar um resultado do segundo turno, marcada para 29 de novembro.

— Será uma campanha difícil — ressaltou Ignacio Zuaznábar, diretor da empresa de consultoria Equipos Mori.

Na Câmara dos Deputados, o resultado está pendente por uma cadeira: cada lado está com 49 assentos.

Se conseguir mais um, a Frente Ampla conseguirá preservar a maioria parlamentar conquistada nas eleições de 2004. Já o Senado pode ficar partido em metades iguais.

Embora o partido do governo tenha se consolidado como a principal força política do país, pela primeira vez, desde sua criação, em 1971, a Frente Ampla não só interrompeu seu processo de contínuo crescimento em matéria de número de eleitores, como recuou (no primeiro turno das presidenciais de 2004, o presidente Tabaré Vázquez foi eleito com 50,45%).

— Nas últimas três décadas, a Frente cresceu, em média, um ponto percentual por ano. Nesta eleição, tivemos um claro retrocesso — afirmou Luis Eduardo González, da empresa de consultoria Cifra.

Vázquez mais ativo no segundo turno

Nos próximos 30 dias, Mujica e Lacalle serão protagonistas de uma campanha que deverá centrar-se em suas personalidades, trajetórias e planos de governo. Os partidos não deverão ter tanto peso como os candidatos, explicaram analistas locais. O ex-guerrilheiro tupamaro tentará mostrar-se como a continuidade do governo Vázquez, que tem mais de 60% de apoio popular, e para isso seus assessores defendem a necessidade de dar mais espaço na campanha ao ex-ministro da Economia Danilo Astori, companheiro de chapa de Mujica. De perfil bem mais moderado, Astori foi o candidato de Vázquez na eleição interna do partido, mas acabou derrotado pelo ex-guerrilheiro e, sobretudo, pela força de seu Movimento de Participação Popular (MPP).

Na noite de domingo, o candidato a vice da Frente Ampla admitiu que o segundo turno será um plebiscito entre dois projetos de país.

— A verdade é que não vejo com que comparar este projeto nacional, porque somente a esquerda tem um projeto nacional — alfinetou Astori.

A estratégia do governo também incluirá novos gestos de apoio do presidente a seu candidato, já que na primeira etapa de campanha Mujica e Vázquez estiveram bastante distanciados. O comando de campanha da Frente Ampla cogita, ainda, a possibilidade de antecipar as medidas que seriam adotadas por Mujica em seus primeiros cem dias de governo, além do nome de ministroschave num futuro Gabinete.

— Até agora não sabemos nada sobre suas equipes e medidas de governo — disse a analista Rosário Queirolo.

Lacalle tentará reforçar uma imagem de estadista, homem que transmite confiança à população e, sobretudo, aos empresários, mercados e governos estrangeiros. A insegurança nas ruas é uma das principais preocupações dos uruguaios e o ex-presidente já prometeu um governo “com autoridade para fazer o que deve ser feito”.

“Não vejo com que comparar este projeto nacional, porque somente a esquerda tem um projeto nacional”
(Danilo Astori, candidato a vice de Mujica)

“Somos paz, certeza, segurança e equilíbrio. Uma única bandeira nos identifica, ela nos cobre e nos iguala”
(Luis Alberto Lacalle, candidato do Partido Nacional)

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