sábado, 2 de julho de 2011

Sinais :: Merval Pereira

O desfecho da crise dos "restos a pagar" das emendas parlamentares só fez reforçar a percepção disseminada pela classe política de que o governo não tem estrutura para aguentar as pressões da sua própria base aliada. Depois de ter recuado na decisão de não pagar as emendas de 2009, o governo teve que voltar atrás outra vez, desautorizando o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que anunciara que, para não prejudicar o equilíbrio fiscal, seriam suspensos os pagamentos das emendas de 2010 nos próximos 3 meses.

Nova rebelião da base aliada e nova mudança do governo, com a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, vindo a público para garantir que tudo não passara de um mal-entendido e que as emendas de 2010 serão liberadas juntamente com as de 2009.

Com isso, o governo está dando "um péssimo sinal", conforme definição da própria Dilma, que, antes do recuo, comentara que seria impossível aceitar o pleito dos aliados, sob o risco de passar uma mensagem negativa de afrouxamento, carregada do simbolismo de que o governo estaria abrindo mão do ajuste fiscal.

Segundo esses comentários com políticos, publicados nos jornais e não desmentidos, Dilma considera que controle inflacionário e estabilidade econômica são preceitos fundamentais para a credibilidade do governo.

Agora, as autoridades econômicas correm para dizer que o equilíbrio fiscal não está ameaçado pelo pagamento das emendas parlamentares.

Os permanentes recuos não combinam com o propalado estilo assertivo da presidente Dilma, que, aliás, foi motivo de outro princípio de crise que não se sabe se foi superado.

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, ao fazer uma homenagem aos 80 anos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de quem foi ministro da Justiça e por quem foi indicado para o Supremo Tribunal Federal, provocou constrangimentos nos petistas presentes ao afirmar que FHC nunca levantou a voz para ninguém, nunca criou tensionamento entre aqueles que o assessoravam.

A referência foi interpretada como uma indireta ao tal estilo "assertivo" da presidente Dilma.

Em seguida, Nelson Jobim fez um desabafo dizendo que os tempos mudaram e hoje é obrigado a conviver com "idiotas", num discurso que o ex-senador Tasso Jereisatti classificou de "cheio de recados".

A presidente Dilma, que teria ficado irritada com o discurso, pediu explicações ao ministro Jobim em uma audiência ontem pela manhã, e este disse que esclareceria o mal-entendido em uma nota oficial, que não foi divulgada por enquanto.

Se por um lado o fato de o ministro da Defesa ser um civil, ainda por cima político, ameniza o que poderia ser uma crise séria se o ocupante do cargo fosse um militar. A reação da presidente aos comentários do ministro Jobim, que é do PMDB, está sendo considerada como mais uma prova de que ela não encontrou a justa medida para exercer seus poderes presidenciais.

Ou não está segura de que tenha força política para exercê-los.

Essa diferença entre o que aparenta e o que faz na realidade faz com que suas mudanças constantes de opinião passem a impressão de que a presidente Dilma é mais de fazer bravatas do que de decidir.

Mudar de opinião pode ser um bom sintoma, desde que essa mudança venha através do convencimento, da discussão política.

Foi o que disse o ex-presidente Fernando Henrique ao afirmar que está na hora de voltarmos a fazer política na base do convencimento, e não da pressão.

Mas a presidente Dilma tem a tendência de ser autoritária, anunciar posições definitivas, que quando não se concretizam passam a sensação de que ela fala mais do que faz.

Isso está dando à classe política a sensação de que ela não aguenta uma pressão. É ruim qualquer presidente ficar com a imagem de fraqueza, de que não tem força para manter suas posições.

Ter um presidente autoritário, que não muda de posição por nada nesse mundo, é muito ruim também, mas a mudança de posição tem que corresponder a um diálogo, a uma negociação, senão essa relação do Executivo com o Legislativo se transforma em um eterno enfrentamento em que a presidente não pode perder sempre, como vem acontecendo.

Faz toda diferença mudar de opinião porque foi convencida num processo democrático, ou porque foi derrotada.

A mesma situação vem se repetindo nas nomeações para cargos públicos ou lideranças do governo, onde ela em determinadas ocasiões parece enfrentar o PMDB ou o PT, mas depois recua.

Há um enfrentamento silencioso entre ela e o presidente do Senado José Sarney, um de seus maiores aliados, mas que está agastado com a nomeação de Flavio Dino do PCdoB para a Embratur.

Dino foi derrotado por Roseana Sarney na disputa pelo governo do Maranhão, e acabou sendo nomeado para o mais importante cargo do Ministério do Turismo, onde está alocado um protegido de Sarney.

O PT, por sua vez, não gostou da nomeação do deputado Mendes Ribeiro, do PMDB, para líder do governo no Congresso.

Esse foi outro caso em que a presidente foi vencida pelo PMDB. Ela chegou a vetar o nome de Mendes Ribeiro, alegando que ele não se comportara bem na votação do Código Florestal.

Pensou em nomear o senador Eduardo Braga, também do PMDB, mas do Senado, que ensaia uma atuação independente.

Para tentar constranger o PMDB, que insistia em Mendes Ribeiro, chegou a ameaçar nomear o petista Pepe Vargas. Ao fim e ao cabo, nomeou mesmo o indicado inicialmente pelo PMDB, passando a sensação de que as dissidências nas votações polêmicas como o Código Florestal acabarão sendo absorvidas pelo governo.

Os sinais de fragilidade de posições já estão sendo captados pelos radares sensíveis dos políticos, especialmente do PMDB, e é quase certo que veremos novos testes dentro em breve em votações importantes do Congresso.

FONTE: O GLOBO

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