domingo, 9 de outubro de 2011

Governo 'ganha' R$ 10 bi com inflação

Inflação acima da meta cria volume adicional de receitas de R$ 6,5 bilhões a R$ 10 bilhões, o que facilita cumprimento de objetivos fiscais

Fabio Graner, Adriana Fernandes

BRASÍLIA - Vilão do poder de compra da população, especialmente dos mais pobres, a inflação mais alta tem engordado o caixa do governo. A elevação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) neste ano tem provocado um aumento relevante das receitas da União, o que facilita o cumprimento da meta fiscal, definida em valor nominal fixo (R$ 127,9 bilhões).

Estimativas de economistas ouvidos pelo Estado indicam que a inflação acima da meta neste ano deve gerar um volume adicional de receitas de R$ 6,5 bilhões a R$ 10 bilhões.

De janeiro até setembro, a inflação oficial acumulou 4,97%. Ou seja, em nove meses, o IPCA já ultrapassou o centro da meta para o ano - 4,5%. Em 12 meses, o indicador apresenta alta de 7,31%. As projeções variam, mas em geral apontam para fechamento acima de 6%, com a divergência entre os otimistas, que acreditam que o teto da meta (6,5%) não será superado, e os pessimistas, que trabalham com o IPCA acima do limite estabelecido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).

Ao encarecer os produtos, a inflação aumenta a base de tributação, ajudando a arrecadação federal, ao mesmo tempo em que reduz o poder de compra da população. O impacto também se dá na despesa do governo, mas esse movimento não ocorre na mesma intensidade e velocidade, deixando no curto prazo um saldo fiscal mais favorável para as contas públicas.

Risco. Economistas ponderam, contudo, que o benefício é pequeno diante do risco que uma inflação crescente representa para o bom funcionamento da economia no longo prazo.

"A inflação acaba gerando alguma ajuda fiscal no curto prazo, mas não é uma estratégia boa, não é sustentável e gera malefícios para a sociedade, pois prejudica a renda da população", diz o economista da Tendências Consultoria e especialista em finanças públicas, Felipe Salto.

Ele estima um impacto em torno de R$ 10,6 bilhões da inflação acima da meta sobre a arrecadação deste ano, considerando a projeção de IPCA em 6,6% em 2011.

"De fato, está havendo um ganho de receitas com a inflação este ano, embora a atividade econômica em alta seja o fator preponderante", disse Salto, lembrando também que o governo contou com receitas atípicas decorrentes de recolhimentos de tributos pela Vale e pelo Refis da Crise.

"Como o governo estima a receita, mas fixa a despesa, a inflação maior leva a um aumento de arrecadação e a um ganho fiscal", acrescentou.

Ajuda irrisória. O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, estima um impacto positivo de R$ 6,7 bilhões da inflação na arrecadação, considerando o IPCA em 6,5%. No lado da despesa, o economista recorda que a inflação afeta principalmente os gastos da Previdência.

"No fim, a inflação vai acabar sendo um pouco benéfica para as receitas do governo, mas isso tudo é ilusório. Uma economia de inflação em 4,5% é muito melhor do que uma economia com inflação de 6,5%. A sinalização nos dois casos é bem diferente e levaria a crer que nos anos seguintes o governo teria mais dificuldade de trazer a inflação de 6,5% para 4,5%", disse Vale.

"Ou seja, em algum momento, o crescimento do PIB acabaria ficando menor por causa do ajuste nos juros para controlar a inflação. Assim, isso apenas seria mais uma "vitória de Pirro" para um governo que está mudando para pior a política econômica", acrescentou.

O economista lembrou ainda que a ajuda da inflação para a arrecadação acaba sendo "irrisória" diante do quadro de novas despesas que o governo já está contratando para o ano que vem. "Espero que o governo não considere esse tipo de conta positivo porque seria um retrocesso enorme para nossa economia."

Uma fonte da área econômica explicou que não é tarefa simples calcular o impacto da inflação na arrecadação. São usados cerca de 20 indicadores econômicos, além da inflação, nas projeções de receita, entre eles taxa de câmbio, massa salarial e taxa Selic.

Dependendo da característica de cada tributo, um determinado indicador tem mais peso. É o caso, por exemplo, da taxa de câmbio, que influencia diretamente a arrecadação do Imposto de Importação e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) vinculado à importação.

Os tributos mais sensíveis à inflação são a Cofins e o PIS. Mas a inflação também tem impacto sobre outros indicadores, como a taxa Selic, que tem influência direta, por exemplo, na arrecadação do Imposto de Renda sobre ganho de capital nas operações financeiras.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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