Amigos inseparáveis, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, estão com as relações pessoais e políticas estremecidas. Na realidade, os dois chegaram à beira do rompimento, depois que Eduardo Campos se recompôs politicamente com o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE), com o início da campanha eleitoral. Mas o que move PT e PSB, numa disputa quase fratricida, são as duas próximas eleições presidenciais.
Lula "adorava" Jarbas, segundo contam amigos do ex-presidente, mas os descaminhos da política levaram o senador pernambucano a se transformar num dos mais ácidos críticos do presidente, no segundo mandato. A memória de Lula ainda traz bem impressa a imagem de uma visita que Jarbas fez à sua casa, em São Bernardo do Campo.
Para mostrar a admiração que tinha por Jarbas, Lula costuma contar uma das "maiores humilhações" que teria sofrido até hoje. O agora ex-presidente recebeu em sua casa, em São Bernardo do Campos, o já consagrado senador e sentou-se num sofá surrado bem sobre o rasgão que não gostaria que Jarbas visse. Constrangido, não se levantava e passou a maior parte do tempo sentado, o que impedia Jarbas também, por educação, de levantar e ir embora.
Estremecimento Lula e Campos é uma prévia de 2014
À época, Jarbas era um dos mais importantes líderes do grupo do PMDB que fazia oposição ao regime militar. Quando assumiu o Palácio do Planalto, Lula tinha boas expectativas em relação ao senador. Ocorre que entre os dois havia Eduardo Campos, adversário de Jarbas, à época ministro da Ciência e Tecnologia, presidente nacional do PSB e deputado de boa cepa pernambucana: neto do lendário governador Miguel Arraes.
Em pouco tempo, Eduardo se tornou uma ameaça ao PT. Além de estirpe, o governador pernambucano se revelou um hábil articulador político e não tardou a botar novamente de pé o antigo Partido Socialista (PSB). Sob o olhar condescendente de Lula e a desconfiança do PT, aos poucos o governador foi avançando pelo Nordeste, região eleitoralmente forte e que recebeu grandes benefícios do governo Lula. Tanto que o PT ganhou as últimas eleições com facilidade na região.
Eduardo Campos decidiu fazer um gesto de boa vontade eleitoral em São Paulo: não foi fácil, mas ele conseguiu convencer os dirigentes do PSB local a apoiar o candidato do PT a prefeito, o ex-ministro da Educação Fernando Haddad. "Fizemos quase uma intervenção branca apenas para atender o Lula, que, todos nós sabemos, quer eleger o Haddad", conta um dirigente do PSB. Os pessebistas ofereceram duas opções para a vice: a deputada Luiza Erundina e o educador César Calegari. O PT escolheu Erundina.
Outro conflito PT-PSB foi o do Recife. Os pessebistas concluíram que Lula errou do início ao fim na negociação para manter a aliança entre os dois partidos: O PT exigia liderar a aliança quando estava rachado em três facções. Lula também não se impôs ao PT e apontou um candidato como fez em São Paulo.
"Vamos lançar o nosso [candidato]. Se eu entrar nessa história não vamos ficar bem com nenhum dos lados [as facções do PT em disputa]. Como o PT é o partido no poder, o PSB considera legítimas suas aspirações por espaço, mas entende que o que a sigla quer mesmo é se tornar "exclusivista e esquece que a época do stalinismo passou", avalia-se no PSB. A sigla, por exemplo, acha que teria boas chances nas eleições de Salvador. O PT não abriu mão de impor o nome de Nelson Pelegrino. Restaram à sigla de Eduardo cidades com menor potencial eleitoral no Norte do país. Essa é a queixa.
No fundo, o que contamina as relações entre PT e PSB é o pós-lulismo, o que virá depois do controle, esse sim quase hegemônico, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As relações pessoais entre Lula e Eduardo, embora abaladas, em breve serão restabelecidas, conforme acreditam os mais radicais de um e outro partido.
A relação política é outra coisa. Quando Lula se queixou da aliança de Eduardo com Jarbas, o pernambucano reagiu com o chamado tapa com luvas de pelica: ele não fora à casa do senador do PMDB para pedir apoio político. Jarbas é que o visitara.
Lula, evidentemente, não gostou de ser lembrado da visita que fez à casa de Paulo Maluf para celebrar a aliança do PP com o PT, em São Paulo. Assim como Eduardo Campos dificilmente vai dar crédito à explicação, dada no Planalto, segundo a qual aguardara por quatro horas para ser recebido pela presidente Dilma Rousseff.
De acordo com o Palácio do Planalto, o que ocorreu foi uma grande confusão: quando já se estava com o programa de concessões pronto para o lançamento, alguém lembrou que os governadores não haviam sido convidados para a cerimônia. Foi um corre-corre, noite adentro. Pelo menos uns 20 governadores conseguiram modificar a agenda e arrumar transporte para Brasília. Eduardo entre eles.
Posteriormente, alguém teria visto o governador de Pernambuco na antessala de um assessor e vazou a versão segundo a qual ele esperou para ser recebido. Verdadeira ou não, o fato é que Eduardo registrou a intriga: "Ela se esquece que depois dessa eleição tem outra". Referia-se a Dilma, é claro.
Eduardo já disse que não quer ser candidato ao Senado ou a vice-presidente, quando deixar o governo. Ele efetivamente analisa a "tática Ciro", ou seja, sair candidato já em 2014 a fim de se tornar conhecido para 2018. Mas também conversa com Aécio Neves - uma conversa aparentemente sem futuro, pois caberia a ele a vice, enquanto o tucano ficaria com a cabeça de chapa.
Sobre o futuro da relação do grupo, é ilustrativo um episódio ocorrido antes da viagem de Dilma ao México. A presidente perguntou a Gleisi Hoffmann qual seria o presente oficial da comitiva. Dilma não gostou da resposta e determinou: "Liga para a Fatinha [mulher do governador Jaques Wagner] ou para a Renata [mulher de Campos]. Evidentemente ela pensava em uma peça com a cara do Nordeste brasileiro.
FONTE: VALOR ECONÔMICO
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