Recurso retórico frequente no discurso da presidente Dilma Rousseff, as propostas de "pactos" com o Congresso, governadores ou prefeitos costumam aparecer nos momentos em que a presidente precisa de respostas rápidas às dificuldades que se apresentam. Foi ainda sob o efeito da vitória conquistada em 2010 que a presidente se dirigiu ao Legislativo já no segundo mês de seu mandato com a proposta de um "pacto de avanço social".
As metas eram tão ambiciosas quanto diversas, como acabar com a miséria, ampliar o acesso à saúde e à educação e garantir a segurança aos brasileiros. O discurso de Dilma, naquele momento, foi feito para servir de contraponto às tragédias naturais que atingiram a região Sudeste em 2011. "Este pacto pode ter como símbolo o esforço deste governo e, tenho certeza, das senhoras e dos senhores também – para que nunca mais se repita a tragédia das chuvas, que roubaram centenas de vidas e destroçaram os sonhos de milhares de famílias na região Sudeste, neste início de ano", dizia a mensagem ao Congresso Nacional.
Se, na época em que foi proposto, o pacto da presidente conseguiu soar como resposta para as catástrofes, no ano seguinte ele se mostrou de pouco resultado. Deslisamentos e enchentes voltaram a atingir o país no início de 2012. "A impressão é que o governo vai buscando uma resposta para sobreviver (ao lançar os pactos). Mas não dá para viver só no gogó", avalia o doutor em ciência política pela Universidade de São Paulo (USP) Rui Tavares Maluf.
Logo depois do primeiro pacote, em busca de uma marca para seu governo, Dilma chamou governadores de todas as regiões com a intenção de firmar acordos direcionados a acabar com a pobreza extrema no país. Ao mesmo tempo em que percorria os estados lançando versões da proposta, uma leva de ministros caía por denúncias e suspeitas de corrupção. O discurso de acabar com a miséria e a pecha da faxina ética colaram na presidente, que viu sua popularidade disparar.
As dificuldades com a base aliada começaram a se intensificar em 2012 e novos pactos se sucederam. A bandeira da alfabetização até 8 anos de idade foi alvo; a redução dos acidentes de trânsito, também. Em meio aos movimentos populares iniciados no mês passado, a presidente voltou a lançar mão dos pactos. Desta vez, nada de doses homeopáticas. Foram cinco lançados de uma vez para tentar responder às críticas que se levantaram nas ruas e fizeram sua avaliação despencar 27 pontos percentuais.
Para o líder do DEM no Senado, José Agripino Maia (RN), a presidente oscila entre a "extrema presunção" e a "extrema conciliação". "Quando está tudo ótimo e ela está por cima, não ouve ninguém. Quando as coisas vão mal, ela chama todo mundo para um pacto", disse. Para ele, falta "alma de estadista". "Nesses últimos, ela não teve alternativa. Não conseguiu formular alguma coisa à altura da crise. Apresentou qualquer coisa malformulada."
O líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), rebate a oposição e diz que, em momentos de crise, é "bom saber que quem te representa está pensando naquilo". "Quando a presidente anuncia pactos, tem uma dimensão de dizer: "isso não pode acontecer e precisamos ficar atentos". Quando há momentos de grande impacto na vida nacional, um governante pode se esconder ou, como ela, vai a publico", avalia. Ele alega, ainda, que nem todos os anúncios sobre um acordo, que "podem estar ligados a problemas antigos", têm eco imediato na vida da população.
Baixos resultados
Os efeitos colaterais, contudo, têm se mostrado mais fortes do que os resultados. É o caso da reforma política. A proposta de uma discussão, já com efeitos em 2014, irritou ainda mais a base aliada e, muito por isso, não vingou. O PT acabou isolado na defesa da bandeira de Dilma na Câmara. Constrangido, José Guimarães (PT-CE), líder da legenda na Casa, teve de admitir que "a viola desafinou" entre o Planalto e a base.
A investida de Dilma na área da saúde também azedou os ânimos entre os profissionais do setor. Integrante de uma das propostas da presidente a governadores e prefeitos, o programa Mais Médicos trouxe a promessa de investimentos na estrutura de unidades de atendimento e incentivos para levar médicos para o interior. O pacote, contudo, incluiu a criação de um ciclo de dois anos em que formandos terão obrigatoriamente que prestar serviços em regiões afastadas das capitais e abriu brechas para a contratação de médicos no exterior, o que desagradou profissionais em todo o país.
Para piorar a situação, os vetos feitos pela presidente ao Ato Médico tirou da lei que regulamenta a medicina artigos que criavam uma espécie de "reserva de mercado" para algumas atividades que, a partir da canetada de Dilma, poderão ser praticadas por outros profissionais. Pensado como uma solução para a saúde pública, o pacto, desta vez, trouxe mais uma guerra para o colo da presidente.
“A impressão é que o governo vai buscando uma resposta para sobreviver (ao lançar os pactos),mas não dá para viver só no gogó" - Rui Tavares Maluf, cientista político da Universidade de São Paulo
Fonte: Correio Braziliense
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