• Entrevista- Renato Janine Ribeiro (Professor-titular de Ética e Filosofia Política da Universidade de São Paulo)
Leonardo Fuhrmann, Patrycia Monteiro Rizzotto – Brasil Econômico
Professor-titular de Ética e Filosofia Política da Universidade de São Paulo (USP), Renato Janine Ribeiro prevê tempos difíceis para o próximo presidente, qualquer que seja o vencedor da eleição de domingo. Ele critica a despolitização do debate político e é duro na análise dos principais candidatos: "As propostas de Marina têm um problema de falta de consistência; as do PSDB estão bastante superadas em termos de finalidade; e as do PT, envelhecidas". E acredita que PSDB e PT terão de se renovar. "O PSDB ficou tão atrasado que eu fico espantado como ainda tem tanta gente disposta a votar nele", alfineta. Sobre Dilma Rousseff, critica o autoritarismo e o ministério fraco, problemas que podem se agravar em novo mandato. Janine diz que o acesso das classes populares a produtos tem reforçado o pensamento conservador — "A inserção pelo consumo cria uma mentalidade consumista, que é de direita". E cobra um passo à frente dos programas sociais: "Será necessário um plano mais estruturante".
Como o sr. viu a ascensão de Marina Silva na campanha?
Foi o fenômeno mais interessante desta eleição, que estava muito morna, porque Eduardo Campos não conseguia desenvolver uma imagem diferente da de Aécio Neves. E, bem antes, o tom da campanha era dado por um certo sentimento de desencanto com a política tradicional e com os dois partidos que têm se alternado no poder. Por isso que o grande número de votos que Marina agregou nas primeiras pesquisas de intenção de votos foram de pessoas que pretendiam votar branco ou nulo, ou que estavam indecisas. Eu não sei mencionar quanto desse desencanto tem a ver com o conteúdo da política tradicional, e quanto tem a ver com a forma. Porque há uma agressividade nas campanhas. O tempo todo a mídia bate no PT. E, na hora da campanha, o PT também está batendo pesado, sobretudo na Marina, o que gera descontentamento em parte dos eleitores. Há duas grandes questões debatidas pela população: os programas sociais — que fazem as coisas tenderem a favor do PT— e a questão da corrupção, que muitas pessoas pensam que é exclusividade do PT, que não existe em outros partidos. Isso se tornou uma bandeira contra o PT.
Por que se associa a corrupção à imagem do PT?
Numa sociedade de pouca cultura democrática, é difícil as pessoas se acostumarem à ideia de que há dois, três partidos políticos concorrendo, igualmente honestos, ou desonestos, mas que a diferença deles seja dada pela plataforma, e não pela honestidade. Aqui se projeta uma característica da moral sobre a política. Na moral, se tem mais forte a idéia de que há condutas erradas e que, em certas condições, há apenas uma conduta correta. Então, quando se projeta a moral sobre a política, se você discorda de alguém, acaba acreditando que esse alguém é do mal, que está fazendo uma coisa errada, não só politicamente, mas moralmente. Isso o PT fazia quando estava na oposição, denunciava o governo Fernando Henrique e aqueles a quem combatia, não por opções políticas equivocadas ou divergentes, mas por afirmar que eles eram desonestos.
Por que o tema da corrupção ganhou importância eleitoral?
O PT não só levantou esse tema de maneira mais intensa, como aparecia, até 2002, como um partido ético por excelência. E ele não se preocupou muito em manter essa imagem. No Brasil, há duas questões éticas muitos fortes: uma que é a ética da corrupção no exercício do poder de Estado; e outra que é a questão ética da miséria. A existência de milhões de pessoas que ainda não foram incluídas socialmente, apesar do esforço do governo petista, é um problema sério. Mas, ao invés de o PT bater na tecla de que seu projeto é intensamente ético, porque resgatou dezenas de milhões de pessoas da miséria, preferiu calar-se sobre a ética. Então, a única questão ética que surge hoje é sobre a corrupção. Se o PT tivesse batido na tecla de que faz um governo ético porque é antiético ter gente morrendo de fome no Brasil, ter pobre sem oportunidades, ele estaria melhor.
Foi uma falha de comunicação?
Considero uma falha de concepção, que repercutiu na comunicação. O PT certamente se preocupou mais em conseguir o voto das pessoas beneficiadas, o que é legítimo, mas não gerou um pensamento disso como sendo ético. O pensamento do PT, quando discute ética, ficou pobre. Ficou a impressão geral de que não há prática política sem sujar as mãos. Em vez desse discurso, poderia questionar: "Vocês não se escandalizam com o fenômeno da fome?". O jornal espanhol "El País" publicou um artigo sobre a busca do governo pelos chamados "brasileiros invisíveis". Pessoas extremamente difíceis de localizar, que muitas vezes não têm documentos, e que poderiam ser incluídas no Bolsa Família, mas que não têm acesso porque estão muito, muito invisíveis para o Estado. Isso é um empreendimento ético de primeira grandeza. E olha que "El País" é um jornal simpático ao tucanato, não gosta do PT. Quando li esse artigo, me perguntei: "Como é que o PT não usa esse tema na campanha?". O PT priorizou a inclusão pelo consumo, o que tem inúmeras vantagens. Uma dela sé a de que havia uma demanda reprimida de gente que queria comprar, e não podia. E esse consumo represado era de coisas essenciais, como comida, geladeira... Depois veio, por extensão, o consumo de itens menos essenciais — maquiagem, roupas melhores. Mas o PT não politizou essa inclusão pelo consumo e isso levou boa parte dos beneficiários a acreditar que eles não devem nada às políticas públicas. Uma parte até vai votar em outros candidatos porque não sente que deve ao PT esse acesso ao consumo — pensa que é graças ao esforço individual deles. Os beneficiários nem cogitam que, se a economia estivesse em recessão prolongada, eles ainda estariam na miséria.
Mas a que se deve essa falta de debate ideológico do PT?
Incluir pelo consumo é a linha de menor resistência, porque não se enfrenta o capital. Ao contrário, o capital é beneficiado. Tanto que a indústria e o comércio foram beneficiados pelo volume de negócios. O governo petista não adotou uma política de redistribuição de renda, não tirou de uns para dar a outros. Ele realizou uma política que beneficiou os mais pobres, sem lançar mão de algum elemento de redistribuição de renda — o que causaria muito mais conflito. Se o PT, que não prejudicou as classes altas e médias, enfrenta conflitos, imagine se tivesse causado algum prejuízo para essas classes...
O PT evitou um conflito com o conservadorismo das elites?
Há um conservadorismo embutido nesse conflito. Uma parte da classe média, mais do que da classe rica, fica escandalizada de ver os pobres tendo melhoria nas condições de vida. E, numa certa medida, a classe média tem alguma razão. A mão de obra mais simples não melhorou, está ruim. Então, quando se contrata hoje os serviços de um marceneiro, por exemplo, a classe média acaba pagando muito mais por um trabalho pouco profissional. Aí, essas pessoas culpam a conjuntura de pleno emprego por essa realidade, já que ela permite que o trabalhador negocie um valor alto pelo seu trabalho, sem eventualmente cumprir a parte dele. Se o governo do PT tivesse politizado essa inclusão social que realizou, dando mais força nos elementos da educação, talvez as coisas tivessem outro rumo.
Mas como o PT poderia ter politizado essa inclusão?
Sempre que se falasse sobre melhoria de renda, o partido lembraria que há uma chaga ética no Brasil que é a miséria, dizendo "Sociedade rica é sociedade sem pobreza". Esse tema é bom e deveria ser trabalhado para valer. E mostraria que há políticas públicas que reduzem a pobreza e tornam a vida melhor. Quando alguém se queixasse de que o Brasil é inferior aos EUA ou à Europa, o partido lembraria de que lá fora as coisas são melhores porque não há pobreza e, ao mesmo tempo, procuraria oferecer uma educação melhor. No Brasil há uma convicção muito forte do gozo, do prazer. É uma sociedade que reage muito pelo prazer. Quando as pessoas têm uma melhora de renda, logo pensam em como vão se divertir comesse excedente, pensam em consumir, por isso as vendas no crédito têm tanto importância no Brasil. A inserção pelo consumo cria uma mentalidade consumista que é uma mentalidade de direita, não de esquerda. O PT realizou uma série de políticas inclusivas que geraram uma mentalidade de direita.
Marina tem dito que pretende governar com os bons...
Quando Marina se refere aos bons, ela não se refere aos mais honestos, ela quer dizer os mais competentes. Ela considera que é um desperdício ter um Eduardo Suplicy, que só iria para o governo se o PT estiver no poder — e o PT jamais o chamou para exercer cargo executivo — ou ter um José Serra, que só iria para o governo no caso de vitória do PSDB. Isso não tem a ver com honestidade, ela quer os melhores em termos de competência.
Se o PT não prejudicou os mais ricos, de onde vem esse sentimento anti-PT tão forte?
Tem um ponto que é minimizado sobre a classe média que odeia a nova classe média, que está relacionado ao pagamento de impostos e à qualidade dos serviços públicos. As pessoas de classe média pagam uma série de impostos e se beneficiam muito pouco dos serviços públicos. Costumo dizer que a agenda democrática impõe exigências sobre quatro serviços públicos básicos: educação, saúde, segurança e transporte. E, tradicionalmente, esses quatro serviços são muito ruins no país. Eu defino classe média a partir do acesso a pelo menos dois desses serviços oferecidos pela iniciativa privada. Mas a tendência é: quanto maior a renda, maior é o acesso a esses quatros serviços privados. Ou seja, se você é de classe média, paga imposto e ainda paga por fora um plano de saúde; a escola particular para os filhos; compra um carro; e ainda tem despesas com o segurança da rua ou funcionários dos condomínios. E é claro que isso gera uma indignação muito grande na classe média. Some a isso a percepção de que o custo de vida na Europa e nos EUA ficou muito barato para os brasileiros, o que nunca foi. Quando fui à França pela primeira vez nos anos 70, qualquer coisa custava quatro vezes mais do que aqui. Hoje, muitos preços são iguais e, considerando a qualidade, são até mais baixos. Com R$ 100 em Paris, é possível comer bem melhor que em São Paulo. Com essa base real de insatisfação, logo vem a interpretação de fatos pela via mais fácil, e logo se conclui: "É porque o PT rouba que eu não consigo uma saúde e uma educação de qualidade". Ou seja, entra uma interpretação permeada pelo preconceito. As pessoas que denunciam a classe média só pela ideologia esquecem que, para Marx, a ideologia tem uma base real e um interesse. Curiosamente quem ataca a classe média, não ataca a classe rica. Há todo um discurso petista que ataca a classe média e poupa os que têm excedentes.
É possível o PT fazer as pazes coma classe média melhorando os serviços?
Não basta, porque o assunto está profundamente engessado. O Estado brasileiro, nos três níveis, dificilmente terá mais dinheiro para aplicar nos serviços públicos. As grandes políticas do PT — Bolsa Família, sistema de cotas, ProUni e Mais Médicos — são emergenciais. Eu apoio todos esses programas, mas defendo a definição de programas mais estruturantes, e para fazer isso é preciso mudar tudo.
O que aconteceu com toda a insatisfação coletiva das manifestações de 2013?
Elas surgiram de movimentos pequenos, mais de esquerda, que reivindicavam melhorias no transporte coletivo. Quando a coisa cresceu, ante o ataque violento da mídia de direita, e a reticência petista, a direita foi capaz de sequestrar o assunto. Então, as manifestações continuaram falando sobre transporte coletivo, havia muitos cartazes contra a Rede Globo que não apareciam na Globo, mas a direita conseguiu dizer que as manifestações eram contra a corrupção — e não eram. Eram, sobretudo, sobre transporte coletivo e, depois, sobre educação e saúde públicas, e contra o monopólio privado das comunicações. Mas a mídia conseguiu dar uma conotação fortemente antipetista ao movimento. O governo perdeu, não foi capaz de rebater e esse foi um ponto crucial. Nesses últimos 12 anos, o PT não fez a batalha pelos corações e mentes, perdeu a hegemonia política. Quando se elegeu em 2002, era o partido dos sonhos. Tinha convencido as pessoas de que, tirando o programa econômico dele — que muitos tinham medo que fosse maluco, e por isso Lula fez a Carta aos Brasileiros —, os valores do PT eram nacionais, e isso o partido jogou fora, não tomou o menor cuidado para preservar. Foi fazer acordos políticos, mas deixou de lutar no verbo... Em minha opinião, o PT falhou. Nunca fez um bom uso da internet, nunca trabalhou a construção de uma mídia alternativa de esquerda.
Por outro lado, a gente também percebe um declínio do PSDB...
Declínio? Cada voto que o PSDB conquista é um lucro. O partido ficou tão atrasado, que eu fico espantado como ainda tem tanta gente disposta a votar nele. O PSDB tem bons quadros. Se olharmos a equipe que o Aécio teria no governo, há quatro nomes de peso: Armínio Fraga, para a Fazenda; Antonio Anastasia, para a administração; Rubens Barbosa, Relações Exteriores; e Maria Helena de Castro, Educação. Não há quadros à altura nem na Rede, nem no PSB e nem mesmo no governo Dilma. Aliás, o problema do governo Dilma é que os ministros têm pouca autonomia. E o resultado disso é que o governo anda devagar. Feita a ressalva de que o PSDB tem uma equipe competente, e que de fato o partido está preocupado com a economia, as propostas dele para a sociedade estão totalmente defasadas. O Aécio defende o Bolsa Família, que está consolidado, mas ataca o Mais Médicos adotando o mesmo discurso das entidades representativas dos médicos. O Mais Médicos tem muitos problemas, mas é bem concebido. Como candidato, ele teria de apresentar uma alternativa melhor, mas não apresenta. O que ele propõe no lugar do Mais Médicos exigiria muito mais dinheiro. Em relação aos programas sociais, o PSDB é fraco. Quando eles falam de programa de governo, quase tudo é economia, o partido não pensa que a economia é caminho para outro fim. Sob esse ponto de vista, o PSDB não tem mais condição de disputar a hegemonia política do Brasil.
Se Dilma vencer, é fácil imaginar o dilema que o PT vai enfrentar em 2018. Já temo movimento "Volta Lula"...
Lula pode até ganhar a eleição de 2018, mas depende muito do desgaste que vai haver nos próximos quatro anos. Se o PT for eleito agora, provavelmente vai enfrentar o mandato mais difícil de sua trajetória no governo. O PSDB vai estar de fato punido, porque perder quatro eleições seguidas é uma humilhação. Mas pode rearticular-se, com gente que apoiou Marina. O PSB, sem Eduardo Campos, não é nada. Não dá para imaginar o rumo do partido. Se Marina se projetar como finalista no segundo turno e perder, existe uma tendência natural de parte do PSDB migrar para ela, que vai decidir quem lhe interessa. Ela não tem obrigação nenhuma de receber a todos. Talvez a melhor coisa de um governo Marina é que ela seria mais rigorosa com a política do que Lula e Dilma. Independentemente de qualquer coisa, se o PT, ao invés de investir em novos líderes, decidir pela volta de seu grande líder histórico, vai passar a mensagem de que foi incapaz de se renovar. Tudo que conseguiriam em sua história é eleger Lula duas vezes e, depois, uma presidente que ele sacou do bolso do colete. O PT não dispõe hoje de um nome para a Presidência em 2018. Como possibilidades, vejo Fernando Pimentel, caso vença em Minas, e Fernando Haddad, caso sobreviva à Prefeitura de São Paulo. Além deles, não há ninguém. O PT vai ter de se arriscar, buscar novos nomes.
A eleição seria mais fácil se, hoje, Lula fosse o candidato?
Seria diferente. Primeiro, porque o Eduardo Campos nem teria sido candidato. Segundo, porque teria mais popularidade que Dilma. O que eu não sei, em termos de governabilidade, é se o Lula seria melhor depois dela. Ele tem capacidade política incrivelmente maior que Dilma — o que seria uma coisa boa — mas me pergunto se não precisamos de uma renovação de projeto político. Sinto falta disso. Quem ganhar a eleição este ano vai ter dupla jornada de trabalho. As propostas da Marina têm um problema de falta de consistência; as do PSDB estão bastante superadas em termos de finalidade; e, as do PT, envelhecidas. Mas não superadas — a pauta da inclusão social continua pertinente.
Como o sr. vê a proposta da política de participação social?
A democracia representativa não basta. Você tem duas críticas a ela, no decreto da presidente Dilma que criou os conselhos de participação, e outra nesse conceito da Marina de nova política. As duas estão incompletas, com diversas incongruências. Mas o ponto importante é que precisamos ter mais pessoas atuando na coisa pública. Outro aspecto é a forma como a Marina pensa em usar a internet como ferramenta para isso. Era o sonho de Fernando Henrique, que o PSDB não conseguiu entender. Ela é quem mais conseguiu desenvolver isso. Mas quando se pega o começo do projeto da Marina, quando ela fala em participação maior e no conceito de rede e, depois, passa para as propostas concretas, uma não tem nada a ver com a outra.
Há um descolamento hoje das ideias de Fernando Henrique Cardoso com as do PSDB?
É um problema sério. O PSDB não está à altura do único presidente que deu ao Brasil. Fernando Henrique é muito melhor que o partido. É normal que um líder não seja superado por seu grupo, mas a distância é muito grande. Em 2010, quando a campanha do José Serra usou a questão do aborto, Fernando Henrique discordou. Mas, se a ex-primeira-dama Ruth Cardoso ainda estivesse viva, eles veriam o que é bom pra tosse... Aécio propõe políticas de combate às drogas e de endurecimento com os países vizinhos. Ele precisa de um discurso mais moderno. A descriminalização faz parte de uma nova agenda mundial, mas ainda difusa em alguns partidos brasileiros. Existe o que eu chamo de agenda da vida discutida por pessoas que defendem a liberdade e a maior emancipação possível. Gente que luta pela igualdade de direitos entre os gêneros, visceralmente contrária a qualquer preconceito racial. É uma preocupação presente no mundo todo. Querem mais liberdade e acham a repressão às drogas, principalmente a maconha, algo estúpido do começo ao fim. Quem estaria melhor em relação a isso seria o Eduardo Jorge.
Num exercício de imaginação, o que será de Dilma, Marina e Aécio, caso percam a eleição?
Se Dilma perder, é muito improvável que ela se reapresente em 2018. O próximo mandato será difícil para qualquer um deles. Aécio já prometeu medidas impopulares e Marina terá de formar uma equipe. Se Aécio perder e o candidato do PSDB ao governo mineiro também, vai ter dificuldades sérias para se reerguer. Pode haver uma migração grande de tucanos para o PSB e a Rede, que não devem aceitar todo mundo, pois não terão qualquer interesse em aceitar peso morto. É um cenário de tensa e difícil renovação política. Caso o PT ganhe agora, quem quiser tirá-lo da presidência em 2018 deve apostar em Marina. Ela terá tempo de fazer um programa melhor e absorver quadros. Aconteceu com ela uma coisa curiosa. Marina era total minoria dentro do PSB, mas não havia outro nome. Eles não endossam posições dela, e vice-versa. E o PSB agora não existe mais. Não tem nenhum outro nome presidenciável. Por outro lado, alguns dos nomes mais abertos entre os tucanos já foram para Marina — Walter Feldman, Guilherme Leal e André Lara Resende. Eles perceberam que não havia mais nenhuma perspectiva dentro do PSDB. O PT continua sendo o melhor para prosseguir na inclusão social. Mas Dilma, mesmo ganhando, sai enfraquecida e com desafios grandes. O estilo autoritário dela, por exemplo, não trouxe bons resultados. Marina teria tempo de se reconstruir, e o PSDB, de buscar um novo destino. O Alckmin não pode entrar na Rede pela porta dos fundos. Por outro lado, ele vai apoiar Marina? Ela não gosta da política dele. Marina teve de recuar no apoio a Suplicy, para ficar ao lado do Serra, mas você vê que não era o sonho dela.
Se eleita, quais seriamos desafios de Dilma?
Acho que o modelo emergencial de inclusão social está se esgotando. Por isso, será necessário algo mais consistente. O PT perdeu a batalha da opinião pública e não dá sinais de ter um projeto para mudar isso. A forma de Dilma governar, com pouca autonomia aos ministros e poucos deles inspiradores, enfraquece. O Lula tinha Gilberto Gil, Tarso Genro, Antonio Palocci e José Dirceu. Eram ministros com fôlego, peso. Quem a Dilma tem? O Celso Amorim, que foi importante no governo passado, é alguém de quem mal ouvimos falar na Defesa. Ela conseguiu ter um ministério fraco, e, por isso, só ela aparece. E os ministros têm medo de falar com ela, dar notícias ruins e tomar decisões independentes. Dilma não foi uma escolha política, no sentido de ser uma líder no PT. A decisão foi gerencial e ideológica. Era o nome mais próximo do mundo empresarial. Na Casa Civil, ela sempre teve essa coisa de lidar como capital, de querer aumentar a produção. É profundamente irônico que ela tenha se indisposto tanto com os empresários. Só não houve a indicação do Palocci porque ele saiu queimado do governo. Ela também não é uma pessoa que representa ideais populares. Enquanto Lula aparece como legítimo representante do povo, Dilma se empenha em ser uma pessoa disposta a servir ao povo.
E a reforma Política?
É preciso determinar claramente o que é a reforma política. Eu tenho certa simpatia por uma proposta radical, que acaba totalmente com o financiamento de campanha, com a campanha toda feita pela internet, e ponto final. Para a próxima eleição presidencial, o acesso à rede será praticamente universal. Com o coração apertado, prefiro o voto proporcional. Porque o distrital é muito fácil de ser manipulado nas circunscrições. E aí você pode controlar tudo, mesmo tendo minoria. Sobre a lista fechada, tenho sérias dúvidas. Favorece demais a burocracia partidária, o que não é bom. A proposta da Marina é a pior de todas: trata todas as candidaturas como avulsas. Desagrega por completo os partidos. A maioria das propostas piora, como a coincidência de todas as eleições. Se no formato atual já existe uma dificuldade para os eleitores decidirem para cargos menos vistosos, imagine se juntarmos mais disputas simultâneas. É uma loucura. Acho o fim da reeleição uma medida equivocada. Quatro anos com possibilidade de uma reeleição dá um tempo bom para se tocar um projeto.
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