• Ritmo de crescimento da dívida foi quase três vezes maior do que o verificado em 2014; Tesouro diz que a dívida só vai começar a melhorar daqui a três anos
Lorenna Rodrigues, Adriana Fernandes, Bernardo Caram e Rachel Gamarski - O Estado de S. Paulo
Na esteira da alta de juros e da inflação, a dívida do governo federal aumentou R$ 497 bilhões e atingiu R$ 2,79 trilhões em 2015. A expansão do endividamento do governo, que inclui a dívida em títulos do Tesouro Nacional vendidos no mercado doméstico e internacional, chegou a 21,65% - o maior valor da série iniciada em 2006.
O resultado do ano passado revelou uma forte deterioração e uma reversão, em um único ano, do processo de melhoria dos principais indicadores da dívida que vinha ocorrendo desde 2003, no primeiro ano do governo Lula. Para agravar o cenário, o Tesouro avisou que a dívida só vai começar a melhorar daqui a três anos.
O ritmo de crescimento da dívida foi quase três vezes maior que o verificado em 2014. O resultado negativo do ano passado foi puxado pelo aumento de R$ 367,67 bilhões nas despesas com juros, que provocou o aumento do estoque. Para 2016, o Tesouro previu que a dívida pode aumentar R$ 507 bilhões e chegar a R$ 3,3 bilhões.
A piora acelerada da dívida já havia sido captada pelas agências internacionais de classificação de risco - Standard & Poor’s e Fitch - que retiraram o grau de investimento do Brasil no passado.
As dificuldades já esperadas também para 2016 devem agora alimentar o risco de novos rebaixamentos e a piora da percepção dos investidores sobre a economia brasileira. Os indicadores de capacidade de pagamento da dívida, como tipo de correção dos papéis e prazo de vencimento, são os mais observados pelas agências na hora de avaliar a nota de um País. O governo precisa melhorar a confiança para garantir investimentos e a retomada do crescimento.
O presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), Júlio Miragaya, avaliou que o crescimento da dívida em 2015 a torna "explosiva". Para ele, com o atual nível do custo de financiamento, em cerca de 8,5% do Produto Interno Bruto (PIB), a discussão sobre a entrega de um superávit primário de 0,5% do PIB "se torna secundária". "Com um custo da dívida desta ordem, você abate uma parcela pequena com o superávit. Se o custo fosse mais perto de 4% ou 5% do PIB, o impacto do esforço fiscal poderia ser muito maior", afirmou.
Em 2015, três das seis metas fixadas para os principais indicadores da dívida não foram cumpridas: parcela de títulos atrelados à taxa Selic, inflação e prefixados (papéis que têm taxa fixada na hora da venda). Com o descumprimento, ficou comprometida a estratégia do governo de reduzir os títulos com correção pela Selic, que têm taxa flutuante a depender da decisão do Banco Central e trazem maior risco de financiamento, e aumentar os papéis atrelados ao IPCA e os prefixados.
O maior desvio ocorreu com os títulos vinculados a Selic, as LFTs. A parcela desses papéis fechou ano passado em 22,8% do total da dívida, acima da meta que previa um intervalo de 17% e 22%. Para 2016, o Plano Anual de Financiamento (PAF), que contém a estratégia de gestão da dívida, prevê um aumento ainda maior destes papéis, que podem chegar a 34%. Um valor bem longe do patamar de 15% considerado confortável para a gestão da dívida.
“Não nos incomoda o fato de estarmos avançando na ampliação das LFTs”, minimizou o secretário interino do Tesouro Nacional, Otavio Ladeira de Medeiros. No passado, o Tesouro chegou a ter como meta reduzir a zero a parcela vinculada à Selic. Ele rebateu a avaliação de que o aumento desses papéis diminui a potência da política monetária do BC. Segundo ele, em momento de alta de juros, os LFTs são um instrumento de redução de custo.
Mesmo com redução de prefixados e aumento de títulos indexados à Selic, o secretário disse que a composição da dívida ainda está melhor do que o período de 2003 a 2011 e que houve agora um “pequeno recuo "em um período complexo". "Não vejo retrocesso no conjunto da dívida", completou.
Ele citou o fato de a dívida de curto prazo, a vencer em 12 meses, continuará em queda, devendo ficar abaixo de 20% em 2016.
Ele informou que o chamado “colchão de liquidez”, que são os recursos que o Tesouro tem em caixa para pagar os títulos que estão vencendo, soma hoje cerca de R$ 250 bilhões, montante suficiente para honrar os compromissos da dívida nos próximos seis meses. Com esse colchão, o Tesouro pode ficar sem vender títulos em momentos de turbulência no mercado.
Na mensagem em texto do apresentação do PAF, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, fez uma defesa do ajuste fiscal. O ministro reafirmou o compromisso com solidez fiscal permanente para a retomada do crescimento econômico sustentável, guiada pelo retorno do investimento e da produtividade.
“Por meio de resultados fiscais perenes, devolveremos aos agentes econômicos a previsibilidade e a confiança necessárias para o retorno dos investimentos privados, vetor principal de dinamização da economia brasileira", escreveu Barbosa. (Colaborou Mário Braga)
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