- Folha de S. Paulo
Principal grupo a defender eleições diretas deseja só a volta de Lula
Vivíamos, até quarta passada, os primeiros passos de saída da crise. Inflação sob controle, tímida retomada da atividade econômica e queda do desemprego. O motivo era simples: a confiança de que as importantes reformas em votação no Congresso –trabalhista e previdenciária– seriam aprovadas.
O Brasil entrava nos eixos.
O vazamento da delação de Joesley Batista pareceu programado para sabotar esse futuro. Deu certo. Fica a pergunta: por que às vésperas de importantes votações, e não na sequência? Por que a distorção sensacionalista sobre o real teor do áudio de Temer? Seja qual for o motivo, está claro que a decisão foi política.
O futuro de Temer está nas mãos do TSE, que julgará a cassação da chapa Dilma-Temer a partir de 6 de junho. Os possíveis crimes descobertos agora e a capacidade do presidente de seguir governando não têm rigorosamente nada a ver com as ilegalidades de sua chapa em 2014, mas na prática um determinará o outro.
Há motivos juridicamente plausíveis para cassar e para não cassar. Os ministros irão escolher qual desfecho preferem e vão justificá-lo com os argumentos apropriados. Por trás da suposta objetividade do Direito, novamente a decisão política.
Saindo Temer, temos finalmente uma regra clara, que foge à decisão política: eleições indiretas de novo presidente pelo Congresso.
Infelizmente, nem todos aceitam as regras do jogo.
O principal grupo a defender eleições diretas deseja única e exclusivamente, sob o pretexto da soberania popular, a volta de Lula. Essa é a grande chance de o ex-presidente escapar da Justiça e se sentar novamente ao trono, para o que promete ser um governo sem trégua para opositores e para a mídia.
A eleição de Lula é, na minha opinião, uma das piores coisas que podem nos acontecer. E, mesmo assim, ela não deveria ter nada a ver com a discussão sobre as eleições diretas. Uma regra é boa ou má independentemente de ajudar ou atrapalhar o "cara que eu apoio".
Às vezes, regras boas levam a resultados que julgamos ruins. É parte da democracia, assim como aceitar essas regras mesmo nestes casos, sabendo que, no longo prazo, estaremos todos vivendo em uma sociedade melhor.
A lei atual é bastante razoável: como o presidente eleito em 2017 terá mandato tampão, governando não mais do que um ano e meio, não tem sentido mobilizar os esforços do voto popular, que já está programado para ocorrer logo mais.
Mudar a regra (ou o entendimento da regra, o que dá no mesmo) agora é submeter o que parecia sólido ao vale-tudo da decisão política –com alguma gambiarra jurídica para justificar a decisão, claro–, desmontando as bases da estabilidade que é condição necessária para nosso desenvolvimento de longo prazo.
Adoraria ver o governo Temer seguir adiante e aprovar as reformas necessárias. Mas não posso abrir exceções: ele tem que ser investigado até o fim e, se as provas forem conclusivas, cair. Quem abre exceção para o próprio lado pode ter certeza que a mesma exceção será utilizada no futuro pelo lado contrário, e aí não há mais lei; só política.
Uma boa sociedade depende de um bom sistema político. E um bom sistema político depende de regras claras e previsíveis; regras, em suma, que restrinjam o alcance da política. Por isso, se Temer cair, é Indiretas Já.
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