Supremo expõe crise e pressão sobre Cármen
Decisão de Cármen Lúcia de não discutir assunto em plenário e reunião frustrada expõem divisão na Corte
Breno Pires Amanda Pupo / O Estado de S. Paulo.
BRASÍLIA | A decisão da presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, de não colocar a prisão após condenação em segunda instância em discussão em plenário e a dificuldade para realizar reunião entre os ministros para debater o tema, inicialmente marcada para ontem, expuseram o impasse dentro da Corte. O Supremo já decidiu, por 6 votos a 5, pelo cumprimento de pena após condenação em segundo grau, mas o assunto voltou a dividir os ministros com a possibilidade de prisão do ex-presidente Lula, condenado a 12 anos e 1 mês. Ontem, o decano, Celso de Mello, afirmou que faltou pouco para que algum ministro apresentasse, em sessão na semana passada, uma questão de ordem que poderia levar a novo julgamento das ações que tratam do tema, mesmo sem a iniciativa da presidente. A decisão inédita, segundo ele, seria um “constrangimento”. “Nunca aconteceu na história do Supremo”, disse.
A possibilidade de prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a decisão da presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, de não pautar novamente julgamento sobre o cumprimento de pena após condenação em segunda instância agravaram a crise entre os ministros da Corte. Uma reunião que seria realizada ontem para tratar do assunto acabou não ocorrendo, o que provocou reação do decano do STF, Celso de Mello, e deixou claro o impasse que divide os 11 ministros.
O decano afirmou que faltou pouco para que algum ministro apresentasse, durante a sessão da quinta-feira passada, uma questão de ordem que poderia levar ao novo julgamento das ações que tratam do tema mesmo sem Cármen Lúcia pautá-las.
Como o encontro não ocorreu, há a possibilidade de o tema voltar hoje ao plenário do STF. “A questão de ordem seria para que ela (Cármen Lúcia) designasse dia para o julgamento”, disse o ministro Marco Aurélio Mello, que é relator de duas ações e já liberou os processos para julgamento. “Precisamos sair desse impasse. Esse impasse não atende aos interesses institucionais. Não se tem almejado segurança quando os próprios integrantes do Supremo divergem em decisões. Isso gera uma perplexidade muito grande.”
A proposta de uma reunião entre os ministros, segundo Celso de Mello, tinha por objetivo evitar que se chegasse a esse ponto, o que ele classificou como “constrangimento”. “Nunca aconteceu na história do Supremo. Ao menos nos quase 29 anos que estou aqui”, disse o decano.
Em 2016, o Supremo já havia decidido, por 6 votos a 5, que o cumprimento de pena poderia ocorrer após condenação em segunda instância. Petistas e advogados afirmam que a prisão só pode ocorrer após o trânsito em julgado no STF. O tema voltou a pressionar a Corte com a possibilidade de prisão de Lula, mas Cármen Lúcia, a quem cabe definir a pauta, já reafirmou que não colocará em discussão. A resistência aumentou a tensão entre os ministros.
“Foi para evitar que a presidente sofresse uma cobrança inédita na história do Supremo, que eu ponderei aos colegas que seria importante uma discussão interna”, afirmou Celso de Mello, destacando que apresentou a ideia da reunião a Cármen Lúcia na quarta-feira passada, em conversa da qual também participou o ministro Luiz Fux. “Quem deveria fazer o convite é a presidente. Ficou combinado que ela, que aceitou a sugestão desse encontro informal, faria esse convite. Ontem (anteontem) e hoje (ontem) não houve”, disse o decano ao ser questionado sobre o cancelamento da reunião.
Segundo a assessoria de Cármen Lúcia, ela concordou em participar da reunião, mas não entendeu que deveria convidar os pares. Ministros disseram ao Estado não terem sido chamados.
“Precisamos sair desse impasse. Esse impasse não atende aos interesses institucionais. Não se tem almejado segurança quando os próprios integrantes do STF divergem em decisões. Isso gera perplexidade.” Marco Aurélio Mello
MINISTRO DO SUPREMO
Advogados. Ontem, representantes de institutos de advocacia estiveram nos gabinetes dos ministros Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Marco Aurélio Mello para defender a necessidade de julgamento definitivo das ações. As entidades foram ao Supremo a convite do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, autor de uma das duas ações que tratam do tema. “Virou uma loteria. Quem entra com habeas corpus fica dependendo de quem vai relatar o pedido”, afirmou Fábio Tofic, do Instituto de Defesa do Direito de Defesa.
Também ontem, o ministro Edson Fachin negou recurso apresentado pelo Instituto Ibero Americano de Direito Público contra a decisão do plenário sobre o assunto. Com isso, esses recursos não devem motivar uma rediscussão.
Colaboraram Teo Cury e Ricardo Galhardo
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