A Operação Lava Jato completou quatro anos no dia 17 passado com números expressivos. Foram ao todo, até agora, 49 fases, com um total de 188 pessoas condenadas por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro em primeira e segunda instâncias – somente os casos encaminhados ao Supremo Tribunal Federal lamentavelmente ainda não tiveram desfecho. Os acordos de colaboração e leniência devem resultar na devolução de R$ 12 bilhões aos cofres públicos, segundo esperam as autoridades envolvidas. Já foi restituído R$ 1,9 bilhão.
Diante desses dados se pode afirmar que a Lava Jato já se inscreveu na história nacional como um lampejo de esperança num país tão habituado à impunidade. Criminosos de colarinho branco decerto estão hoje muito mais preocupados. No entanto, é o caso de questionar se a Lava Jato, no seu quarto aniversário, ainda se justifica, visto que seu objeto específico de investigação – o esquema de corrupção na Petrobrás – parece estar quase inteiramente esclarecido.
O problema é que a Lava Jato há muito tempo não se concentra apenas na Petrobrás, nem mesmo em alguma outra estatal em particular. Seu objeto de investigação, na prática, não é mais um caso de corrupção, mas a corrupção em si mesma. E não qualquer corrupção, mas a corrupção no mundo político.
Assim, qualquer fiapo de suspeita que corrobore a presunção de que os políticos em geral são corruptos é desde logo levado a sério pela Lava Jato, transformando-se quase sempre em rumorosas ações da Polícia Federal e do Ministério Público, costumeiramente acompanhadas de vazamentos de depoimentos à imprensa.
Num cenário como esse, os políticos que tiverem o seu nome soprado por algum delator e divulgado nas manchetes dificilmente conseguirá recuperar sua imagem, ainda que venha a ser inocentado. Estará inscrito no rol genérico dos corruptos, administrado pela Lava Jato.
Desse modo, a Lava Jato caminha para ser uma operação sem fim – de caráter moral, e não judicial – pela simples razão de que dificilmente a corrupção na política um dia deixará de existir. Sem se dedicar a um caso em particular, mas sim à tarefa de sanear a política nacional, a Lava Jato tende a se colocar acima do bem e do mal, situação em que qualquer movimento que desagrade a seus líderes é desde logo confundido como ameaça à sua existência.
Não surpreende, desse modo, que o discurso de alguns dos responsáveis pela Lava Jato seja claramente político, pois trata como opositores os que apontam seus exageros. Foi assim, por exemplo, quando procuradores apresentaram um pacote de medidas anticorrupção e o Congresso, dentro de suas prerrogativas, fez as modificações que julgou pertinentes. Não é o caso de discutir aqui se essas mudanças foram corretas ou não, embora o pacote de medidas contivesse gritantes violações de princípios constitucionais, que tinham de ser mesmo evitadas.
Importa salientar que essas mudanças foram feitas por representantes do povo, submetidos ao escrutínio do eleitor, o que, definitivamente, não é o caso dos procuradores da Lava Jato. Esses procuradores, contudo, queixaram-se de que o projeto havia sido “desfigurado” justamente por aqueles que supostamente seriam os mais atingidos pelas medidas, isto é, os parlamentares.
No balanço do quarto ano da Lava Jato, o procurador da República Deltan Dallagnol manteve esse tom político. Disse que “a punição não pode acontecer de modo episódico num caso específico, mas de modo geral” e, para ele, “se queremos mudar, precisamos atacar a corrupção, mudando o sistema de Justiça que privilegia a impunidade”. Como se candidato fosse, defendeu “atacar em várias frentes”, promovendo “reforma no sistema político, melhora no sistema de licitações, transparência e participação da sociedade no controle das contas públicas”. É tudo o que se presume que o eleitor queira, mas, numa democracia, isso só se confirma no voto, por meio da política tradicional – aquela que alguns açodados militantes da Lava Jato parecem dispostos a destruir.
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