Com seu estilo populista-autoritário, diante de tão grave situação econômica, sanitária, social e racial, Trump não refrescou, não buscou unir o país, ao contrário, jogou lenha na fogueira do dissenso, da discórdia e da polarização.
Desde a sua independência em 1783 e da Constituição americana de 1789, os EUA, ao lado da Inglaterra e França, são os grandes esteios da democracia moderna. Um abalo na dinâmica e nas instituições democráticas americanas em pleno século XXI seria um péssimo exemplo e estímulo para outros líderes populistas autoritários confrontarem os valores permanentes da liberdade e da democracia.
Nunca se gastou tanta tinta e papel para discutir a crise da democracia representativa contemporânea. Donald Trump foi disruptivo em relação ao que Steven Levistsky e Daniel Ziblatt em seu "Como as Democracias Morrem" (Zahar) chamam de princípios não escritos: o reconhecimento público da legitimidade do opositor e a autocontenção no uso do poder. Para TRUMP a desqualificação deselegante e agressiva dos oponentes e a falta de limites no uso do poder são traços permanentes.
E agora, diante de uma possível derrota, em precedente inédito e
perigoso, preventivamente inocula uma interrogação sobre a legitimidade do
resultado e as fraudes na futura eleição, insinuando que poderá questionar os
resultados apostando em grave impasse. As
instituições americanas serão testadas.
Creio que este será o maior impacto no Brasil da eleição americana, até
pelos laços próximos erguidos entre Trump e Bolsonaro: o fortalecimento ou o
enfraquecimento da ideia de democracia.
No plano dos direitos humanos e das políticas ambientais também uma vitória de Biden impactará fortemente as relações Brasil/EUA. Biden, como vice-presidente de Obama, entregou à época farta documentação ao Brasil sobre o período do regime ditatorial e a prática da tortura e provavelmente valorizará o tema dos direitos humanos. No plano ambiental, o Brasil terá que mostrar serviço no compromisso com a sustentabilidade para poder exigir o apoio internacional a que faz jus.
Nas negociações econômicas, será necessário retomar o velho e bom pragmatismo brasileiro. Incluindo aí a licitação do 5G nas telecomunicações e a negociação das barreiras comerciais que obstruem o comércio externo bilateral.
Apesar da amizade dos presidentes Trump e Bolsonaro, o comércio entre os dois
países deve ser 25% menor em 2020 em relação ao ano anterior. Ou seja, “amigos,
amigos, negócios à parte”.
A eleição de Biden parece provável, mas não é certa. Se ocorrer, o governo brasileiro vai ter que realinhar sua postura.
*Marcus
Pestana, ex-deputado federal (PSDB-MG)
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