sábado, 11 de dezembro de 2021

Claudio Ferraz - A influência corporativa na política acabou?

O Globo

Acabar com as doações de empresas mantendo aberto o canal do ‘lobby’ não resolve o problema original da influência econômica

A Operação Lava-Jato trouxe à tona, entre 2014 e 2015, algo de que todo mundo desconfiava: o papel da corrupção no financiamento de campanhas políticas no Brasil. O ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, em depoimento à Procuradoria-Geral da República, confirmou a existência de um esquema onde empresários “ajudavam” políticos a ganhar eleições e, como contrapartida, políticos “ajudavam” os empresários repassando obras. Para que isso funcionasse, as licitações eram superfaturadas.

As maiores empreiteiras do país formaram um cartel e desenvolveram um complexo sistema de transferência de recursos desviados de grandes obras públicas como bem detalhado no livro “A Organização” da jornalista Malu Gaspar (colunista do GLOBO).

O resultado prático dessa grande operação, além de diversas prisões de empresários e políticos, e sua contribuição para a eleição de Jair Bolsonaro, foi a proibição da doação de empresas a campanhas políticas. Muitos analistas, cientistas políticos e juristas acreditavam que, com essa decisão, iríamos acabar com a corrupção no Brasil.

O argumento que eu escutava na época era que os políticos eleitos não trocariam mais favores com empresas do setor privado, já que essas empresas não poderiam “pagar” esses favores com contribuições de companha.

Mas essa visão estava totalmente equivocada. Os políticos conseguiram um grande fundo de financiamento público para suas campanhas e, com isso, a liberdade que precisavam para não depender de doações privadas.

No entanto, em vez de liberar políticos para tomarem decisões independentes e melhorar a governança, o que observamos no Brasil foi o contrário. Ao tornar opaca a relação dos políticos com seus doadores, o lobby passou a atuar de forma ainda mais efetiva em Brasília.

Se era ruim ter grandes empresas e bancos financiando políticos, pior ainda é a influência que acontece sem nenhum tipo de transparência, via lobistas. Empresas privadas influenciando projetos de lei, contratos do governo e o monitoramento e regulação de diversas atividades econômicas se tornaram rotina nas páginas dos principais jornais.

E, sem dados de contribuições de campanha e de registros oficiais de lobistas e suas atividades, fica muito difícil saber que empresas influenciam quais políticos.

É claro que a influência privada de empresas nas políticas públicas não é um problema único do Brasil. Como os outros países lidam com isso?

Nos Estados Unidos, o lobby é legalizado, e o Lobbying Disclosure Act, de 1995, e uma nova lei, de 2007, permitem saber quem são os lobistas e onde eles trabalham. Além disso, a informação sobre os clientes de firmas de lobby é pública e permite também mensurar as portas giratórias entre o setor público e privado.

No Canadá, o registro de lobby foi passado em 1989, com uma nova lei de 2008 que prevê punições drásticas para atividades ilegais. As informações permitem relacionar lobistas com servidores públicos contatados por eles.

Na Comunidade Europeia há mais variação entre as leis existentes. Em países como a Áustria e a França, a atividade de lobby é regulada, mas o registro de lobistas é voluntário e menos sistemático do que a informação que existe nos EUA.

Está na hora de o Brasil discutir de forma séria a possível legalização da atividade de lobby. A influência de fabricantes de armas, produtores de agrotóxicos, grande empresas de tecnologia, donos de universidades privadas, entre outras, é desproporcional.

Mas, em vez de acontecer de forma transparente, com contribuições de campanha, ela se dá nas sombras de Brasília.

Acabar com as doações de empresas para políticos mantendo aberto o canal de influência obscura do lobby não resolve o problema original de influência econômica e só beneficia os políticos que estão no Congresso representando interesses privados.

 

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