terça-feira, 25 de outubro de 2022

Andrea Jubé - ‘Nervos de aço’ é a música da eleição

Valor Econômico

Jefferson tem histórico de reagir ao sentir-se traído

O ex-deputado Roberto Jefferson entrará para a história como o homem-bomba de dois governos. Nunca o adjetivo “explosivo” foi tão adequado para qualificar um político, que no auge de seus arroubos, lançou granadas e atirou com um fuzil contra agentes da Polícia Federal.

Quando exercia mandato de deputado federal pelo PTB e ganhou os holofotes como delator do mensalão em 2005, Jefferson aparecia na crônica política como um líder influente e folclórico.

Cassado pelos colegas da Câmara e condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a sete anos de prisão, o líder petebista apregoava que se tornaria cantor, enquanto ensaiava árias de ópera em casa.

Em uma das cenas mais lembradas da CPI dos Correios, o deputado Roberto Jefferson apareceu para depor com o olho roxo. No depoimento, alegou que a estante de discos despencou sobre o seu rosto, enquanto ele procurava uma coleção de LPs de Lupicínio Rodrigues. Questionado sobre qual música queria ouvir, ele soltou uma gargalhada e citou “Nervos de aço”. A zombaria fez tanto sucesso no meio político, que ele cantou a faixa no “Programa do Jô”.

Como se sabe, a música é uma espécie de hino dos amantes traídos. Ou dos “aliados” traídos, no caso em tela. Em 2005, Jefferson sentia-se abandonado pelo governo petista, que o teria atirado aos leões diante das denúncias reveladas pela imprensa de um esquema de desvios nos Correios. Em represália, ele se tornou o delator do mensalão.

Os versos da canção de Lupicínio são sugestivos: “Você sabe o que é ter um amor, meu senhor (...) e depois encontrar esse amor nos braços de um outro qualquer”. Os mais conhecidos falam de insensibilidade: “Há pessoas de nervos de aço, sem sangue nas veias e sem coração”.

Passados 17 anos, o personagem burlesco deu lugar ao líder bolsonarista, armamentista e autor de reiterados ataques às instituições democráticas. Novamente, a clássica “Nervos de aço” não poderia ser mais atual. Jefferson ressurge como homem-bomba, agora do governo Bolsonaro, sentindo-se traído após ser chamado de “bandido” pelo presidente.

A cinco dias da eleição, a cúpula da campanha do presidente Jair Bolsonaro monitora com apreensão os desdobramentos do grave episódio de domingo protagonizado pelo aliado. O ocorrido colocou em lados opostos duas vertentes do bolsonarismo: as forças de segurança pública e a ala ideológica marcada pelo radicalismo.

A situação era tão delicada que o ministro da Justiça, Anderson Torres, foi designado pelo presidente para acompanhar de perto a crise e assegurar a rendição de Jefferson. A participação do ministro teria sido uma exigência do ex-deputado.

Jefferson acabou indiciado pela Polícia Federal por quatro tentativas de homicídio, tendo como vítimas dois agentes feridos com estilhaços de granada e outros dois que estavam na viatura, mas não chegaram a ser atingidos. Diante da gravidade do fato, às vésperas da votação, Bolsonaro foi a público condenar a atitude de Jefferson, chamou-o de “bandido”, “criminoso”, empenhou-se em se descolar do aliado, e afirmou que ele “perdeu a razão”. O passado recente atesta que Roberto Jefferson não se comporta bem quando abandonado pelos aliados. Os próximos dias testarão sua lealdade ao bolsonarismo.

'Photochart'

A música de Lupicínio poderia ser a trilha sonora da reta final da campanha. Serão necessários nervos de aço para percorrer os cinco dias que faltam para a eleição. Embora o Ipec divulgado nesta segunda-feira tenha indicado uma vantagem de sete pontos percentuais, nos votos totais, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre o presidente Bolsonaro, há apreensão de um lado, e torcida do outro, de que esse resultado ainda se estreite até o dia 30. Isso porque Bolsonaro teve um crescimento repentino às vésperas do primeiro turno.

Há quem afirme que a disputa é tão acirrada, que será preciso o “photo finish”, usado nas provas de atletismo. Ou o “photochart” das corridas de cavalo. São tecnologias em que duas câmeras filmam a linha de chegada, para que depois um computador diga com precisão quem ganhou a prova.

As duas campanhas ainda têm grandes obstáculos pela frente. No time petista, a apreensão é com o volume de “fake news”, de toda natureza. Além daquelas já conhecidas, no campo dos costumes, de que Lula fecharia igrejas ou implantaria banheiros unissex, surgiram boatos de que ele vai acabar com o Pix ou com o Sistema Único de Saúde (SUS).

Do lado bolsonarista, aliados monitoram com preocupação os desdobramentos do episódio protagonizado por Roberto Jefferson, que ainda não foi captado pelas pesquisas divulgadas ontem. Há o receio de que o ato de violência extrema do ex-deputado assuste os indecisos, para cujo público Bolsonaro tem se esforçado em mostrar-se moderado. Outro problema é que o fato gerou ruído entre os seguidores mais fieis do presidente, que sentem que o aliado foi rifado.

Fontes da campanha petista lembram que nas recentes eleições presidenciais na América Latina onde a esquerda saiu vencedora, o placar favorável foi alcançado por margem estreita de votos. Os dois exemplos mais notórios são Colômbia e Peru. Em junho, o ex-prefeito de Bogotá Gustavo Petro foi eleito presidente da Colômbia, no segundo turno, com 50,4% dos votos em uma eleição histórica, porque a esquerda sempre era derrotada naquele país. O adversário Rodolfo Hernández terminou com 47,3% - uma diferença de apenas 3,1 pontos percentuais.

Em junho do ano passado, o candidato da esquerda Pedro Castillo foi eleito presidente do Peru com 50,12% dos votos válidos, contra 49,87% de Keiko Fujimori - uma diferença de somente 0,25%, ou 44 mil votos. Como ela alegou fraude nas eleições, as autoridades eleitorais do país demoraram um mês para proclamar o resultado. Keiko é filha do ex-presidente Alberto Fujimori, condenado por violações dos direitos humanos e corrupção.

 

3 comentários:

Anônimo disse...

Roberto Jefferson, líder bolsonarista e miliciano armado, mostrou o que podemos esperar das lideranças bolsonaristas: VIOLÊNCIA e AMEAÇAS À SOCIEDADE! Além das tradicionais mentiras de sempre...

Anônimo disse...

"No time petista, a apreensão é com o volume de “fake news”, de toda natureza."

"Do lado bolsonarista, aliados monitoram com preocupação os desdobramentos do episódio protagonizado por Roberto Jefferson, que ainda não foi captado pelas pesquisas divulgadas ontem."

De um lado, preocupação com as mentiras do oponente (mentiroso, claro). Do outro lado, preocupação com a violência / estupidez de aliados (tão violentos e babacas q prejudicam o babaca líder).

Isso diz muito. Muito mesmo!

ADEMAR AMANCIO disse...

Eu só sei que o ato terrorista chamuscou Bolsonaro.