quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

Bruno Boghossian - Barulho internacional

Folha de S. Paulo

Palavras de Lula não conquistam casas no tabuleiro da guerra, e oposição se resume a reações desonestas e um 'perdido de impeachment'

Lula faz sua diplomacia como o político que é. Numa mesma entrevista, revestiu-se de cautela ao reclamar do que chamou de pré-julgamento do governo Vladimir Putin pela morte do opositor Alexei Navalni, escapuliu de uma pergunta sobre o cerco de Nicolás Maduro à ONU na Venezuela e citou o Holocausto ao criticar a matança em Gaza.

Presidentes têm uma latitude que é vedada aos diplomatas. Costumam ser ideologicamente seletivos em comentários sobre parceiros e adversários, dispensam coerência em posicionamentos públicos, surfam nas ondas de suas bases políticas e exageram no barulho para ganhar atenção em debates internacionais.

As palavras de Lula sobre a campanha israelense em Gaza e sua repercussão provam que é preciso ter habilidade até na hora de fazer barulho.

Crimes de guerra não são concursos de selvageria. Lula usa seus movimentos no tabuleiro global para denunciar de forma enfática as violações do governo de Binyamin Netanyahu em território palestino, mas não avançou uma única casa com a referência imprópria à brutalidade de Adolf Hitler no extermínio de judeus durante a Segunda Guerra.

O argumento de que o petista teve coragem para manifestar indignação e ampliar as cobranças por um cessar-fogo diz muito sobre a maneira como aliados e apoiadores enxergam o presidente e nada sobre o esforço que ainda é necessário para tirar da inércia a máquina global que sustenta a guerra.

A reação desonesta de Israel mostra que Netanyahu explora a crise como propaganda. Depois que o governo acusou Lula de negar o Holocausto, algo que o petista não fez, o chanceler Mauro Vieira (um diplomata, não um político) disse que o país lança "uma cortina de fumaça" para encobrir o massacre em Gaza.

Já a oposição brasileira, capitaneada pelos melhores líderes bolsonaristas, busca um estardalhaço próprio com um tradicional "perdido de impeachment": sem causa legal, sem votos em plenário e sem nenhuma razão de ser além da algazarra.

 

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