domingo, 4 de fevereiro de 2024

Eliane Cantanhêde - ‘Se bobear...’

O Estado de S. Paulo

Lula e Tarcísio e a volta de Marta Suplicy fecham uma página e tentam abrir outra para o PT

O presidente Lula parece ir melhor nas investidas internas de 2024 do que nas internacionais de 2023, usando a drástica polarização nacional para exercitar o decantado talento político e marcar uma inequívoca diferença com seu antagonista: enquanto Jair Bolsonaro é homem de radicalização e confronto, Lula é de conciliação e conversa e assumiu o terceiro mandato boquirroto e com ideias atrasadas, mas ainda mais craque na política.

O foco é São Paulo. Depois do mais audacioso e bem-sucedido lance de 2022, o ex-tucano Geraldo Alckmin no ninho petista, Lula botou o PT no seu devido lugar ao lançar Guilherme Boulos (PSOL) para a Prefeitura da capital, elogiou a candidata de centro, Tabata Amaral (PSB), e foi patrono da volta triunfal de Marta Suplicy ao PT. “Se bobear, o Lula traz até o Tarcísio para essa frente!”, brincou Boulos.

Lula se reuniu com o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, na sexta-feira, para lançar um túnel subaquático entre Santos e Guarujá, obra de R$ 5,8 bilhões. Um ato republicano, de civilidade política, com troca de gentilezas e sorrisos, deixando no ar uma certa simpatia entre eles e um rastro de rancor, sobretudo do lado bolsonarista.

Se Lula tem interesse em “dar tudo o que for necessário para São Paulo”, manter boa relação com todos os governadores e construir uma “frente ampla”, Tarcísio também tem bons motivos para a aproximação. Lula é um mestre na política, ele é um aprendiz, um engenheiro que foi do Exército, trabalhou nos governos do PT e foi lançado ministro e governador por Bolsonaro.

Lula tem um passado pujante, de altos e baixos, e Tarcísio tem futuro. Nem pode perder os votos de Bolsonaro, nem se confundir com o atraso e o golpismo que o ex-presidente carrega. Logo, a relação civilizada de Lula e Tarcísio é conveniente para ambos, para São Paulo e para a descompressão da política nacional. A disputa fica para as eleições.

No mesmo dia, Lula discursou numa festa que teve até Eduardo Suplicy cantando Eu Sei Que Vou Te Amar para a volta de Marta ao PT, depois de nove anos, dois partidos e uma passagem pela Prefeitura de Ricardo Nunes, adversário de Boulos com apoio de Bolsonaro. Marta, porém, é a prefeita com o melhor recall na cidade.

Além disso, sua volta traz uma enorme simbologia para o PT: fechar uma página e abrir outra, que está sendo escrita. A história começou com boas causas e princípios, mas deu em mensalão, petrolão, prisão de Lula e desastre Dilma Rousseff. O desafio é mostrar que, daqui para frente, tudo será diferente. Depende de muitos fatores, principalmente de Lula.

 

2 comentários:

Daniel disse...

Muito bom, uma análise muito interessante!

ADEMAR AMANCIO disse...

Daqui pra frente...