sábado, 17 de outubro de 2009

À beira do colapso, diálogo se estende

Roberto Simon,
Enviado Especial, Tegucigalpa
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Sem conseguir convencer governo de facto a aceitar sua restituição ao cargo, Zelaya renova outra vez seu ultimato

Com o prazo final imposto pelo presidente deposto Manuel Zelaya expirado em 24 horas, negociadores das duas facções rivais de Honduras passaram o dia de ontem sem um consenso sobre qual poder da república deve decidir a questão da restituição. Diante do impasse - e a garantia dos representantes do governo de facto de que o diálogo persiste -, Zelaya decidiu estender uma vez a negociação, desta vez até a meia-noite de segunda-feira. Minutos antes, na cidade boliviana de Cochabamba - onde participa da reunião de cúpula da Aliança Bolivariana para as Américas (Alba) -, a chanceler do governo de Zelaya, Patricia Rodas, disse que estava "definitvamente rompido" o diálogo.

Zelaya garantiu ao Estado que a extensão das negociações não representa "um prazo adicional". "Segunda-feira eles apresentarão uma oferta, a qual veremos com cuidado."

O negociador zelaysta Víctor Meza disse a jornalistas que uma proposta definitiva, segundo a qual a volta de Zelaya seria decidida pelo Congresso, já havia sido formalmente apresentada. Caberia agora somente ao governo de facto de Roberto Micheletti aceitar ou não a oferta.

Os golpistas, porém, insistem que seja da Suprema Corte - a mesma que determinou a destituição de Zelaya - a última palavra. "O Poder Executivo não pode tomar decisões do Judiciário", disse Rafael Ponce, emissário do governo de facto. Em um diálogo de surdos, Zelaya voltou a dizer que a Corte Suprema "foi parte integral do golpe".

"Mas o diálogo não foi suspenso", garantiu Vilma Morales, negociadora de Micheletti. John Biehl, funcionário da Organização dos Estados Americanos (OEA) que observa o diálogo, garantiu ao Estado que a instituição interamericana "não impõe limite de tempo" à negociação.

Os dois lados reúnem-se a portas fechadas há uma semana para negociar os 12 pontos da Proposta de San José. Elaborado pelo presidente da Costa Rica, Oscar Arias, o documento serve de base para o diálogo.

Todos os temas da proposta já teriam sido acertados, com exceção do principal deles: a volta de Zelaya, derrubado por militare em 28 de junho, ao poder.

IMPACIÊNCIA

Sob pressão do lado golpista, zelaystas apelaram para o futebol para tentar emplacar a restituição - tema que trava a negociação desde terça-feira. Num gesto altamente simbólico, o capitão da seleção hondurenha, Amado Guevara, enviou uma camisa autografada a Pichu, filha de Zelaya, para que ela a entregasse ao presidente deposto na embaixada brasileira.

Após 27 anos, Honduras classificou-se na quarta-feira para a Copa de 2010, vitória que levou Micheletti a decretar feriado nacional. "Espero que esse gesto dê força ao acordo e desejamos que o nosso presidente legítimo retorne imediatamente ao cargo", disse Flor Guevara, mãe do novo herói nacional. Foi ela quem deu a camisa a Pichu.

Embaixo do brasão, lia-se a dedicatória: "Para o senhor presidente, de seu amigo Amado." "Confio em Deus e no povo.

Micheletti tentou usar a vitória no futebol para aliviar a tensão. O desfile dos jogadores por Tegucigalpa terminou na Casa Presidencial e o líder de facto recebeu a seleção com lágrima nos olhos. Veículos da imprensa que apoiam o governo de facto acusaram zelaystas de boicotar a seleção. O gesto de Guevara, no entanto, foi uma afronta à estratégia do regime de Micheletti.

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