Ganhamos porque merecemos. O Brasil fez uma campanha profissional, uma apresentação que equilibrou técnica e emoção, estava unido e tem um bom projeto. Começa hoje o longo trabalho de transformar sonho em realidade. Os 113 anos de história das Olimpíadas da era moderna trazem lições de acertos e erros que podem ajudar o Rio a traçar o mapa do caminho até a vitória
Foi bom sonhar, trabalhar, chorar. A sensação de superação e conquista aquece a alma. É assim que os brasileiros se sentem hoje.
Quem viu se orgulhou.
Quem torceu não acreditou quando ouviu o nome mágico: Rio de Janeiro! Olimpíadas podem dar certo. Ou não. Temos sete anos para garantir que a nossa dará.
Há quem diga que é muito dinheiro e que ele deveria ser investido em outras coisas, como educação. É muito dinheiro, mas uma parte dele voltará à sociedade em empregos; ao governo, em impostos; à cidade em benefícios.
O evento em si traz várias receitas.
E a educação? O Rio tem agora inúmeros desafios, um deles é sim aumentar o investimento em educação.
O estado precisa preparar seus habitantes para tirar o melhor proveito das oportunidades que vão surgir.
Um evento como esse não tem um efeito localizado.
Seus reflexos se espalham e irradiam para além do esporte, para além do Rio, para além do tempo.
Há cidades que tiveram ganhos para sempre, há cidades que ficaram com as cicatrizes.
Montreal ficou com uma dívida que levou 30 anos para acabar. Barcelona entrou numa era de pujança e charme. Sidney limpou suas águas pondo definitivamente a questão ambiental nos anéis olímpicos. O Brasil deve agora olhar para trás e aprender com a história. Há muitas escolhas. Devemos fazer as certas.
O professor Marcelo Proni, da Unicamp, fez um estudo no Ipea em que analisa o que aconteceu em Barcelona, Sidney e Pequim.
Ele conta que Sidney, em 2000, tirou nove milhões de metros cúbicos de lixo de 160 hectares de vias navegáveis; usou materiais recicláveis; plantou árvores e protegeu fauna e flora; fez construções que tiraram melhor proveito da luz natural.
Era o início da era dos jogos sustentáveis da qual não poderemos fugir.
A preocupação ambiental e climática tem que estar em cada passo, em cada escolha, em cada etapa do projeto.
As Olimpíadas serão em 2016, na era pós-Kioto, quando o mundo estará mais preocupado, e mais ameaçado, pelo aquecimento global.
O Rio pensa que porque tem mar, mata, natureza exuberante, que o meio ambiente está dado. É um erro. Além da despoluição, precisamos proteger o que temos e compensar o que emitiremos. Esse é o passaporte do futuro.
As Olimpíadas de Atenas em 2004 ficaram marcadas pelos desvios e fraudes em obras. Isso precisamos evitar com a mesma mistura de paixão e técnica que usamos para vencer.
Corrupção se vence combatendo fervorosamente esse mal que mina a vida brasileira. Como diz a campanha deste jornal: gritemos contra ela. Juntos. Nós e vocês. Seremos muitos.
Existem hoje fórmulas que inibem a prática da corrução: mais transparência, prestação de contas, acompanhamento de cada gasto.
O Brasil não pode aceitar uma sombra sobre a nossa alegria. As autoridades têm a responsabilidade de adotar práticas que sosseguem nosso medo de que uma parte do dinheiro vá por conhecidos desvios.
Somos um país que gosta de improvisos. Essa característica é qualidade às vezes, é defeito na organização de um evento desse porte. Em Atlanta, houve reclamações sobre as falhas no sistema de comunicação.
O planejamento tem que ir além de 2016. Seul ficou com elefantes brancos.
Nós não podemos nos dar ao luxo. O Pan deixou alguns alertas. No dia seguinte, olha-se para o espaço e não se sabe para que serve. As construções tem que ser multiuso.
Barcelona é nosso norte.
Como o Rio, a cidade da Catalunha estava vivendo a perda progressiva de densidade econômica. O projeto foi tão bem feito que é até hoje um símbolo de sucesso.
A cidade se reinventou, encontrou seu nicho como fornecedora de serviços culturais e centro turístico.
Os visitantes foram nas Olimpíadas e continuaram indo. Barcelona, que na época do evento tinha a metade da taxa de desemprego que no resto da Espanha, continua ainda hoje dando lições de como fazer um evento inesquecível.
Olimpíadas são o momento em que esporte, economia, política, cultura e questões sociais se misturam.
Em 1936, em Munique, já estava claro que um pesadelo se abateria sobre a humanidade.
A vitória de Jesse Owens foi a luz que indicou a todos o caminho certo para além do nazismo. Em 1980, o boicote americano a Moscou foi a esclerose da guerra fria. O que ficou na lembrança de todos foi o Misha, o simpático mascote dos Jogos.
A guerra fria acabaria anos depois, felizmente.
Olimpíadas são magia, sonho, chance. O presidente Lula lembrou ao Comitê Olímpico que a festa é da humanidade. Querendo dizer que, dos quatro candidatos, só nós não tínhamos tido nossa chance. Ontem, tivemos.
Agora, é transformar em vitória a oportunidade.
Há muito a fazer, mas hoje é só alegria. Merecemos.
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