"Amor, eu estourei o limite do cartão de crédito. Do seu e do meu." Vestida e afetando culpa no tom de voz, Gisele Bündchen dá a má notícia ao marido imaginário. Essa é a maneira errada de abordar o assunto. A maneira certa, explica a propaganda de lingerie estrelada pela modelo, é de calcinha e sutiã, requebrando com a mãozinha na cintura e a fala sensual.
Se a propaganda está no ar, é porque deve ter alguma eficácia. Mas não é preciso muito para perceber que estamos diante de mais uma fashion-cafajestada, entre tantas outras do mercado da publicidade, basta ligar a TV para constatá-lo.
Pior, no entanto, do que o apelo ao machismo mais vulgar é a disposição do governo para combatê-lo recorrendo à censura. A Secretaria de Políticas para as Mulheres acionou o Conar, o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária, para tirar a peça do ar. É uma medida obscurantista, além de desencadear o efeito contrário ao pretendido por essas feministas de tesoura.
A propaganda, diz a secretaria, reforça "o estereótipo equivocado da mulher como objeto sexual de seu marido e ignora os grandes avanços alcançados para desconstruir práticas e pensamentos sexistas". Sim, estamos de acordo -mas e daí?
Em nome de que a propaganda deve estar necessariamente em sintonia com valores progressistas ou submetida à visão igualitária da relação entre o homem e a mulher?
Como conciliar a defesa da emancipação e dos direitos da mulher com a opção regressiva e autoritária pela censura? O que, afinal, é mais nocivo e perigoso para quem aspira viver numa sociedade com menos discriminação e mais esclarecida: a moral da história do anúncio ou a iniciativa do governo para bani-lo da tela?
Com sua cruzada, a ministra Iriny Lopes folcloriza as atribuições de uma pasta que tem assuntos reais para enfrentar. Só falta lançar uma campanha de esclarecimento público: Gisele Bündchen faz mal à saúde.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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