Por ter a característica inédita de os fatos estarem todos supostamente investigados, a CPI do Cachoeira começa a ser superada pela dinâmica da divulgação de novidades para o grande público. A peculiaridade se agrava porque grupos de deputados e senadores se dedicam mais a executar missões partidárias de varejo do que a perseguir o que seria a missão óbvia numa CPI: a verdade, esquadrinhar os responsáveis pelos delitos, para depois encaminhá-los ao Ministério Público; e, por fim, sugerir mudanças de legislação, a fim de evitar a repetição das delinquências.
Nada disso. O jogo enfadonho de briga partidária, praticado com gestos teatrais quando a sessão é transmitida pela TV, ficou à vista de todos no confronto entre tucanos e o relator, o deputado petista mineiro Odair Cunha.
Na terça, oposicionistas destilaram veneno em perguntas a um Cachoeira mudo apenas para atingir aliados do governo. Era este mesmo o objetivo. O troco foi dado por Odair, na inquirição, quinta, do ex-vereador goiano Wladimir Garcez, preso como Cachoeira, e personagem da polêmica venda de uma casa pelo governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), ao contraventor.
Enquanto oposicionistas e situacionistas se digladiam, fatos vão sendo conhecidos e comprovam que a CPI atolou na briga político-partidária. Reportagem do GLOBO de ontem, por exemplo, revelou a existência no Rio de pelo menos duas empresas laranjas, parte de uma provável plantação de firmas fantasmas criadas por Cachoeira para receber dinheiro da Delta. Por óbvio, a direção da empreiteira - pelo menos Fernando Cavendish, o ex-dono, e Cláudio Abreu, diretor da construtora no Centro-Oeste - era conivente.
Zuk Assessoria Empresarial e Flexa Factoring, de que são sócios uma moradora de um conjunto em Piedade, subúrbio carioca, e um ajudante de caminhão de Leopoldina, interior mineiro, receberam repasses de outras duas firmas fajutas de Goiás, Brava e Alberto & Pantoja, para as quais a Delta transferiu pelo menos R$ 39 milhões. Por terem sido criadas por Cachoeira, as empresas levaram a Polícia Federal a suspeitar que o contraventor é sócio oculto da empreiteira.
Nem isso leva o BNDES a se preocupar com o fato de seu sócio no frigorífico JBS, a holding J&F - a quem também destinou muito dinheiro público -, querer comprar a Delta, nem parece aguçar a curiosidade de parlamentares do PMDB e do PT, donos das rédeas da CPI.
As firmas fantasmas de Goiás e, agora, as empresas laranjas cariocas tornam, em definitivo, o caso Cachoeira e Delta um escândalo nacional.
Mesmo assim, a CPI resiste a quebrar os sigilos da empreiteira, algo sem sentido, pois pelo menos o acesso às contas da empresa, em todo o país, já foi determinado pela Justiça de Brasília. Os políticos querem apenas ganhar tempo, em prejuízo do trabalho da CPI.
Não deveria preocupar o governo Dilma que a empreiteira tenha sido dona da maior fatia de obras do PAC. Se a ideia é mesmo sanear a contratação de obras públicas, abrir a caixa-preta da Delta será de enorme ajuda.
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